Wednesday, 10 October 2012

Combate à corrupção na justiça passa pela neutralidade política

Advogados que participaram na palestra subordinada ao tema “A Corrupção no Judiciário – Formas de Combate Eficaz do Fenómeno” proferida semana passada pelo inspector americano Geral Robert Cerasoli, na Universidade Católica de Moçambique (UCM), na Beira, comungaram que o combate à corrupção passa pela neutralidade política em Moçambique.
Entrevistados pelo “Diário de Moçambique”, eles afirmaram assistir-se no país à criação de instituições de combate à corrupção, quando, na verdade, a sua actuação não é neutral, ou seja, são organismos com tipicidade de uma justiça vesga, em que predominam objectivos pessoais ou de grupos de cidadãos, deixando de lado as premissas pelas quais foram formados.
Francisco Eliseu de Sousa, um dos advogados que participou na palestra, referiu que a actuação das referidas instituições é vesga, na medida em que os casos são julgados com dualidade de critérios, tornando-se, logo à partida, uma justiça selectiva, o que é “extremamente mau para qualquer país” .
Convidado a pronunciar-se sobre as motivações que estão por detrás do fenómeno no sector da administração da justiça moçambicana, o jurisconsulto considerou tratar-se de uma concatenação de causas, entre as quais as relacionadas com baixa remuneração por parte dos funcionários afectos ao sector da justiça
Como têm baixa remuneração, eles socorrem-se da corrupção para sobreviver, para além de deficiente formação moral e engodo e avidez pelo alheio.
“Temos que ser pessoas com dignidade. Portanto, normalmente busca-se na corrupção ganhos fáceis e não de sacrifícios. É preciso que haja pessoas com idoneidade, educação sólida e com o respeito pelo alheio. O respeito começa connosco mesmos e posteriormente pelos outros” – disse Francisco Eliseu de Sousa.
De Sousa considerou que a corrupção no sector da justiça em Moçambique é subtil e muitas vezes não deixa rastos exteriores e que o seu combate requer, para além dos aspectos acima referenciados, denúncia por parte dos interventores.
O outro advogado que deixou registado o seu depoimento em torno da corrupção no judiciário em Moçambique foi o bastonário da Ordem dos Advogados de Moçambique, Gilberto Correia, o qual afirmou haver sinais visíveis deste mal.
Para Correia, a fragilidade moçambicana para a punição das variadas tipologias de corrupção está na fraqueza das investigações.
Quando se debruçou exclusivamente sobre a corrupção no sector da justiça do nosso país, ele revelou que os organismos entendidos na matéria, nomeadamente juízes, procuradores, advogados, polícia têm poucos resultados da investigação e o facto “de os organismos que devem investigar e punir estarem manchados de actos de corrupção, faz perder o sentido de seu combate. É minha impressão que o combate a corrupção no judiciário deve ser o primeiro a ser feito”.
Na sua alocução, Gilberto Correia referiu que as autoridades e as lideranças do sector do judiciário acham tabu o combate à corrupção, fingindo não existir, para além de encobrir com técnicas de avestruz, prejudicando a sociedade.
“Não se pode combater um problema que nós todos achamos incómodo e fingimos que ele não existe. O grande problema está na falta de provas, mas para que estas existam é necessário investigar. Os sinais de corrupção são conhecidas por toda a sociedade. O descrédito no sector da justiça está baseado no facto de sabermos que há decisões manchadas pela corrupção, algumas das quais estão tão nítidas ao ponto de o mais forte ser o que tem dinheiro e ser bem tratado ” – explicou o bastonário.
Por seu turno, Pedro Abreu, presidente do Conselho Provincial da Ordem dos Advogados de Moçambique, referiu sobre o assunto que a corrupção no sector da administração da justiça é um tema bastante complexo, pois este parte da nomeação dos que devem investigar os casos.
“A quem defenda, por exemplo, que os magistrados do Tribunal Supremo não devem ser indicado pelo Presidente da República, mas sim pelos seus pares, pois assim teriam muito mais legitimidade” – disse Pedro Abreu, para quem a falta de identificação e responsabilização dos actores é outro problema que retrocede o combate à corrupção no país.
“O problema é como responsabilizar os corruptos que actuam no seio do aparelho da administração da justiça, quando obviamente seriam estes que deviam punir os corruptos. Os que estão na administração da justiça têm a obrigação de não ser corruptos, mas o são e é difícil combater – disse Pedro Abreu.
Entretanto, o inspector americano Geral Robert Cerasoli, que proferiu a palestra, afirmou que a corrupção nasce e floresce quando os seus actores tiverem a noção de que não serão responsabilizados.
“Outras causas têm a ver com baixo salários auferidos no sector público, para além da baixa escolaridade. A corrupção ocorre quando há oportunidades. Se o risco de as pessoas serem apanhadas for pouco, a onda da corrupção será maior. Portanto, a chave para o combate a corrupção é uma punição rápida e severa” – referiu Geral Robert Cerasoli.


Diário de Moçambique

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