Thursday 25 June 2015

Quarenta anos de Independência levantando poeira escondida.


Entre verdades e meias-verdades a saga continua

Quarenta anos de Independência levantando poeira escondida.
 Qual é dificuldade de reconhecer-se que a génese exógena da guerra civil afecta todos? Porquê dar relevo e circunstância a um dos beligerantes e não apresentar os pontos de vista do outro, num processo que aconteceu e foi testemunhado por todos os moçambicanos?
Se havia conselheiros e apoiantes da Renamo provenientes das hostes dos serviços secretos rodesianos e zimbabweanos, quem não sabe que em todas as cidades moçambicanas prédios inteiros eram ocupados por especialistas militares soviéticos ao serviço do Governo da Frelimo?
Por favor, senhores combatentes da luta anticolonial, poupem-nos de mais repetições intragáveis do que sois e do que terão feito, porque desde 1975 nos bombardeiam com isso.
Acreditamos que desempenharam um papel de relevo na luta independentista, mas também sabemos que de democracia nada tinham, como agora alguns querem fazer crer. Aproveitar a ocasião dos “40 anos de Independência” para exacerbar posições e levantar ou fazer renascer ódios revela fraquezas ou uma vontade de esconder a verdade histórica.
A história não é linear e não possui pureza de que alguém se possa arvorar ou orgulhar em exclusivo.
A luta anticolonial foi um processo histórico que envolveu pessoas de todos os extractos sociais com pontos de vista diferentes quanto ao futuro de Moçambique.
De nada vale falar-se hoje que uns eram democratas e revolucionários e que os outros eram reaccionários e contra-revolucionários.
Outra coisa que pouca importância tem para os assuntos prioritários de hoje é apresentar somente uma face da história da luta anticolonial e da guerra civil subsequente. Estamos cansados de ouvir que a Renamo foi um fruto do regime racista da Rodésia de Sul e do Apartheid. A Frelimo foi fruto da Internacional Comunista, apoiada também por segmentos da esquerda ocidental e também por serviços de inteligência americanos. Fechemos essa página e evitemos apresentar versões de pureza e puritanismo jesuíta inexistente. A génese do movimento de libertação nacional teve génese endógena, mas foi fortemente influenciado pelos países que acolhiam os nacionalistas moçambicanos e sobretudo pelos protagonistas da Guerra Fria. Não poderia ser de outro modo.
Há muita poeira que teima em manter-se no segredo dos “deuses”, porque não convém que se conheça a verdade. Acreditamos que existem razões de Estado e de segurança do mesmo para que alguns assuntos e situações continuem no segredo. Mas isso não quer dizer nem jamais significará que tenhamos que aceitar uma determinada versão dos factos contra outra só porque quem o diz é fulano ou beltrano.
Alguma megalomania sobressai quando certas individualidades falam para o público sobre assuntos relacionados com a luta anticolonial ou contra o regime instalado no pós-independência. Alguns actores activos em ambos os processos querem empolar situações despropositadamente.
Outra cosia que é estranha é que uma agência de notícias do país antes colonizador se veja entregue à divulgação de entrevistas que até aquecem em vez de arrefecer ânimos na ex-colónia. De uma maneira insidiosa, parece que opera sob instruções que coíbem de mencionar aspectos menos conseguidos e menos éticos da governação, ao mesmo tempo que dão espaço especial a dignitários afectos ao regime de Maputo.
Um comportamento “inclinado” foi também característico dos dias que se seguiram ao 25 de Abril de 1974. Hoje sabe-se com mais ou menos clareza que houve um conluio entre determinadas forças portuguesas e a Frelimo para que a Independência acontecesse como se deu. A correlação de forças na altura era favorável aos desígnios dos apoiantes da Frelimo e parte do Governo português, MFA, queria ver o “dossier” ultramarino resolvido com rapidez. Hoje sabe-se que Frank Carllucci, CIA e Mário Soares tiveram protagonismo no desfecho da colonização em Moçambique, embora isso não exclua outros actores. Importa dizer que foi o que aconteceu, sem recurso a subterfúgios. Muitos do actores activos no processo tinham pacotes de instruções a seguir e não eram propriamente os mentores da linha seguida. Havia como que uma coordenação na sombra que envolvia Moscovo e o Departamento de Estado dos Estados Unidos da América. Nesse sentido, alguns dos protagonistas locais não passavam de peões muito simples.
Outra coisa que muitos evitam tocar é que o surgimento da Renamo é continuação de dissidências internas na Frelimo. Assim como antes tinha havido COREMO. Nesse sentido, é uma mentira grosseira dizer que os rodesianos são os fundadores da Renamo. Uma coisa são apoios, e a Frelimo também os teve, e de todo o tipo de cor.
Não é possível resumir em breves linhas a história de Moçambique, mas seria um importante contributo para as gerações vindouras que algumas personalidades abrissem os seus arquivos pessoais e trouxessem informações relevantes para o público e historiadores.
Mas é possível dizer em breves linhas que continua negativamente uma corrente de mentira oficial, a negação de que os outros também lutaram por Moçambique, pela Independência e pela democracia que hoje, de um modo ou de outro, se vive.
Tão simples de entender e de assumir, mas que alguns teimam em não ter em conta como factor de união real e de concórdia num país carente de reconciliação.
É tempo de os estudiosos de história moçambicana abordarem figuras políticas de todo o espectro político e raciocinar sobre os seus relatos de maneira a reconstruir uma história reveladora dos factos, para assim reescreverem os livros em que as crianças do país aprendem o passado do nosso país.
Há uma inegável sede em se conhecer uma história que aproxime pessoas e não as afaste como se de inimigos se tratasse.
Face ao que se vive nos dias de hoje, é importante tirar ilações que nos levem a conclusões práticas de que afinal nem somos inimigos.
Compatriotas, aproxima-se vertiginosamente o dia em que se celebra a Independência de Moçambique, e esse dia cobre a todos, independentemente da filiação partidária e de qualquer outro tipo de orientação.
Seria bonito e reconciliador vermos todos os partidos políticos participando, mas, para que isso aconteça, é necessário que se afastem do cenário encenações que coloquem uns em primazia e outros como espectadores subalternos de agendas que subalternizam os outros segundo critérios irracionais e politicamente desfasados com os tempos e a realidade política nacional.
Julgamos que uma liderança desacorrentada de preceitos e alianças que pouco dizem à agenda nacional ajudará a remover os obstáculos que persistem no caminho da reconciliação nacional.
Perdoar e reconciliar são exercícios necessários e de possível concretização quando há liderança.
Olhar para estes 40 anos deve ser uma ocasião especial de reflexão em que os moçambicanos se entregam a uma avaliação do que precisa de continuar a ser feito para unir almas e destinos sem subterfúgios nem pretensiosismo.
“Juntos e sempre juntos” deve ser a divisa nacional conjugada e praticada todos os dias.
Bem vistas as coisas, há espaço e recursos para todos.
Afastemos o fantasma da guerra agindo em prol da paz e da concórdia nacional.
Sem fintas nem peneiras de heróis sacrossantos.



(Noé Nhantumbo, Canalmoz)
 

No comments: