Friday, 26 November 2010

Os dois moçambiques: o do Governo e FMI e o Moçambique real

Maputo (Canalmoz / Canal de Moçambique) - Os últimos dias trouxeram a público opiniões divergentes sobre Moçambique. De um lado o Moçambique imaginado, dos sonhos e dos números cozinhados ou não mas que no essencial são em suma os que convém a certos figurões para continuarem a fazer crer que vivemos no País das mil maravilhas. Do outro, o real, retratado pelo 5 de Fevereiro de 2008 e pelo 1, 2 e 3 de Setembro último, sem água, ou com água às vezes, sem luz, ou com energia às vezes, sem transporte, ou com transporte às vezes, sem lar, sem emprego e com fome onde o único futuro melhor é esperar pela morte e quiçá desejá-la para que o alívio chegue depressa.
De um lado o imaginado pelo FMI e quiçá por representantes de alguns doadores vivendo no mundo das piscinas, dos relvados da Sommerschield e de outros condomínios, das maravilhas da natureza que nas suas redutoras origens nunca viram e aqui os anestesia.
Do outro lado o Moçambique real que já nem o Instituto Nacional de Estatística consegue esconder: esse tal mundo que os cientistas moçambicanos não se cansam de dizer que não está bem e ninguém lhes liga numa atitude completamente autista e irresponsável.
Se o Povo já foi para a rua várias vezes, umas vezes manifestando-se aqui e acolá sem grande impacto, outras em massa e a ponto de fazer recolher aos domicílios tudo e todos, incluindo os arautos do “sucesso”; Se os cientistas Moçambicanos insistem em repetir amiudadamente que o crescimento económico de que tanto se fala não se repercute na maioria da população, podemos acreditar nos “turistas” do FMI e de alguns países doadores que continuam a acreditar (não será antes a fingir que acreditam?) que “Mozambique is very nice”?
Quando aconteceram os levantamentos de 5 de Fevereiro de 2008 e os mais recentes de 1, 2 e 3 de Setembro, onde estiveram os senhores que das embaixadas e organismos similares passam os dias a produzir relatórios para as suas chancelarias que nada têm a ver com a realidade moçambicana? Alguma vez, algum povo se alimentou e sobreviveu de pautas estatísticas?
Onde estavam os especialistas do FMI quando os moçambicanos de forma participativa estavam nas ruas a dizer que a pobreza tinha aumentado no País? – Estavam, certamente, a gozar a festa no bem bom dos seus gabinetes, pelo Google Earth, e a repetir o refrão “Mozambique is very nice and it is in the right direction” (Moçambique é muito bom e está na direcção certa).
Para onde nos querem levar com esta treta? Porquê quando vêm a Moçambique em vez de estarem no Hotel Polana, Avenida, Cardoso ou Indy Village não descem até ao Xipamanine, Muhaivire, Munhava, e tantos outros bairros paupérrimos das periferias de tantas cidades e vilas também das províncias do interior, designadamente do Centro e do Norte, para verem o que é o País real?
Por que é que quando têm as estatísticas reais nas mãos fazem como o bêbado que se encosta ao poste de iluminação não para ver melhor mas para dormir um pouco em pé?
Têm medo de ao visitarem Moçambique real e não o Moçambique maquilhado, se aperceberem do ridículo que são os seus argumentos e as políticas que inventam para Moçambique? Têm medo da sua própria consciência? Têm medo de não terem como não se envergonharem dos seus próprios erros?
Que boa opinião pode alguém ter dos senhores do FMI e de outras instituições com as mesmas pretensões quando nos vêm dizer que tudo vai bem mas os estudos levados a cabo por cientistas moçambicanos não agarrados ao Poder nos revelam exactamente o contrário?
Será que o problema de Moçambique são mesmo mais milhões de dólares americanos, Euros ou Yens ou precisa antes de novas lideranças, de políticas alternativas de desenvolvimento sócio-económico e político?
Se alguns cientistas moçambicanos estão a repetir constantemente que o País precisa de novas políticas de desenvolvimento sócio económico, porque se insiste na mesma música do FMI e da estratégia falhada de combate à pobreza que agora vai deixar de ser PARPA (Programa de Apoio à Redução da Pobreza Absoluta) para ser só PARP (Programa de Apoio à Redução da Pobreza) como se estas coisas fossem apenas uma questão de por e tirar letras às siglas? Quem querem continuar a enganar?
E por que é que a Frelimo não gostava do FMI e agora as mesmas pessoas até parecem ser do Comité Central do FMI? O que se terá passado? O que se está a passar? Não será que o Gabinete Anti-corrupção nos pode ajudar a perceber melhor esta zona de penumbra?
Os tais que diziam que queriam libertar o Povo Moçambicano não será antes que o que queriam mesmo era sentarem-se na cadeira dos “imperialistas” para terem o direito a serem ricos, como já confessou o velho general do “primeiro tiro” – qual episódio desta imensa trágico-comédia, agora também muito contestado?
Por que é que nos andaram a dizer todos estes anos que queriam libertar a terra e os homens, para que eles encontrem o seu próprio destino e a solução dos seus problemas, e agora tornaram-se nos principais dependentes das soluções externas e aliados do que antes chamavam “interesses imperialistas”? Não era esta a tal “mão externa”? A tal mãozinha marota?!..
Onde está a coerência? Não terão razão aqueles que dizem que os ditos libertadores da pátria queriam era serem os novos “colonos”?
Não terão razão aqueles que dizem que o que estes senhores da Frelimo querem é ter o “saco na mão” para comprarem a consciência dos “miseráveis” de modo a eternizarem a “exploração do homem pelo homem”?
Comprar consciências, comprar votos alguma vez se pode considerar cometimento com a construção da Democracia?
Não terão razão aqueles que dizem que estes senhores da Frelimo estão mais para abocanharem as riquezas do Estado e dos outros, em vez de governarem bem o Estado, criando escolas com qualidade, hospitais com qualidade, estradas com qualidade, caminhos-de-ferro com qualidade, portos com qualidade, transportes com qualidade, ensino com qualidade e mais emprego e comida?
Já não se percebe realmente o que é que esta gente quer? O que é certo é que se pelam por andarem com o “saco das notas” na mão. Para eles “Moçambique que se lixe! O Estado que se lixe!”.
Pobre povo enquanto continuar distraído!
Os moçambicanos têm mesmo de pensar muito bem quem querem realmente que os dirija. Têm mesmo de encontrar alternativas a este tipo de autênticos desavergonhados. Com estes “invertebrados”, passe a expressão, não vamos mesmo a lado nenhum.
E para terminar voltamos a lançar o desafio para que apareça rapidamente alguém que nos diga abertamente que quer de facto liderar a mudança. Até aqui mudar tem sido “vira o disco e toca o mesmo”.
O silêncio dos opositores que já se perfilaram como alternativa, não se pode manter. Também lhes cabe definirem-se, de uma vez por todas: ou estão para imitar os que pretendem substituir e aí é melhor não tentarem enganar mais o povo, ou passam a dar provas de que estão mesmo virados para mudar Moçambique.
É urgente lutar-se todos os dias em todas as frentes, em todas as províncias, em todas as cidades, em todas as vilas, em todos os lugares.
Não é com este silêncio e com esquemas puramente “familiares” ou estratégias “paroquiais” que podemos ir mais longe.
Os jovens têm mesmo de começar a agitar isto. É afinal o futuro deles que está comprometido. Se não acordam já, depois é tarde. Não fiquem à espera de dinheiro para começarem a apresentar políticas alternativas.
Quem já é rico não precisa de mudar nada. Já vive bem e quer continuar melhor. Se os que não estão bem não se mexerem e não lutarem por si, bem podem esperar sentados pela morte. “Camarão que dorme a onda leva”. Temos dito, por hoje.

(Editorial do Canalmoz / Canal de Moçambique)

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