Nasci precisamente no dia da cidade de Maputo e no ano de 1959, nessa linda cidade que na altura se chamava Lourenço Marques. Filho de pais portugueses que como muitos outros portugueses, vieram para Moçambique à procura duma vida melhor que Portugal não oferecia.
Cresci na cidade da Matola junto de tantos outros filhos de portugueses e outras crianças filhos de moçambicanos. Cresci a subir às mangueiras, a apanhar pássaros, a nadar no rio e a fazer o que todas as crianças faziam.
Na escola achava estranho viver em Moçambique e estudar os rios de Portugal. Na escola achava estranho chamarem a Moçambique uma Província de Portugal. Achava estranho estudar geografia e os exemplos eram de cidades portuguesas e de regiões portuguesas. Achava estranho e perguntava e a resposta era sempre a mesma: Moçambique é Portugal. Mas como uma terra distante da outra pode pertencer a outro País?
Nestas minha dúvidas e com o meu crescimento bem como com o relacionamento que tinha com outros moçambicanos, fui ganhando consciência da época que estava a viver e comecei a revoltar-me. Recordo-me que nas noites quentes de Verão ia para a casa dum amigo e ali, com as luzes apagadas e sempre a espreitar nas janelas, ouvia uma rádio proveniente da Tanzânia, onde um soldado português capturado pela Frelimo, falava e dizia o que realmente estava a acontecer.
Portugal a mim não me dizia nada. Lisboa? Uma cidade distante… tal como outras cidades da Europa. Em minha casa falava-se das vindimas, das cerejas, do frio e eu não me via naquelas conversas. Se falassem de mangas, de caju, da praia do Bilene, do calor, aí sempre entendia. Era o meu mundo!
Finalmente chega o 25 de Abril e a minha maior alegria quando tomei conhecimento que o governo português tinha chegado a acordo com a Frelimo para a transferência do poder. Fiquei feliz quando em Maputo comecei a ver as tropas da Frelimo a patrulharem a cidade juntamente com as tropas portuguesas que entretanto se foram embora. Fiquei radiante quando no estádio da Machava assisti como muitos moçambicanos ao arrear da bandeira portuguesa e ao hastear da bandeira do meu País. Vivi momentos emocionantes, chorei como nunca. Foi linda a festa….
Mas a tristeza estava a chegar. Como a minha mãe (o meu pai havia falecido) queria regressar a Portugal e eu apenas tinha 16 anos, portanto menor, não podia ficar pois nem família tinha, fui obrigado a vir para Portugal. Chorei imenso e no dia em que embarquei no aeroporto de Maputo, quando caminhava para o avião, disse para mim mesmo: um dia vou voltar!
Em Portugal tornei-me português obrigatoriamente. Estudei, trabalhei e quando tive posses económicas regressei a Moçambique de férias e no mesmo aeroporto voltei a chorar, mas de alegria de ter voltado.
Tenho a nacionalidade portuguesa mas sou Moçambicano. Como é isso de ser português e ser moçambicano? Tenho um bilhete de identidade português mas o meu sangue é moçambicano. Choro por Moçambique, tenho alegrias por Moçambique e ao ouvir o hino moçambicano sinto que o meu coração treme de emoção. Amo Moçambique!
Mas não posso ser moçambicano porque a lei não me permite. É triste esta situação. Vivo ainda em Portugal onde trabalho numa força de segurança portuguesa, mas o meu desejo é regressar ao meu País e ajudá-lo a crescer. É triste ser tratado como estrangeiro no meu país.
Vivo a minha moçambicanidade através da internet com ligação aos sites de Moçambique, visitando uma vez por ano o meu País, mas ao chegar e no aeroporto ao encaminhar-me para a fila dos estrangeiros, sinto uma dor grande no meu coração.
Eu sou moçambicano, nascido em Maputo.
( Rui Almeida, Savana )
4 comments:
Nacionalidade é muito mais do que o que se pretende que seja. Pena que quem é e sente não o pode ser.
Como o compreendo. Ser Mocambicano, nao e so ter a nacionalidade mocambicana, mas tambem ter Mocambique sempre no coracao, embora distante da nossa patria. Como ele, ha muitos outros, embora haja outros que la vivam e tenham a nacionalidade, mas nao teem orgulho nem interesse na vida economica ou politica que se vive no pais. Sim, fomos ensinados na escola que Mocambique era Portugal, isso fazia confusao a muitos que se interrogavam constantemente, a medida que iam crescendo, o que isso queria exactamente dizer.
Maria Helena
Amigas Ximbi e Maria Helena, sem dúvida que o conceito de nacionalidade teria de ser mais abrangente, mas infelizmente nem todos compreendem isso.
Entendo-te e é assim que me sinto. Escreveste tudo o que sinto.
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