Friday, 22 January 2010

O que o Povo quer é mais obras e menos conversa politiqueira

Editorial

Maputo (Canalmoz) - O novo governo central acaba de tomar posse. Pouco mudou, relativamente ao mandato anterior: “O Estado Sou Eu”. Estamos, agora, numa espécie de dinastia do “Rei Sol”. Está tudo nas mãos de um só homem. E, como está patente na composição do governo anunciado e já investido, a etnicidade e o regionalismo voltam a ser preocupação, a par da fidelidade. Veremos se a competência corresponde.
Para quem, como nós, tem por critério a competência e não a origem étnica de quem é chamado a exercer cargos nos órgãos de soberania, do Estado e nas instituições subjacentes, toda e qualquer tentativa de se resolver problemas por essa via, preocupa-nos sobremaneira; isto porque:
- O Povo quer obras.
- O Povo está farto de politiquices.
- O Povo quer habitação.
- O Povo tem fome.
- O Povo quer vender o que produz, quer estradas para o escoar e ir ao encontro de mercado a preços compensatórios.
- O povo quer viver bem, como vive quem vai para o governo e só se tem preocupado com o seu umbigo – valha-nos a ponte sobre o Zambeze, construída com fundos externos!...
Se importância se deve, ainda, dar aos factores étnico e regional, não deve ser, em nossa opinião, para satisfazer quem quer excluir os que eventualmente, por mérito, possam opor-se-lhes ou possam obstruir as aspirações de quem vê na sua origem uma oportunidade para derrotar quem é mais capaz.
As pessoas querem é obras. Pouco ou nada lhes interessa se fulano é do Niassa ou de Inhambane.
Temos vindo a ver que, para se fazer crer que se está a lidar com a política tendo em conta a necessidade de se promover equilíbrios étnicos e regionais, nomeiam-se pessoas tendo isso em conta, mas, no fundo, o essencial acaba por não ser feito, ou porque os escolhidos não são os melhores para orientar o que deve ser feito, ou porque foram investidos nos cargos apenas para parecer o que convém a alguém.
Para quem tem, essencialmente, o intuito de se rodear de obedientes servidores, para satisfação dos seus desejos pessoais, este governo pode estar certo, como o anterior esteve, nessa perspectiva. Mas, que fique claro: os resultados oficiais das últimas eleições são de mais de dois terços, mas não do todo do eleitorado que se recenseou. São de apenas 45% do eleitorado que foi às urnas e, mesmo assim, usando, o beneficiário, de instituições claramente manipuladas, para a obtenção de tão “retumbante vitória”.
Em algumas províncias, os resultados deram 80% aos vencedores, mas, nesses mesmos círculos, foram às urnas menos de 25% dos habilitados a votar.
As engenharias étnico-regionais podem dar a sensação que o Mundo teve quando caiu o Muro de Berlim: euforia. Mas não é só depois da tempestade que vem a bonança. A bonança também tem precedido os grandes desastres…
Infelizmente, as engenharias étnico- regionais têm sido um preconceito estratégico, cínico, que deu origem à mentalidade política que a entidade que tudo faz para fazer crer que está empenhada em construir uma verdadeira democracia, criou, no seu seio, ao longo da respectiva história.
O que a população quer é uma melhor distribuição da riqueza; só que o mesmo critério étnico e regional não tem servido, quando disso se trata. Tem-se visto, isso sim, aos duques proporcionar-se algum fausto, para que o rei engorde.
Os cidadãos do Centro e do Norte, mesmo até os do Sul mais afastado de Maputo, e até mesmo os que embora próximos e na mesma cidade mais se afastam do centro privilegiado da cidade, não se importam que o seu dirigente seja originário de outras latitudes ou longitudes ou desta ou daquela etnia. Os cidadãos, o que querem é ver obras serem feitas nos seus centros de interesse. Querem ver os usurpadores do património comum bem longe do Poder, para que quem quer, realmente, o bem de todos, possa evidenciar-se livremente e ascender aos cargos a que estão conferidos poderes de decisão.
As pessoas querem no Poder quem faz, não quem diz que faz para dar conversa a distraídos.
As pessoas querem, por exemplo, ver o porto de Nacala ter accionistas residentes em Nacala, mas o que está a acontecer é que as pessoas de onde estão os empreendimentos nunca são chamadas a adquirirem acções nesses empreendimentos. São, sempre, os mesmos nomes, de residentes em Maputo, que se andam a tornar proprietários de tudo, ao longo do País. E é isso que está a afastar os cidadãos, da dita construção de uma democracia em Moçambique. As pessoas deixaram de acreditar nos processos de escolha de quem querem que as dirija e faça a gestão do bem comum.
O desemprego, a miséria de quem tem de andar, de madrugada até altas horas da noite, a vender para ter um pão para a boca, o tal combate à pobreza absoluta tem sido, até agora, um fracasso, embora em retórica se diga o contrário.
Quem é eleito por tanta margem como a anunciada e promulgada tem, geralmente, mais povo na rua no dia da posse. O povo não fica indiferente como se viu.
O povo não anda contente – verdade se diga.
O povo quer alternativas. Não quer uma oposição comprometida. Quer uma oposição que realmente tenha propostas novas e novas caras.
Os reais desequilíbrios regionais continuam a existir e há muita gente que já chama aos senhores que do alto império falam de um mundo novo e de um futuro melhor, os novos colonialistas.
Já se fala em “colonialismo interno”, nas muitas regiões do País onde as pessoas produzem, mas não vêem resultados dos seus esforços.
Não basta nomear pessoas apenas originárias de todas as regiões do País, quando se sabe que todas elas têm as suas raízes e interesses actuais, em Maputo.
É preciso nomear pessoas cujos interesses não estejam na capital do País, independentemente de elas serem originárias daqui ou de acolá. Já estamos – e ainda bem – demasiado misturados para que a etnia continue a ser factor preocupante.
Os cidadãos querem ter quem os dirige, todos os dias, próximos de si. Não querem deixar de trabalhar, para receber visitas que lhes vão dizer, no seu próprio espaço, o que devem fazer e como.
Os cidadãos de Pemba não querem deputados por Pemba que vivem na Sommerschild, em Maputo. Querem deputados de Pemba, por Pemba.
O País precisa de um governo que governe, de facto e trabalhe para o que é necessário.
O País precisa de governantes que não governem com os olhos postos nos seus interesses pessoais.
Será que este governo vai, mesmo, governar ou vamos continuar a assistir aos governantes a enriquecerem nos cargos?
Terá o presidente investido, a coragem de publicar, ele próprio, a sua lista de bens e os da Senhora Primeira Dama e respectivos filhos, neste início de mandato e levar o seu Conselho de Ministros e governadores provinciais a fazerem o mesmo? Esse seria um exemplo inédito.
A Lei não obriga a isso, mas, com 2/3 da Assembleia da República, só não muda a Lei quem apenas anda a dizer-nos que quer combater a corrupção, mas, depois, arranja todo o tipo de subterfúgios para que o Povo não conheça as suas próprias habilidades mágicas.
É com exemplos que se deve passar a fazer política. É com gentes de cada terra que as obras se fazem. O povo sabe o que quer. Não precisa que vá alguém do governo à sua terra, para que as coisas sejam feitas. É preciso, sim, que, na terra, não haja quem, ao serviço de alguém em Maputo, esteja lá para impedir os empreendedores. É isso que tem de mudar: menos governantes e mais obras. Menos despesas com futilidades, mais empreendimentos concretizados. Menos conversas, mais coisas que se vejam. Menos impedimentos do governo e mais liberdade para empreender.
É esta a nossa primeira sugestão, a bem de um bom desempenho deste governo. Será que vão aceitar o repto?
Um bom prenúncio foi já termos ouvido que “quem critica quer o bem do País”. Já não se fala dos “apóstolos da desgraça”. Valeu a pena gozarmos com tal disparate. Esperamos que este saudável estímulo à crítica seja, mesmo, do fundo do coração. Até que enfim!?...Veremos!?

(Canalmoz / Canal de Moçambique)

2 comments:

Reflectindo said...

Concordo com a grande parte do que o autor destas linhas escreveu, porém, não concordo com ele quanto ao seu ponto de vista sobre o equilibrio étnico e regional na formacão deste governo.
Na minha opinião o equilíbrio étnico e regional tem que ser uma prática não só no governo, mas em todo o Estado Mocambicano, nos partidos políticos, e, consequententemente no desenvolvimento sócio-económico. Julgo falso quando se afirma que o Povo não se interessa destes factores.
Concordo que o equilíbrio étnico e regional não seja apenas simbólico, pois em todas as etnias e regiões há potenciais a explorar, há pessoas muito competentes. Também, concordo que o equilíbrio étnico e regional não seja um acto eleitorista, mas como eu disse, terá que ser um acto, um processo para estimular o desenvolvimento e o combate às assimetrias.

JOSÉ said...

Excelente visão, Reflectindo, este é um assunto pertinente, tem de haver um empenho sério da sociedade em geral para conseguirmos o equilíbrio étnico e regional, não pode ser só fachada.