Friday 14 August 2009

A Opiniao de Jessica Siba-Siba Macuácua

Ainda estão matando o meu pai

Tenho 14 anos. O meu irmão, o Walter, tem mais dois anos do que eu. Quando meu pai foi assassinado, eu tinha 6 anos. Ter 6 anos e idade para sermos crianças, para nos aninharmos no colo de um pai. Eu já tive esse pai, já tive esse colo, esse carinho.

A 11 de Agosto de 2001, roubaram-me tudo isso. Nesse dia, eu deixei de ser apenas uma menina. Passei a ser órfã. Minha mãe deixou de ser esposa feliz. Passou a ser viúva. A roupa dela escureceu e a alma dela também. Em redor da nossa mesa haverá para sempre um lugar vazio. Na nossa alma, há uma ferida que nunca mais para de sangrar.

Meu pai tinha 33 anos quando foi lançado para a morte. Os grandes chefes do meu pai, os grandes chefes de Moçambique apareceram no funeral. Todos me abraçaram e me dirigiram palavras de conforto. Fizeram promessas. E disseram que os culpados seriam conhecidos e punidos. Nunca aconteceu nada disso.

Disseram que fariam justiça doesse a quem doesse. Até aqui essa dor só pesa em mim, na minha família. A minha mãe diz que essa dor pesa em todos os que amam a verdade.

E a verdade é que nunca mais vi nenhum desses senhores que tantas promessas fizeram. Nem sequer nos dias de homenagem. Nunca mais apareceram. Ninguém. Eles esqueceram o abraço de conforto, esqueceram as promessas. Mas eu não esqueço. Como é possível esquecer? Algum de vocês esqueceria?

Há oito anos que me prometem fazer justiça. São mais anos de mentira do que aqueles que eu tinha quando mataram o meu pai. Agora que posso falar, eu quero dizer uma coisa, o crime que nos levou o nosso pai não foi cometido apenas naquele triste dia. Esse crime continua a ser cometido todos os dias. As falsas promessas, o fingimento que qualquer coisa esta a ser feito, essa falsidade esta ainda matando. Esta matando a minha crença na justiça. Nesta justiça que fica calada perante o sangue dos homens bons.

Não quero mais mentira. A minha voz e pouca e e pequena. Mas eu sei que há outras vozes, que há vozes de muita gente que ainda pergunta: onde esta a investigação? Ate quando os culpados estarão a solta?

Para isso, vos peco, meus titios, homens e mulheres do meu pais: não deixem que esqueçam, não deixem que continuem assassnando o meu querido pai, não deixem que fique frio e esquecido o nome de António Siba-Siba Macuacua.


* Filha de António Siba-Siba assassinado há 8 anos na homenagem ao jovem economista.

NOTA do José: As pessoas de bem jamais esquecerão.

2 comments:

Anonymous said...

Eu JAMAIS esquecerei. Esta carta deixou-me destrocada. Tenho filhos da mesma idade e mais novos. Nao os posso imaginar ficar sem o seu querido Pai, especialmente nas tragicas circunstancias como ocorreu esta tragedia. Ninguem que tenha coracao podera esquecer o que aconteceu a Antonio Siba-Siba. Acho que o pais ficou mais pobre e roubou-se a uma familia o direito a felicidade.
Nao consegui resistir a responder a este post, pois tocou-me profundamente.
Tenho estado afastada da net por causa de uma situacao que me perturbou e me tem incomodado bastante, que mexe bastante com a minha consciencia, conceito de etica, democracia e justica. Tenho meditado no assunto, mas nao encontro solucao a curto prazo. Tentei contactar alguem de direito, mas nao obtive resposta. Espero que consiga ler nas entre-linhas, pois nao gostaria de divulgar mais pormenores, por motivos que o meu amigo deve entender. Por motivos de seguranca, gostaria de me manter no anonimato.
Um abraco fraterno da
Maria Helena

JOSÉ said...

Maria Helena, penso que consigo ler nas entrelinhas, compreendo e aceito a sua decisão, embora fique triste.

Há na realidade situações confusas que perturbam mas posso-lhe garantir que estamos muito atentos e prontos para grandes lutas. Eu não pactuo com certas coisas que beliscam os meus ideais, por vezes sinto-me muito frustrado, mas penso que vale a pena lutar e é isso que estamos fazendo, há muitas coisas em jogo.

Evidentemente que tem de ser cautelosa com a sua segurança, respeito religiosamente o seu desejo de se manter no anonimato.

Porém, se me quiser contactar directamente ou por intermédio de outra pessoa, por exemplo pessoa amiga ou familiar, respeitando sempre o sigilo, deixo aqui os meus contactos, fique à vontade para usá-los, se assim o desejar.

E-mail = debatesedevaneios@gmail.com

Telemóvel na África do Sul = 0763126904 (0027763126904)

Telemóvel em Maputo, embora pouco usado = 845640236 (0025845640236)


Saudações amistosas para si e para a sua família do

José e família