Wednesday, 5 August 2009

Ainda Sobre os Puxa Sacos e os Apóstolos da Desgraça

Penso que este debate sobre os puxa sacos, lambe botas e apóstolos da desgraça provocou o fogo que muitos guardavam e não viam como tirar. Alberto Nkutumula, no seu blog, levantou a poeira e a reacção foi logo a seguir. É que ninguém gosta de ser chamado puxa saco, lambe bota ou apóstolo da desgraça, mesmo que ele ou ela realmente o sejam. Todos querem manter a sua dignidade e aqueles adjectivos retiram a dignidade do ser humano.
Entretanto persiste a pergunta: quem são os puxa sacos, lambe botas e apóstolos da desgraça e quem os cria? Alguém dizia ao comentar o meu primeiro argumento que: tanto os puxa sacos quanto os apóstolos da desgraça, todos são uns extremistas que não conseguem ver o meio-termo. Eu que agora prefiro chamar os puxa sacos de apóstolos da graça, acho que a diferença entre estes e aqueles é que os apóstolos da graça estão ao lado do messias e das bênçãos, enquanto os apóstolos da desgraça comem o pão que o diabo amassou.
E no final do dia, tudo tem a ver com o pão. O Pão-nosso de cada dia ou o pão do inferno conforme seja apóstolo da graça ou da desgraça. Uns incluídos na ceia e outros excluídos. Quem cria ou escolhe os apóstolos? A resposta é simples, a pessoa não nasce apóstolo, nem da desgraça nem da graça, normalmente é o messias que escolhe os seus apóstolos e os seus detractores. Se o povo escolhe um governo este escolhe seus amigos e seus inimigos. E eu, gosto de pensar que tanto amigos quanto inimigos não passam de conceitos inventados no nosso imaginário. Imaginários cauterizados pelas crenças individuais de cada um.
Perguntaram-me se na sociedade política em que vivemos podemos ser outra coisa que não seja apóstolo da graça ou da desgraça? Eu acho que sim. Embora acredite que ninguém nos dá essa chance de sermos ou não sermos. Há sempre um dever. Um dever provocado pelos nossos medos. A abstracção é o primeiro passo para sobreviver o evangelho da graça ou da desgraça. Só aquele que não orienta os seus princípios com a cor das estradas, das árvores e dos passeios de Moçambique é que pode escolher uma bancada própria. Penso sempre no imaginário do ser humano.
Mas é também verdade que puxa sacos e apóstolos da desgraça não apareceram agora com a governação de Guebuza. Eles sempre existiram, só mudavam de nomes. Por exemplo alguns apóstolos da desgraça já foram chamados de reaccionários, rebeldes, oposição, entre outros e os lambe botas são sempre aqueles que nunca olham para as falhas mas elogiam tudo até no ridículo. As vezes é o próprio messias que depois lhes chama à consciência. A outra coisa é que, o Reflectindo tem razão, ninguém perguntou ao Presidente da República o que quis dizer com apóstolos da desgraça, embora estivesse tudo bem claro. E as vezes é bom não questionar o óbvio.
Ser puxa saco ou lambe bota, não é o mesmo que idolatrar. Aquele que idolatra à alguém praticamente que não usa da razão na sua atitude. Já o puxa saco e o lambe botas o fazem conscientemente. O apóstolo da desgraça, muitas vezes não usa da razão, já vem com uma mente corrompida e enchida de preconceitos, é o contrário do técnico que friamente analisa os dados antes de emitir uma opinião. Usando este método racional, podemos distinguir os apóstolos da graça dos apóstolos da desgraça.
Agora, não devemos esquecer que, independentemente de tudo que se pode dizer, independentemente dos nomes que depois podemos receber e independentemente do pão que depois vamos comer ou não, é imperioso que os cidadãos estejam atentos a toda a dinâmica da governação. Monitorar é questionar a responsabilidade do governo e dos governantes na gestão da coisa pública. Uma sociedade que se recusa a desempenhar este papel por medo de ser rotulada, com certeza que está a beira do colapso. A governação só pode ser boa se é monitorada.Gosto de abordar a questão do puxa saquismo quando falamos de monitoria à governação. Não me interessam muito os outros níveis do puxa saquismo ou dos apóstolos da desgraça. Na verdade até ao nível das amizades encontramos essas figuras. Tenho alguns amigos que de amizade mesmo não há nada, há mais puxa saquismo que outra coisa.
Uma governação que não é monitorada não pode ser boa. Pior ainda, é a governação que não gosta de ser criticada. Nem sempre aquele que critica vem de má fé. Muitas vezes, ele pretende chamar a atenção à situações que poderiam ser evitadas ou corrigidas para o bem dos cidadãos. Uma governação que intimida seus críticos fabrica puxa sacos, lambe botas e apóstolos da desgraça. Essa governação é maquiavélica e usa o método da divisão para manter-se viva.
Os críticos à governação, são rotulados de só estarem a olhar para acções mal realizadas, nunca olham para o futuro e apresentar propostas, antes que os gestores da coisa pública pisem na bola. Vê se pode? O que tenho notado é que inclusive os gestores da coisa pública, eles mesmos, nunca têm a visão futurista da administração pública.
Por exemplo, quando falamos da criminalidade no país, só neste ano é que se está a pensar numa política de acção. No caso dos acidentes estradais, só depois dos acidentes ocorridos em massa no mês de Junho é que a Procuradoria se preocupou com a situação e marcou um encontro, entretanto, há muito que os criminosos ditam as regras do jogo e os chapeiros e camionistas reinam e matam nas estradas.
O 5 de Fevereiro de 2008, é outro exemplo claro de que os nossos gestores também não estudam o futuro para evitar os piores males. O então ministro dos transportes teve inclusive a ousadia de vir ao público afirmar que nunca imaginou que isso haveria de acontecer e acusou a imprensa de o não ter alertado. Poucos dias depois, o mesmo ministro veio às câmeras nervoso e a gritar. Tudo isso porque estava descontrolado e pressionado.
Um governo que não quer puxa sacos, lambe botas e apóstolos da desgraça deve pautar por uma governação participativa e inclusiva. Isso significa que o cidadão deve ser chamado no processo de tomada de decisão. Participar do processo de decisão não é só ser ouvido, é ver suas opiniões reflectidas nas decisões tomadas. O que tem acontecido é que gasta-se muito dinheiro público para auscultar pessoas em seminários e conferencias e no final do dia a decisão tomada é na íntegra a proposta que estava a ser discutida. O que quer dizer que o cidadão só foi chamado para legitimar o processo. Não é isso que se pretende. Isso só reproduz apóstolos, tanto da graça como da desgraça.
A pior parte do puxa saquismo, lambe botismo etc, é criar gente que se preocupa somente com o seu estômago, com a sua família e com a sua rede de amigos. O que desde logo transforma toda uma governação numa máquina aproveitada por um punhado de pessoas que teve certo protagonismo nas brechas da democracia. A consequência mais evidente passa a ser a ausência de políticas públicas integradas e a falta de prestação de serviços básicos e de qualidade ao cidadão. O país mergulha-se numa onda descontrolável de corrupção e a pobreza absoluta encontra um ambiente favorável para a sua manutenção.

( Custódio Duma, em www.athiopia.blogspot.com )

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