Tuesday, 5 June 2012

Eles constroem mansões e passam férias paradisíacas… nós pagamos a conta!

Quando se fala da corrupção em Moçambique nem todos entendem realmente o que está a acontecer. Há até certos segmentos da sociedade que entendem a corrupção como coisa de políticos e dos jornais. Mas a corrupção é, na verdade, um cancro que mata toda a sociedade e só beneficia um punhado de gente que tomou de assalto o poder no Estado e faz e desfaz perante a passividade do povo. Sim, passividade do Povo porque perante a situação a que chegaram as coisas, só um povo activo pode dizer “basta”!
Aqui nesta edição trazemos duas notícias que reportam casos de aparente corrupção na Administração do Estado. Escrevemos “aparente corrupção” por uma questão meramente técnico-jurídica, uma vez que até que a sentença seja transitada em julgado, o sistema jurídico moçambicano privilegia a presunção de inocência dos acusados. Mas as evidências de que dispomos e acompanham os nossos artigos não deixam muita margem para dúvidas e deixam crer que realmente os casos em alusão são parte da tal corrupção que corrói este Moçambique e os menos avisados pensam que não afecta o seu dia-a-dia e os extractos sociais a que pertencem.
No primeiro caso: os importadores denunciam que alguns agentes das Alfândegas transformaram os seus postos de trabalho em verdadeiros “take-aways”, vulgo autênticas “mamadeiras”, donde tiram tudo o que precisam e o que não precisam para levarem uma vida de luxo. O truque é fazer cobranças paralelas, aos importadores de mercadorias que são comercializadas em Moçambique, para benefícios pessoais. Os esquemas são vários e podem ser vistos numa das nossas peças de destaques nesta edição.
O que interessa aqui é que as cobranças são feitas directamente aos importadores, beneficiam directamente os agentes corruptos, mas quem paga a factura é o consumidor, e o consumidor somos todos nós, os cidadãos que não estão pendurados no Estado e até mesmo esses porque também acabam por ser cidadãos.
Um importador que paga para subornar os agentes das Alfândegas, significa que aumentou a estrutura de custo dos seus produtos e como vende para lucrar, a opção única é aumentar o preço final. “Tempo é dinheiro” e ao fazer demorar não só outras coisas deixam de ser feitas por quem espera, como alguém terá depois de pagar o que foi despendido em taxas para corromper ou fazer andar os processos nas Alfândegas.
É por isso que um quilo de açúcar, uma dúzia de ovos, um litro de leite fresco, um quilo de carne, uma galinha – só para falar de algumas coisas – custa duas vezes menos na vizinha Swazilândia ou em Nelspruit, na África do Sul, do que em Maputo e noutra parte de Moçambique. É por isso que um telemóvel custa o dobro em Moçambique do que noutro país. Na verdade, estamos a pagar a factura da corrupção. Estamos a pagar tributo para eles – os corruptos pendurados no nosso Estado – irem de férias à Europa, ao Dubai, e construírem mansões como as que se vê no Belo Horizonte, na Sommerschield II, no Triunfo e um pouco por todas as cidades do país, algumas delas até escondidas nos cantos mais recônditos do País, onde ninguém possa despertar e ir tentar perceber de onde vem tanto dinheiro quando os salários que o Estado paga não justificam tanto. E até construir mansões no estrangeiro, designadamente na África do Sul.
Na verdade, aquelas mansões são deles, mas construídas com o nosso dinheiro e dos nossos filhos, extorquido pelas vias mais astuciosas.
Aquilo que devíamos poupar para pagarmos pela formação dos nossos filhos, por um pouco de vida melhor das nossas famílias, pagamos para os corruptos que nos governam e servem as instituições públicas, “curtirem” e ainda se rirem dos cidadãos.
É por isso que eles têm fortunas, criam universidades privadas e compram viaturas do último grito. É porque quem paga a factura somos todos nós, os cidadãos, ainda que possamos não estar conscientes disso.
O outro caso que tecnicamente aparenta corrupção e acaba também por ser uma forma de pôr o Estado – NÓS – a pagar a propaganda do Partido Frelimo, através da prestação de serviços tipográficos ao Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) a preços exorbitantes, é o que envolve Almerino Manhenje. É um exemplo.
O INSS que gere fundos dos trabalhadores para lhes garantir a aposentação com alguma dignidade, adjudicou a uma empresa de Manhenje, uma empreitada de produção tipográfica de materiais – diga-se, banais – que custou 25 milhões de meticais ao Estado quando o mesmo poderia ter sido feito por muito menos. Uma inspecção num Estado isento e não abocanhado por cidadãos que passam o tempo a falar de patriotismo com uma presunção escandalosa como o provam os factos, levaria a que todos os implicados fossem impedidos no mínimo de levar esta avante, mas aqui temos todos de fingir que não vemos para que a roubalheira prossiga.
Se o INSS é uma instituição improdutiva, que existe para gerir descontos aos trabalhadores (3%) e às empresas (4%), de onde saem os milhões para pagar canetas, blocos de notas, bandeiras, panfletos, chaveiros e outras quinquilharias do género? O que os reformados têm a ver com estes brinquedos que custam 25 milhões de meticais? Não seria mais sério usar esse dinheiro em acções reprodutivas de dinheiro, mais económicas e que no fim de contas acabassem por proporcionar melhores condições de vida a quem passou uma vida a trabalhar e a pagar para a reforma?
Quando se sabe que esses 25 milhões muito acima de outras cotações se destinam a empresa de um ex-ministro que até já foi condenado em Tribunal por desvio de fundos do Estado e está agora instalado nas instalações do que foi uma gráfica do Partido Frelimo, a sobrefacturação deve-se a meras questões técnicas?
Com este caso pode-se dizer que eles assaltam até as reformas de quem passou uma vida inteira a descontar para depois receber misérias.
Não basta o que roubam a quem trabalha ou empresários no activo, mesmo com o pouco que poupamos para a fase mais delicada da vida – a velhice ou invalidez – há já quem se entretenha a dar “palmadas”... Dá para percebermos até onde já se atrevem a abusar dos cidadãos.
Assim, se pagam até férias de sonho de muitos que se penduram no Estado, quando a muitas famílias falta o mínimo para viver e em muitos casos até o mínimo para sobreviver.
Enquanto eles comem, quem trabalha e paga ao INSS pode continuar a calar-se perante estas evidências nojentas?
Perante factos como o do negócio do INSS que aqui hoje revelamos será possível acreditar que não virá aí mais breve do que se pensa um novo 05 de Fevereiro de 2008 ou algo mais grave do que o 1 e 2 de Setembro de 2010?
A corrupção está à vista de todos que não querem esconder o sol com a peneira.
Nas alfândegas só não se dá ao trabalho de investigar quem também tem o “rabo preso”. No INSS só não vê quem também depois acabará por ir cobrar o fingir que não viu.
A questão que agora fica por responder é se alguma vez, por via de eleições organizadas por quem monta estas cabalas, os cidadãos moçambicanos alguma vez conseguirão ver-se livres da reprodução da miséria a que continuam a estar sujeitos.
Quem somos nós para dizer que por este caminho não vamos longe? Em melhor posição estarão os nossos confrades da CPLP que já se aperceberam – como disso damos também conta nesta edição – que Salazar e Marcelo Caetano – os tais “símbolos do colonialismo que negavam a autodeterminação e independência das colónias aos movimentos de libertação” – também organizavam eleições… Como o feitiço se virou contra o feiticeiro!... Gente séria é outra coisa!..

Editorial do Canal de Moçambique – 30.05.2012, citado no Moçambique para todos

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