As elites urbanas não aderiram à guerra movida pela Renamo logo após a independência do país, em 1975, porque interpretaram o conflito como consequência da hostilidade dos países vizinhos, considera o académico Lourenço do Rosário.
“A guerra veio, mas a guerra foi interpretada mais como uma consequência da hostilidade dos nossos vizinhos do que das nossas contradições internas, portanto, não houve por parte do cidadão urbano, intelectual, uma adesão às causas desta guerra”, diz Lourenço do Rosário, sobre o conflito que durante 16 anos, até 1992, opôs o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) e a Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), actual principal partido de oposição.
A Renamo, continua o académico, não produziu, ao longo dos 16 anos de guerra civil, uma classe intelectual, nenhuma literatura, nenhuma arte à volta desta guerra, porque a classe intelectual encarou o conflito no contexto da animosidade geopolítica, primeiro instigada pelo regime branco da ex-Rodésia, actual Zimbabué, e depois pelo regime racista do “apartheid”, da África do Sul.
No entender de Lourenço do Rosário, actualmente um dos mediadores das negociações entre o Governo da Frelimo e Renamo, apesar de não ter conseguido mobilizar a população urbana para a sua causa, o ex-movimento rebelde logrou cativar um sector importante da população rural.
“Capitalizava um pouco o descontentamento mais da população rural do que propriamente dos urbanos, os urbanos que não estavam satisfeitos com o regime [da Frelimo] iam-se embora daqui, não ficavam aqui a aderir a causas”, diz Rosário.
Na opinião do académico, a Renamo lutava apenas para substituir a Frelimo e não pela democracia, como proclama o movimento, até porque, sustenta, o comportamento do partido não é muito diferente.
“O discurso inicial da Renamo não era esse [lutar pela democracia], o discurso inicial da Renamo era essencialmente lutar contra os campos de reeducação, os ícones do regime, e não pela democracia, até porque, depois, há de verificar que o comportamento da Renamo não é muito diferente da Frelimo”, considera Lourenço do Rosário.
Para o académico, na Renamo vêem-se tal como na Frelimo tiques de partido único, patrimonialista e arrogância política. “Eles é que são os donos da razão, eles é que são os da agenda nacional, o mesmo comportamento que a Frelimo teve quando assumiu a independência”.
Por isso, se a Renamo ganhasse as eleições, diz Lourenço do Rosário, teria a mesma forma de pensar da Frelimo, de quem acha que é o dono da verdade.
Segundo Rosário, a maioria da população rural não compreendeu, no início, o debate público sobre a introdução do multi-partidarismo, pois achava que ia enfraquecer o poder do Estado.
“Aceitamos todos, inclusivamente o Governo aceita, que há combatentes da luta de libertação nacional, combatentes da soberania e combatentes da democracia, são formulações, mas, de facto, na profundidade, a história da democratização de Moçambique não é interna, vem do exterior”, salienta.
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