Friday 18 July 2014

Terrorismo do Estado



 Beira (Canalmoz) – Em Moçambique, o que se chama aparelho do Estado, dever-se-ia chamar DJ do Estado.
Aparelho de Estado, apesar de raiar a sonoro, toca, mas não faz barulho. De música que se possa, ouvir o aparelho do Estado não tem som. Não são os funcionários quem cantam, nem são eles quem põem a música.
Há uma só voz no nosso aparelho do Estado. O corpo de funcionários que lá trabalham têm a função de “corear”. Repito, só fazem o coro.
Todo o aparato do aparelho do Estado, se alguma função tem, é reproduzir a monocórdia música do Partidão. Por isso, desde ao mais alto nível da Nação até à base, o aparelho do Estado é só uma coluna de reproduzir um único som. Mesmo das províncias, passando pelos distritos até à localidades, a coluna é só única, portanto monocórdia. Só não são monocórdios a multiplicidade de bailarinos que dançam a música única do DJ, que se dizendo do Estado, os põe a chorar com o subsídio mensal que nunca serve para comprar nada.
O aparelho do Estado existe para os funcionários bailarem a música que o DJ põe a tocar. Por isso, os funcionários fingem-se de colunas, simulam afinar pelos instrumentos da banda que o DJ orquestra.
O Estado também é dançarino, porque se deixa tocar na música que o DJ põe em forma de orientações, que os dançarinos dançam, que o Estado dança. Temos assim um Estado que é marioneta dos dançarinos e do DJ.
Insistimos em chamar aparelho do Estado à coisa que de aparelho só tem DJ. Moçambicano que é moçambicano sabe que há que dançar com destreza a música que da capital o DJ põe a tocar. É maneira de aguentar.
Moçambicano que é moçambicano o melhor que sabe fazer é dançar. Todo o moçambicano sabe dançar perfeitamente.
O moçambicano tem esse inato dom. Mesmo, dançar é a profissão mais corriqueira do moçambicano. Mexe bunda para aqui, mexe para lá. O DJ põe a música, e o moçambicano que está sob pressão da música, da dança e do DJ, pouco tempo tem para pensar.
Não é por acaso que se fala que este é o país do Pandza, país da Marrabenta.
Quando o DJ da Nação põe chibaleza, moçambicano que é moçambicano dança. Quando o DJ da Nação põe chibotela, moçambicano que é moçambicano vibra com o corpo, gira e rebola, dança segurando a menina do país. O DJ da capital, que toca para ser ouvido por toda a gente que vive fora da Nação, também desce à base, aos distritos e cidades, para fazer a música ao vivo, ao que chamam de “presidência aberta”, ao som das hélices dos helicópteros que custam afortunadas divisas ao país, com a maioria da populaça na pobreza absoluta.
Assim combatemos a pobreza absoluta.
Ilusão é pensar que os DJs subalternos põem a música. Nas províncias, postos administrativos e localidades, o DJ que vem da Nação é que afina o aparelho do Estado e o ritmo. Nos quiosques, nas discotecas e barracas nacionais, moçambicano que é moçambicano sabe que o controlo remoto funciona desde a capital.
O que explica a nossa pobreza, a nossa categoria de pobres bons ouvintes sem habilidade de expressão.
E se a música não tiver sido afinada pelo DJ da Nação, à partida, moçambicano que é moçambicano não dança.
O país tem essa organização, essa estrutura. O DJ de todos os DJs é quem escolhe, selecciona a cassete, o DVD ou o MP3 ou VDC a serem executados. Se a cassete escolhida na Nação nos orienta a virarmos à “esquerda”, então, como dançarinos moçambicanos que somos, nos pomos para a “esquerda”; se disser para a “direita”, nos pomos para a “direita”, porque conceberam que o bom patriota cumpre religiosamente orientações até ficar todo com o pescoço empinado de tanta obediência.
Estamos a ser amestrados para o “zacazá”.
A culpa não é do locutor ou apresentador. É uma maquete apenas que tende a ser reproduzida na TV e Rádio públicos, em cumprimento escrupuloso duma ordem, que garante cada vez mais a pobreza aos pobres que não têm canais alternativos de comunicação, quando o DJ se abastece de exteriores imagens de riqueza na sua televisão, em casa.
O país tem uma só pista de dança. O nosso país é um imenso palco de canto e dança.
Mesmo assim, o povo tem que dançar, para reinventar a alegria. Só dançar. Religiosamente. Moçambicanamente dançado. Sem pisar o risco da pista de dança, se não quer sarilhos com o DJ máximo.
Dizem que é maneira de aguentar. Moçambicano que é moçambicano pode dançar cinco anos em silêncio, com paciência, e só fala uma única vez – e é quando vota. Moçambicano que é moçambicano não falha nada. Moçambicano que é moçambicano não bate cabeça. Moçambicano que é moçambicano não bate a cambota.



(Adelino Timóteo, Canalmoz)

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