A Tunísia está a viver em Dezembro/Janeiro o que nós vivemos aqui em Setembro.
O que se está a passar por estes dias naquela país é grave, muito grave, e talvez, devido à distância geográfica, (será só por isso?) – o país fica na chamada região do Magrebe, lá bem no norte de África – não estamos a prestar a devida atenção aos acontecimentos. No último mês morreram, dependendo da fonte – o governo fala em 21 e as organizações da sociedade civil e os sindicatos em 50 – dezenas de pessoas em violentíssimos protestos de rua contra o elevado custo de vida e a falta de perspectivas.
A Tunísia, que até há pouco era dos países mais estáveis de África, com um turismo altamente desenvolvido e com índices de pobreza que se assemelhavam mais aos seus vizinhos europeus do que aos africanos, mergulhou desde o passado mês de Dezembro numa crise profunda com a população a sair à rua em manifestações tumultuosas.
Actualmente, o presidente Zine El Abidine Ben Ali, enfrenta o maior desafio de sempre e a contestação, que começou por ser social, é agora política, com um forte cunho anti-governamental.
Ben Ali é um Hosni Mubarak à dimensão do seu país. Militar de carreira, subiu ao poder em 1987 para nunca mais o largar. E se nos primeiros anos imprimiu uma forte repressão e um elevado culto da personalidade, com a onda da democracia deu ares de democrata, organizando periodicamente escrutínios que vence com percentagens que só as ditaduras permitem.
Tal como os nossos dirigentes nas manifestações do passado dia 1 de Setembro, também Ben Ali proferiu declarações infelizes, apelidando os manifestantes de arruaceiros, agitadores e anti-patriotas.
Tal como aqui, também lá estas declarações só vieram acirrar os ânimos e redobrar os protestos. Mas lá, em vez de se fecharem ruas, fecharam-se as escolas secundárias e as universidades, esses antros onde os tais arruaceiros se reúnem para conspirar contra um poder que se julga ‘imbeliscável’.
Porque lá, ao contrário do cá, quem engrossa as ‘manifs’ são os jovens estudantes, a classe média, as organizações da sociedade civil, os licenciados que estão no desemprego e, devido à crise profunda que a Europa atravessa, – a Tunísia depende sobretudo do mercado deste continente –, não vislumbram qualquer saída para as suas vidas.
Lá, ao invés de cá, quem está na rua a dar literalmente o corpo ao manifesto, é gente esclarecida, gente que conhece os seus direitos, gente que já viveu relativamente bem e que agora passa fome. E essa gente é sempre mais perigosa para o poder do que a outra que só conheceu a miséria e mal sabe juntar duas letras.
Porém a razão de fundo é comum às duas realidades: o divórcio cada vez maior entre governantes e governados.
O desconhecimento profundo de como vive o povo, esse ‘não tou nem aí’, como dizem os brasileiros, é indesculpável em governantes que são eleitos pelo mesmo povo que desprezam.
Escrito por João Vaz de Almada, A Verdade
O que se está a passar por estes dias naquela país é grave, muito grave, e talvez, devido à distância geográfica, (será só por isso?) – o país fica na chamada região do Magrebe, lá bem no norte de África – não estamos a prestar a devida atenção aos acontecimentos. No último mês morreram, dependendo da fonte – o governo fala em 21 e as organizações da sociedade civil e os sindicatos em 50 – dezenas de pessoas em violentíssimos protestos de rua contra o elevado custo de vida e a falta de perspectivas.
A Tunísia, que até há pouco era dos países mais estáveis de África, com um turismo altamente desenvolvido e com índices de pobreza que se assemelhavam mais aos seus vizinhos europeus do que aos africanos, mergulhou desde o passado mês de Dezembro numa crise profunda com a população a sair à rua em manifestações tumultuosas.
Actualmente, o presidente Zine El Abidine Ben Ali, enfrenta o maior desafio de sempre e a contestação, que começou por ser social, é agora política, com um forte cunho anti-governamental.
Ben Ali é um Hosni Mubarak à dimensão do seu país. Militar de carreira, subiu ao poder em 1987 para nunca mais o largar. E se nos primeiros anos imprimiu uma forte repressão e um elevado culto da personalidade, com a onda da democracia deu ares de democrata, organizando periodicamente escrutínios que vence com percentagens que só as ditaduras permitem.
Tal como os nossos dirigentes nas manifestações do passado dia 1 de Setembro, também Ben Ali proferiu declarações infelizes, apelidando os manifestantes de arruaceiros, agitadores e anti-patriotas.
Tal como aqui, também lá estas declarações só vieram acirrar os ânimos e redobrar os protestos. Mas lá, em vez de se fecharem ruas, fecharam-se as escolas secundárias e as universidades, esses antros onde os tais arruaceiros se reúnem para conspirar contra um poder que se julga ‘imbeliscável’.
Porque lá, ao contrário do cá, quem engrossa as ‘manifs’ são os jovens estudantes, a classe média, as organizações da sociedade civil, os licenciados que estão no desemprego e, devido à crise profunda que a Europa atravessa, – a Tunísia depende sobretudo do mercado deste continente –, não vislumbram qualquer saída para as suas vidas.
Lá, ao invés de cá, quem está na rua a dar literalmente o corpo ao manifesto, é gente esclarecida, gente que conhece os seus direitos, gente que já viveu relativamente bem e que agora passa fome. E essa gente é sempre mais perigosa para o poder do que a outra que só conheceu a miséria e mal sabe juntar duas letras.
Porém a razão de fundo é comum às duas realidades: o divórcio cada vez maior entre governantes e governados.
O desconhecimento profundo de como vive o povo, esse ‘não tou nem aí’, como dizem os brasileiros, é indesculpável em governantes que são eleitos pelo mesmo povo que desprezam.
Escrito por João Vaz de Almada, A Verdade
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