Tuesday 25 January 2011

Governo deve rever a legislação sobre direitos e regalias dos altos dirigentes do Estado


Nota de Imprensa no. 01/2011


Maputo, 20 de Janeiro de 2011


· A concessão de direitos específicos e seus critérios de atribuição são tratados em documentos de extrema confidencialidade e sem suporte jurídico-legal
· Cada instituição pública fixa (com confidencialidade) os direitos a conceder aos titulares ilegíveis do órgão, num claro sinal de falta de transparência
· A actual legislação apresenta-se permissiva, atendendo que maiores benefícios são concedidos aos entes dirigentes após cessarem o exercício de funções públicas, altura em que não são produtivos para o Estado

O Governo Moçambicano deve, com carácter de urgência e no âmbito da reforma legal em curso, rever a legislação que concede direitos e regalias aos Dirigentes superiores do Estado, por forma a que o Estado Moçambicano reduza a despesa pública, pautando por uma conduta de austeridade na gestão do bem público.
Esta reforma se afigura necessária e urgente porquanto a legislação sobre os direitos e regalias da elite política moçambicana se encontra desajustada da realidade actual e da conjuntura de crise, para além de estar dispersa por vários diplomas legais, conduzindo a um tratamento não uniforme e por vezes contraditório das matérias que regula.
Na forma como actualmente está estabelecido, o quadro legal sobre a concessão de direitos e regalias aos dirigentes superiores do Estado transformou, na prática, o exercício de cargos públicos numa forma de obtenção de recursos materiais e financeiros de forma facilitada e de outras benesses para os titulares de cargos públicos e seus dependentes (durante e findo o exercício de funções públicas), numa escala questionável, atendendo a sua extensão (dos beneficiários) .

Necessidade imperiosa de redefinição do conceito de dirigente superior do Estado

A legislação concernente a concessão de direitos e regalias aos designados Dirigentes superiores do Estado apresenta-se sem rigor e clareza necessárias, acerca de quem deve ser considerado Dirigente superior do Estado e como tal mostrar-se ilegível para usufruir das benesses da função ou cargo que exerce.
A Lei 4/90, de 26 de Setembro lista uma série de figuras com a designação de Dirigentes superiores do Estado, com a finalidade de as conferir direitos e regalias, bem como os correlativos deveres. No entanto, a Lei 7/98, de 15 de Junho que visa rever a legislação sobre a matéria ligada a concessão de direitos e regalias e a fixação dos respectivos deveres, vem conferir uma nova designação aos membros do executivo, que já constavam da Lei 4/90 como Dirigentes superiores do Estado, nomeando-os como “titulares de cargos governativos” sem revogar ou ao menos ab-rogar (isto é, revogar parcialmente a lei anterior).
Estas contradições entre as duas leis estendem-se de seguida ao documento que se refere aos salários, com a designação dos beneficiários como “Quadros dirigentes” e a respectiva lista passa a contar com outras figuras que não constam das Leis 4/90 e 7/98. O que se questiona na situação em análise é o facto de um documento sem as características de uma lei vir a posteriori incluir figuras que as leis em referência não as consideram, nem titulares de cargos governativos e nem dirigentes superiores do Estado, e criar a designação de “quadros dirigentes”.

Extrema confidencialidade na concessão de direitos e regalias

A publicidade dos actos ligados a concessão de direitos e regalias e bem como a imposição dos correlativos deveres aos entes públicos (funcionários e agentes do Estado) e aos designados Dirigentes superiores do Estado (que exercem cargos governativos), assim como a sua modificação devem ser prática num Estado que se quer de Direito, no sentido de buscar transparência na gestão da coisa pública e a certeza jurídica dos actos a praticar.
A título ilustrativo, os valores referentes aos salários a auferir mensalmente pelos designados Quadros dirigentes ou Dirigentes superiores do Estado encontram-se plasmados num documento (simples papel onde são indicadas três tabelas diferenciadas pelas letras A, B e C e onde constam ainda os valores para o pagamento de água e luz, telefone fixo, empregados domésticos e despesas de representação).
O referido documento relativo aos salários mensais da elite política moçambicana não está publicado em Boletim da República (BR) e nem é indicada a entidade de sua proveniência para que se possa aferir da sua competência como órgão, para a produção de diplomas legais que tratem de matérias de semelhante conteúdo.
É uma situação que conduz a que a concessão de direitos específicos - como salário, ajudas de custo, despesas de representação, pagamento de telefone celular, direito a viagem em classe executiva, ajudante de campo e pessoal ligado ao serviço doméstico, valor para pagamento de renda de casa - e os critérios de atribuição sejam tratados em documentos de extrema confidencialidade e sem suporte jurídico-legal (no sentido de que não são aprovados por diplomas legais que seguem o prescrito na lei).
Servindo-se dessa confidencialidade, cada instituição pública fixa os direitos a conceder aos titulares ilegíveis do órgão, num claro sinal de falta de transparência - em atropelo a obrigatoriedade de publicação de quaisquer actos jurídicos ou diplomas legais que conferem direitos e regalias aos entes públicos pertencentes a qualquer escalão na hierarquia da Administração pública ou a membros do Governo, assim como a modificação dos mesmos deve ser feita com base em diplomas legais.

Ciclo de gastos imensuráveis para as contas públicas

Questiona-se, igualmente, a economicidade de tais benesses, na conjuntura em que o país se encontra - de elevada dependência de fundos externos, pouca produção e produtividade interna e logo desempenho fraco da economia nacional e o estágio de desenvolvimento do país..
Está em causa a falta de clareza sobre os valores referentes ao pagamento de água e luz, telefone fixo, empregados domésticos e despesas de representação constantes da tabela salarial referente aos designados Quadros dirigentes. Nesta tabela não se faz referência aos valores alocados para o pagamento de tais despesas pelo Presidente da República, Presidente da Assembleia da República e Primeiro-Ministro.
Para efeitos de prestação de contas, esta obscuridade pode conduzir a gastos difíceis ou mesmo impossíveis de mensurar por inexistência de um tecto que as limite. Na actual situação, esta atitude equivale ao conferir de autênticos “cheques em branco” a tais figuras, sem critérios claros de valoração e economicidade.
O efeito perverso da actual legislação sobre a matéria dos direitos e regalias da elite política moçambicana é de uma permissividade tal, que maiores benefícios são concedidos aos entes dirigentes após cessarem o exercício de funções públicas, altura em que não são efectivamente produtivos para o Estado.
A concessão de reformas em tempo curto de actividade para alguns dirigentes superiores do Estado e o possível acumular de outras reformas (atendendo que tais ex-dirigentes acabam por prestar serviço em outras entidades do Estado ou empresas públicas ou maioritariamente participadas pelo Estado), gera um ciclo de gastos e uma pressão cada vez maior sobre os fundos públicos. Este facto alia-se a abrangência dos benefícios concedidos a titulares de cargos públicos, que na legislação em vigor vai até ao nível do chefe do posto administrativo, não se respeitando aspectos importantes de necessidade e economicidade.

Recomendações

Pelas questões e razões acima expostas, o CIP recomenda uma revisão profunda da legislação que concede direitos e regalias dos dirigentes superiores do Estado, no âmbito da reforma legal em curso, visando torná-la consentânea com a realidade sócio-económica do país..
O CIP encontra pertinência desta recomendação em virtude das recentes medidas de austeridade tomadas pelo Governo, a 7 de Setembro último, mexerem em parte com a questão dos direitos e regalias dos dirigentes superiores do Estado.
Por isso, mostra-se imperioso transformar em diplomas legais toda a matéria referente a concessão de direitos e regalias aos Dirigentes superiores do Estado, visando conferir maior transparência a actividade governativa e tendo em atenção, na sua concessão, o nível de desenvolvimento económico do país.
Pretende-se que o Estado seja racional nos gastos que efectua, através de um nivelamento por cima, abrangendo em primeira linha os entes públicos que auferem maiores rendimentos, pela redução da quantidade de direitos e regalias que lhes devem ser concedidos durante e no final do exercício de cargos públicos.

Esta análise pode ser lida, na íntegra, na Newsletter do CIP - Edição 7 (pág. 17 a 24), através da
seguinte ligação: http://www.cip.org.mz/cipdoc/55_Cip_newsletter7.pdf.
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