Thursday, 2 December 2010

Agravamento do custo de vida em Moçambique

Preços de produtos alimentares terão sempre tendência para subir
– defende o economista Firmino Mucavele, na VI Conferência Anual do Millennium bim

Cerca de 40% dos alimentos produzidos em Moçambique apodrecem nos campos agrícolas antes do escoamento, ou nos armazéns e celeiros sem mercado para comercialização. 74% dos trabalhadores da agricultura são analfabetos. “O aumento da taxa de crescimento da produção alimentar em Moçambique é de 1,2% por ano, enquanto a taxa de crescimento natural da população moçambicana é de 2,7% por ano. Portanto, em cada ano que passa temos um défice alimentar de 1,5%.” “Os actuais índices da pobreza que se situam em 54,7% são inadmissíveis, e é preciso que a curto prazo o Governo possa reduzir a prevalência da pobreza em Moçambique para níveis internacionalmente aceitáveis, como 20% a 25%”.
Maputo (Canalmoz) – O custo de vida que levou a população a sair à rua nas manifestações populares do início de Setembro último em Maputo, tenderá a agravar-se no país. Segundo a análise do reputado economista moçambicano, Firmino Mucavele, prevê-se uma exacerbação dos preços de produtos alimentares a médio e longo prazo, situação que se repercute directamente no rendimento real das famílias moçambicanas, retirando-lhes o poder de compra.
Firmino Mucavele, um dos principais oradores da VI Conferência Anual do Millennium bim ontem realizada em Maputo, fez uma apresentação subordinada ao tema “ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO PARA O COMBATE À POBREZA EM MOÇAMBIQUE”. Foi durante esta explanação que trouxe dados para sustentar que “os preços de produtos alimentares sempre terão a tendência para subir e aumentar no longo prazo”.
“O aumento da taxa de crescimento da produção alimentar em Moçambique é de 1,2% por ano, enquanto a taxa de crescimento natural da população moçambicana é de 2,7% por ano. Portanto, em cada ano que passa temos um défice alimentar de 1,5%.”, explicou o professor de economia para sustentar a sua afirmação.
O economista disse que quanto maior for a escassez de produtos alimentares, maior será a tendência para aumento de preços de produtos alimentares, daí que apresentou “estratégias” que, segundo ele, podem ser adoptadas pelo Governo para reverter o actual cenário de pobreza a que está submetida a maioria dos moçambicanos.

Desenvolvimento da agricultura e da indústria alimentar

Este economista doutorado em Ciências Agrárias e Recursos Naturais, pela Universidade de Florida, nos EUA, apontou, como primeira estratégia para o combate à pobreza, o “Desenvolvimento da Agricultura e da Indústria Alimentar”.
Disse ser imperioso o “fornecimento de produtos alimentares e garantia da segurança alimentar; o fornecimento de emprego à maioria da população rural; o fornecimento de divisas através das exportações de produtos agrários; o fornecimento da matéria-prima às agro-indústrias e outros sectores de economia e; a acumulação do capital necessário para investimentos de desenvolvimento nos outros sectores de economia”.

40% da produção nacional apodrece nas machambas

Explicou que uma das principais questões do fracasso da agricultura moçambicana é que não há desenvolvimento desta actividade em cadeia. Disse que cerca de 35% a 40% dos alimentos produzidos em Moçambique apodrecem nos campos agrícolas antes do escoamento, ou nos armazéns e celeiros sem mercado para comercialização. Citou exemplo concreto do “arroz de Chókwè”, Referiu que cerca de 40% do que foi cultivado o ano passado se perdeu na pós-colheita. Mencionou ainda o “trigo de Sussundega” que quase toda a produção do ano passado foi comercializada no Malawi.
Para o professor Firmino Mucavele, isto é devido à falta de desenvolvimento integrado do sector da agricultura, que aliado à baixa produção e produtividade, encarece cada vez mais as condições de vida dos moçambicanos.
Deu outro exemplo do processamento dos produtos agrícolas. Disse que cerca de 94% dos produtos agrícolas enlatados e processados que são consumidos na cidade de Maputo, são importados. Referiu-se especificamente ao tomate, cebola, alho, batata, manteiga de amendoim e outros derivados de produtos agrícolas.
Para o especialista em economia agrária, “isto é inadmissível” para um país como Moçambique, com condições naturais favoráveis à prática da agricultura.

74% dos trabalhadores da agricultura são analfabetos

Firmino Mucavele convidou ainda quem de direito a apostar na formação dos recursos humanos, não só para o sector da agricultura, mas para todos os sectores económicos do país.
Dando como exemplo na agricultura, sector definido pelo Governo como base do desenvolvimento, Mucavele disse que “cerca 73% da força de trabalho empregue na agricultura é analfabeta”, pelo que não se pode esperar muita coisa de quem produz sem conhecimento científico do que está a fazer.

Outras estratégias

O economista falou de outras estratégias, para além do desenvolvimento da agricultura e da indústria alimentar. Falou nomeadamente da necessidade de desenvolvimento dos recursos humanos; de financiamento e investimento das infra-estruturas; do desenvolvimento das instituições; da criação das capacidades de gestão da economia e lideranças; e da boa governação e Estado de Direito.
Em jeito de recomendações, o economista que já foi assessor do presidente Joaquim Chissano, na área económica e social, disse que é preciso garantir a extensão das áreas de produção às zonas irrigadas e de terras sustentáveis, incluindo o melhoramento dos sistemas de controlo de água; melhorar as infra-estruturas rurais e o acesso aos mercados, incluindo insumos e financiamento; aumentar a provisão alimentar para garantir a redução da fome.
Falou ainda da necessidade do melhoramento da pesquisa e tecnologia para desenvolvimento sustentável da agricultura; da criação das empresas de serviços tais como serviços de mecanização agrária, serviços de transporte, serviços de comercialização agrária, serviços de seguros agrários e serviços de assistência técnica é fundamental para um desenvolvimento económico e social sustentável.

Os actuais níveis de pobreza são inadmissíveis

Já em jeito de comentário, depois de terminar a conferência, Mucavele disse que os actuais índices da pobreza que se situam em 54,7% são inadmissíveis, e é preciso que a curto prazo o Governo possa reduzir a prevalência da pobreza em Moçambique para níveis internacionalmente aceitáveis, como 20% a 25%.
Convidado a comentar a estagnação do combate à pobreza no país, segundo a 3ª avaliação nacional da pobreza apresentada pelo Instituto Nacional de Estatística, o economista disse que a situação é de facto preocupante, e procurou explicar o fracasso do combate à pobreza com “a subida dos preços de produtos alimentares no mercado internacional, a baixa produtividade interna gerada pelas pragas e fraca precipitação e algumas estratégias que falharam”.
Lembre-se que no período que coincidiu com o último mandato do presidente Chissano, a pobreza reduziu cerca de 10% em Moçambique e no período que coincide com a maior parte do primeiro mandato do presidente Guebuza, a pobreza aumentou 0, 5%, a nível global.

(Borges Nhamirre, CANALMOZ)

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