Sunday, 29 April 2012

Sobre o nepotismo no aparelho de Estado

Mais grave ainda, tal como aquela sessão do IX Congresso do partido Frelimo, nem a Ministra da Função Pública nem o próprio Fórum de Gestores de Recursos Humanos foram capazes de sugerir, de forma bem clara e inequívoca, os critérios ou estratégias de combate ao nepotismo, sendo por isso que a chamada de atenção feita pela Ministra da Função Pública sobre a vigilância contra o nepotismo é totalmente inútil.
É que, na minha opinião, o próprio conceito de nepotismo no contexto moçambicano carece de aclaração. Um exemplo apenas para tornar cristalina a minha ideia: se determinado ministério abre concurso público de ingresso em que por mera coincidência candidatam-se a filha, o filho e sobrinho do titular do pelouro e estes passam com algumas das melhores classificações obtidas, amanhã poder-se-á dizer, com boa dose de razão, que aqueles candidatos foram beneficiados pelo nepotismo?
Mas como provar isso na prática, se nos avisos de abertura do concurso não estavam previamente vedados de concorrer os familiares do titular do pelouro, além de se verificar que, no exercício da sua função, o júri observou escrupulosamente os deveres estabelecidos pelo Regulamento dos Concursos aprovado pelo Diploma Ministerial n.o 61/2000, de 11 de Abril?
O exemplo acima é assaz diferente dos casos em que o ingresso e outros actos relacionados com as nomeações, promoções e contratações não tenham obedecido aos ditames constitucionais (vd. artigo 251, n.o 1 da CRM) e das leis porquanto, nestes casos concretos, a Lei é mais clara e contundente ao estabelecer que os actos assim praticados são nulos e de nenhum efeito (vd. artigos 9, n.o 3 do EGFAE e 129 da Lei n.o 14/2011).
Todavia, tenho verificado que perante a constatação dos casos acima referidos, a solução tem sido a legalização dos actos ilegais detectados, atitude “paternalista” esta que não contribui para o combate às irregularidades cometidas no processo de gestão dos recursos humanos do Estado, além da aparente indiferença do Ministério da Função Pública em relação às denúncias feitas pelos cidadãos sobre anomalias diversas.
Ora, se em direito diz-se que quem alega ou acusa é que deve provar, pode-se afirmar que a Ministra da Função Pública, ao acusar os gestores dos Recursos Humanos de serem os principais promotores de nepotismo, ela tem provas suficientes da acusação que conscientemente faz. Então, que seja ela a dar o primeiro exemplo de combate ao nepotismo, uma vez que para tal não lhe falta dispositivo legal aplicável.
Na minha modesta opinião, bastaria que com os casos provados que tem, ela a ministra removesse dos ministérios que actualmente integram todos os funcionários e agentes do Estado beneficiários do nepotismo para outros ministérios muito longe dos dirigidos pelos respectivos familiares, fazendo uso da prerrogativa que lhe confere o artigo 22 do EGFAE.
Aí sim, diríamos que a prática é o critério da verdade, contra a falácia e/ou retórica que estamos cansados de ouvir há quase trinta e sete anos consecutivos!!!
Entretanto, continuo a pensar que o combate ao nepotismo nas nossas actuais condições sociais, económicas e políticas não é tarefa fácil.



Ao ler as páginas 6 e 7 do suplemento “TINDZAVA” de 8-3-2012, que exibem nomes e fotos de 14 mulheres que “conquistaram a liberdade de ser” no mundo, verifiquei que com a excepção de Lurdes Mutola e sete estrangeiras, as restantes mulheres com os nomes aí elencados são membros proeminentes do partido Frelimo, entre as que foram ou são titulares de órgãos centrais do Estado e de outros cargos de especial destaque. E no fim indagava-me: o quê é isto, será que fora do partido e do Estado não existem as que se distinguem por mérito próprio?
Eis o embrião ou o vírus do nepotismo de que agora queixamo-nos!
Quanto ao uso de crachás, também não haja ilusões e nem retóricas por demais enfastiantes, na exacta medida em que Lei que a tal obriga existe há mais de uma década. Refiro-me ao artigo 41 das Normas de Funcionamento dos Serviços da Administração Pública, aprovadas pelo Decreto n.o 30/2001, de 15 de Outubro, cujo teor integral é o seguinte:
“Os funcionários devem, no exercício das suas funções e no respectivo local de trabalho, ostentar crachá.
O crachá deve conter o emblema da República ou logótipo, a designação do sector e o nome, o número e a fotografia do funcionário, bem visíveis.
"Compete ao Conselho Nacional da Função Pública regulamentar sobre as características do crachá.”
Isto significa que se até hoje em dia alguns funcionários e agentes do Estado não usam crachás, isto só pode ser sintomático da existência de inspecções administrativas inoperantes ou, no mínimo, da falta de exigência das direcções e chefias a que aqueles se subordinam directamente.
Mas este é um assunto que, na minha óptica, é grave e que por isso não pode ter como solução a aprovação de mais leis de igual teor, salvo se referia-se ao regulamento previsto no n.o 3 do atrás citado artigo 41!!!
Por outro lado, é curial que o Ministério da Função Pública pense na criação de um Boletim Informativo em que periodicamente se divulguem, entre outros assuntos, os resultados das inspecções realizadas em cada sector do aparelho de Estado, como forma de informar ou prevenir os demais funcionários e agentes sobre as anomalias e as melhorias porventura constatadas; a relação dos funcionários e agentes do Estado disciplinarmente processados e sancionados; os nomes dos funcionários e agentes do Estado que no espaço de tempo em referência distinguiram-se na resolução atempada e eficaz das demandas públicas; abertura de espaço reservado à publicação de opiniões e sugestões de solução de problemas prevalecentes na Administração Pública, etc., etc.
A minha proposta acima formulada funda-se no princípio de que o secretismo reinante sobre assuntos banais não ajuda a despertar a consciência nacional acerca dos efeitos nocivos que tais males causam a toda a sociedade. E como bem reza uma das passagens do ponto 8 da Estratégia Anti-Corrupção 2006-2010, “para o sucesso da prevenção é necessário educar o HOMEM de modo a promover uma mudança profunda na opinião pública e criar um ambiente em que as práticas corruptas sejam discutidas abertamente e consideradas intoleráveis”.

P.S. 1. Da leitura atenta do discurso pronunciado pelo Secretário-Geral da OJM por ocasião da realização da III sessão do Comité Central da referida organização (vd. reportagem na página 2 do semanário “ZAMBEZE” de 8-3-2012), a conclusão a que se chega é a de que foi de todo inútil o desmentido do jovem Osvaldo Petersburgo publicado na página 12 do jornal “Canal de Moçambique”, edição de 22-2-2012, sobre a entrevista que o referido jovem concedera a este mesmo jornal há cerca de um mês antes.
2. Na verdade, os dados da entrevista concedida pelo jovem e inserida no “Canal de Moçambique” de 11-1-2012, pouco ou em nada difere dos do discurso do economista Basílio Muhate, Secretário-Geral da OJM.
3. Penso que o erro maior do jovem Petersburgo foi de ter antecipado a revelação de factos cuja divulgação estava reservada à III sessão do Comité Central da supracitada organização juvenil.
4. Eu gostaria que nesta minha (nossa) Pátria amada surgissem jovens destemidos e por conseguinte capazes de assumir tudo o que dizem e fazem, ainda que isso possa acarretar sacrifícios, tendo em atenção que todas as grandes vitórias que até hoje o mundo conhece nas várias frentes de luta foram sempre à custa de incomensuráveis sacrifícios, incluindo das próprias vidas.
5. Mas apesar de tudo, eu grito com todos os pulmões: FORÇA, jovem Osvaldo Petersburgo, visto que “errando, cprrigitur error”!!!

JOÃO BAPTISTA ANDRÉ CASTANDE
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