Thursday 9 December 2010

Para a SADC, a lição do euro

Se há alguém que pensa que a crise financeira em Portugal é algo que diz respeito a Portugal está totalmente enganado. Diz respeito ao Euro. E isso traz um aviso para Moçambique e a todos os membros da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, SADC, onde se continua a falar de uma moeda única: Cuidado com aquilo que desejam.
Digo isto porque a moeda única é um projecto de que se fala com entusiasmo em muitas capitais e por muitos especialistas dessas bandas. Nada mais atractivo que o sonho de se poder deslocar do Maputo para Joanesburgo, para Lusaka, para Lilongwe, para Gaberone para Dar Es Salam sem ter que estar a trocar Meticais por Rands por Kwachas, Pulas ou Shillings. Além de ser cómodo é para muitos uma visão “sofisticada” de unidade que é na verdade politicamente superficial e economicamente um doce envenenado.
A criação de uma moeda única (com o nome de SADEC?) implica claro está um banco central único e é aí que estão todos os problemas.
Um banco central único significa logo à partida que Moçambique perde totalmente a prerrogativa de controlar as taxas de juro. E essas taxas de juro vão provavelmente reflectir o que se passa na economia mais forte da região, a da África do Sul ( isso se Julius, “ Um Colono Uma Bala”, Malema não tomar conta do poder e zimbabwificar o país). A pergunta a fazer aqui é: E se subitamente os níveis de inflação subirem em Moçambique em grande escala e Moçambique precisar de subir as taxas de juro? Não o pode fazer. Isso é uma das consequências do Euro para Portugal, Irlanda e Espanha.
Mais do que isso a criação de uma moeda única poderá inicialmente criar uma entrada em grande escala de fundos a circular livremente por toda a região e isso poderá claro está criar uma inflação de salários e custos tornando os (poucos) produtos moçambicanos ainda menos competitivos nos mercados internacionais.
Ao princípio, tal como aconteceu em Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha tudo seria uma maravilha. Nível de vida a subir, investimentos também, o crédito também. Mas no caso do Euro esse dinheiro fácil criou desequilíbrios que esses países não podem corrigir de um modo que o poderiam fazer caso tivessem a sua própria moeda. Os deficits das balanças comerciais aumentaram devido a esse dinheiro fácil e “forte”. Mas Portugal ( ou a Espanha, ou a Grécia ou a Irlanda) não podem também por exemplo desvalorizar a moeda.
Por outras palavras: depois da festa vem o babalaz e agora todos pensam que o melhor seria não se ter bebido do Euro. Mas é difícil agora sair do Euro sem correr o risco de uma corrida desenfreada aos bancos locais e aumentam as acusações entre os países que aderiram á moeda conjunta. Os fortes a acusarem os fracos de irresponsabilidade, os fracos a acusarem os fortes de... serem fortes. Por outras palavras o que deveria ter sido mais um laço de unidade é agora um ponto que sublinha as diferenças - A União Europeia (UE) é hoje mais do que nunca uma UEtupia. O desafio europeu já não é só económico. Agora - graças ao Euro - é também social (quem e como vai pagar pelo Euro?) e político (quem vai tomar as decisões difíceis que têm que ser tomadas porque a prisão do Euro não dá margem de manobra em política monetária e financeira?).
Em Portugal a prosperidade temporária vai agora traduzir-se numa crise de longa data sobre a qual Lisboa tem pouco controlo. Na infelicidade dos agora amigos portugueses jaz uma lição para aqueles que governam no Maputo: Mais vale um metical na mão que dois SADECs a voarem num banco em Jo’burg. A moeda única da SADC pode ser um sonho bonito que no entanto esconde um possível pesadelo para países como Moçambique.
Cuidado com aquilo que se deseja.

Por Jota Esse Erre, no Savana, citado no Diário de um Sociólogo

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