Monday, 27 August 2012

EDITORIAL - Ameaças ao Estado: Estamos perplexos

NÃO temos dúvidas que este é um assunto sensível e delicado. Religião, crime, raça e Estado foram e sempre serão de dimensões complexas e delicadas em qualquer sociedade moderna.
Maputo, Segunda-Feira, 27 de Agosto de 2012:: Notícias
Tão sensível que, não sabíamos por onde começar sem ferir susceptibilidades. E ao decidir tomarmos uma posição, fizémo-lo a partir do que é de interesse de qualquer cidadão, independentemente da sua filiação política ou religiosa.
Não compreendemos e nem aceitamos que o Estado seja chantageado e ameaçado, seja em nome do que for.
Para que não haja dúvidas, a nossa posição foi sempre clara. Por exemplo, nunca encaramos e somos contra a posição de que o terrorismo é islâmico, somente porque algumas pessoas islâmicas estão envolvidas em práticas terroristas. Pela mesma coerência, recusamos a aceitar que os sequestros são contra a comunidade muçulmana, porque cidadãos muçulmanos estão a ser sequestrados. Esta é a coerência que em nome da cidadania gostaríamos de ver reflectida ante a ameaça que está a ser feita ao Estado.
Nos primeiros meses deste ano várias igrejas cristãs foram assaltadas um pouco por todo o país e clérigos assassinados. Se perdermos esta coerência, teremos que ironicamente acreditar que a comunidade cristã está a ser colectivamente atacada e que a Polícia pouco ou nada faz porque o Estado tem interesse que isso aconteça.
Se perdemos esta coerência, teremos de acreditar que as centenas de violações sexuais brutais que ocorrem diariamente contra jovens mulheres anónimas são contra uma determinada raça de cidadãos que escusamos aqui de mencionar. Por consequência, teremos de acreditar que a Polícia não esclarece os casos ou esclarece-os mal, porque o Estado é sexista e tem interesse que as jovens mulheres com essa qualificação social, sejam violadas.
Ora isto é absurdo!
O que nós acreditamos face aos parcos factos que temos, é que os cidadãos estão a ser vítimas de crimes, alguns dos quais violentos independentemente da raça, da religião e da filiação partidária. O que nós acreditamos é que os criminosos mapeiam e se especializam com abrangência para as várias dimensões do crime: contra os que supostamente têm dinheiro, contra as jovens pobres que regressam à noite vindas das escolas atravessando ruelas mal iluminadas nos bairros degradados nos subúrbios da capital.
O que nós francamente acreditamos é que a nossa Polícia ainda não está tecnicamente e humanamente preparada o suficiente para lidar com determinado tipo de crime, que não dispõe de meios para proteger o suficiente, como deveria ser, a todos os cidadãos. Por consequência, o que nós acreditamos é que, por via disso, o Estado não está a honrar o suficiente, o contacto social que tem com todos os cidadãos, que abdicam de fazer justiça pelas próprias mãos, de criar seus exércitos e polícias privadas para se defender individualmente ao nível das famílias, porque ao Estado foi atribuída essa responsabilidade.
De novo, para que não haja dúvidas. Como cidadãos, somos solidários com os compatriotas e famílias dos que se sentem indignados directa e indirectamente, porque vítimas, de crimes que tardam a ser esclarecidos, seja por que razão for. Defendemos o direito desses cidadãos à indignação pública. Mas nós tratámo-los como cidadãos, sejam eles de origem asiática, muçulmanos, católicos, etc. Nós não conseguimos enxergar a intencionalidade do crime contra uma determinada religião ou cor da pele.
Qual é a relação directa entre crime contra cidadãos, com o encerramento de todos os estabelecimentos comerciais, industriais e serviços em todo o país durante três dias, com a eventual promoção de uma campanha de desobediência fiscal e, em última estância, caso não seja resolvido de imediato, orientação de voto nas próximas eleições autárquicas e presidenciais.
O Estado ameaçado, as instituições e partido chantageado e os cidadãos vítimas, precisam de reconciliar-se permanentemente. Isso só se faz com diálogo, com pressão legítima, mas não com barganha. Não com a transfiguração da religião em partidos políticos, e não com a confusão entre cidadãos e comunidades, mesmo entendendo que estas têm todo o direito legítimo de solidariedade com os seus membros.
Quando isso acontece ficamos perplexos e perguntamos: o que virá a seguir?

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