Maputo - Dos mais de 900 médicos que aderiram às reivindicações em Moçambique, 300 reuniram no Jardim Nangade, na capital moçambicana, esta quinta-feira, 10 de Janeiro. A polícia foi chamada para garantir a ordem e a segurança no local.
Eles podem nos destruir se não estivermos unidos. Separados somos fracos mas todos juntos somos muitos e inquebráveis»,disse à imprensa o porta-voz dos grevistas, Jorge Arroz, referindo-se às ameaças a alguns médicos, por parte do Governo, a nível dos distritos.
Na óptica da sociedade civil, a greve dos médicos, que teve início a 7 de Janeiro, põe em risco o bom funcionamento do Serviço Nacional de Saúde e prejudica os doentes e o progresso nos cuidados de saúde que o País almeja alcançar. Para a sociedade civil, com a greve, o número de pacientes está a aumentar, dado que não têm o acompanhamento necessário. A paralisação está também a contribuir para o aumento de mortes nos hospitais e a pôr em causa os vários serviços intra-hospitalares e extra-hospitalares.
A greve dos médicos acontece, segundo alguns partidos políticos, pelo facto de o Executivo moçambicano não ter atenção aos apelos lançados pela Associação Médica de Moçambique (AMM), que reivindica a discussão e aprovação do Estatuto dos Médicos, o melhoramento da sua condição salarial, de entre outras exigências.
A sociedade civil condena a atitude do Governo que, segundo a instituição, consiste em intimidar os reivindicadores com ameaças de marcação de faltas ou outras sanções pela ausência dos médicos na sequência da greve, fazendo alusão ao Estatuto Geral do Funcionário Público. Assim, a sociedade civil apela ao retorno ao diálogo entre as partes, interrompido a 4 de Janeiro, devido a falta de consenso.
Quanto aos antecedentes, na manhã de Domingo, 6 de Janeiro, foi anunciada uma greve geral dos médicos moçambicanos. Esta posição, segundo a AMM, foi o culminar de anos de tentativas pacíficas de solucionar a deplorável situação dos médicos na função pública.
A insatisfação no seio dos profissionais de saúde tem-se manifestado desde 2008, ano em que lhes foram retiradas as residências atribuídas pelo Governo nas províncias, através da circular 191/GMS/08, de 16 de Junho de 2008. Não faltaram apelos ao Governo para que aquela circular fosse anulada mas o Executivo ignorou a chamada de atenção.
Já em Outubro de 2012, a Ordem dos Médicos e a AMM escreveram, sem sucesso, uma carta ao ministro da Saúde, Alexandre Manguele, na qual apelavam ao governante que mandasse revogar a circular em causa.
Face a esta situação, a 24 de Novembro, num encontro que juntou cerca de 200 médicos, em Maputo, os profissionais decidiram recorrer à greve como último recurso para exigirem a melhoria das precárias condições a que o médico nacional está votado, numa situação em que o estrangeiro goza de melhores condições.
De recordar que, em Novembro de 2011, foram apresentadas as preocupações do sector da Saúde ao Presidente Armando Guebuza, e as reivindicações actuais foram referidas. O Chefe de Estado prometeu que iria resolver o assunto mas, até ao momento e segundo a classe médica, nada foi feito.
A actual direcção da AMM foi eleita e tomou posse em Maio de 2012. Naquela cerimónia, o actual ministro da Saúde manifestou a sua satisfação e comprometeu-se a colaborar com a instituição.
Os médicos dizem ainda que, desde o início das actividades, só foram encontradas dificuldades mesmo em aspectos que iriam beneficiar o médico, como por exemplo, o bloqueio e o impedimento da execução de um acordo que permitiria a criação de uma página na internet que se pretendia que fosse também uma fonte de informação científica para os associados.
Na sequência das negociações iniciadas entre o MISAU e AMM sobre a revisão do estatuto e do salário, apenas participam médicos funcionários públicos.
Foi então que o MISAU apresentou uma proposta salarial inicial, em que haveria uma subida do salário base do recém-formado para 20 mil meticais, e 38 mil meticais para o especialista consultor. Feitas as contas, a subida real do salário líquido seria de cerca de 24 mil meticais actuais para 28 mil meticais para o recém-formado e dos 42 mil meticais para cerca de 48 mil meticais.
A referida proposta, segundo os grevistas, nunca fora discutida com os representantes da classe e já tinha cabimentação orçamental em Junho de 2012, em documento assinado pelo Ministro das Finanças.
A proposta foi apresentada em reunião geral de médicos, que juntou cerca de 400 profissionais de saúde, que teria chumbado a proposta do Governo por não responder às exigências mínimas da AMM.
No decurso das negociações foram acordados a composição das comissões e prazos (com documento assinado pelas partes) para o término das negociações com soluções aprovadas, 5 de Janeiro para a comissão de revisão salarial e 31 de Janeiro para a comissão de revisão do estatuto, que fez o seu trabalho sem grandes percalços.
Contrariamente ao acordado, deveriam integrar a comissão de revisão salarial membros do Ministério das Finanças e da Função Pública mas nunca foi explicada a sua ausência. Esta negociação foi conduzida lentamente com ausência injustificada pelo MISAU, a 24 de Dezembro, não sendo permitida a participação da AMM nos encontros nas finanças, para só no dia 3 de Janeiro apresentarem à AMM uma proposta salarial considerada pelos médicos como indecente, pois era menor do que a inicialmente chumbada, com um salário base inicial de 18 mil meticais.
A alegação apresentada pelo Governo foi de que o Orçamento do Estado já tinha sido aprovado, que não havia muito espaço de manobra devido à falta de dinheiro, além de que uma revisão no salário base do médico implicaria uma revisão de toda a estrutura salarial dos funcionários.
«Estamos a falar de 1274 médicos. Não há dinheiro para rever os salários mas há dinheiro para viaturas de luxo, helicópteros, passagens em primeira classe, pontes para lado nenhum. Durante as conversas na mesa de negociação houve quem lamentasse que, por causa da falta de dinheiro não tinha sido possível aos directores adquirirem viaturas novas em 2012. Perguntámos o que foi feito às anteriores? E às anteriores a essas? Passaram-nas aos familiares? Alega-se que não há dinheiro mas o Governo gasta com cada médico cubano que está no país $6000 por mês. Alega-se que não há dinheiro mas foi publicado no Jornal Notícias recentemente que a Assembleia da República vai rever, em Março, o seu Estatuto e Regimento. Será que verificaram que estão com despesas muito altas (880 milhões de meticais por ano) e vão reduzi-las?», questionou um médico que falou à PNN.
A reunião que estava prevista para 4 de Janeiro não aconteceu e a AMM viu-se obrigada a anunciar as directrizes para a greve. É quando médicos séniores conselheiros da AMM são chamados a um encontro com o MISAU e altos dirigentes do Ministério das Finanças que expõem a situação actual de insatisfação da classe e descrédito em que caíram pelas falhas sucessivas ao longo dos anos e ao apresentarem aquela contraproposta salarial.
Neste encontro foram dadas instruções para se encontrar uma nova proposta que, até à data do início da greve, 7 de Janeiro, não teve sucesso.
De referir que Moçambique tem 1274 médicos para uma população estimada em 22 milhões de pessoas.
(c) PNN Portuguese News Network
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