Tuesday 7 July 2015

Os “espinhos do atum” não passam na garganta


Já surgem e se personificam defesas indirectas.


Habituados a negociar coisas públicas como se de privadas se tratassem, vemos os protagonistas ensaiando defesas acrobáticas com auxílio de uma legião de assessores. Se pagos ou não, é dúvida de menos importância.
Até o Facebook se tornou em plataforma em que são dirimidas defesas de um empreendimento “cinzento” com cheiro de “golpada”.
A EMATUM é uma batata quente para o actual Executivo moçambicano, mas é bom entender que este negócio foi estruturado por gente que está no Executivo e no parlamento actual.
Os contornos de secretismo que rodearam a operação deixam claro que se pretendia “facturar” com anuência de quem poderia incomodar.
Trata-se efectivamente de um hábito adquirido logo que foi instaurada a II República. Governar-se em vez de governar.
Ninguém quer disputar as prerrogativas governamentais, mas, numa República normal, os orçamentos, mesmo que para assuntos de defesa e segurança, passam por comissões parlamentares específicas e são aprovados. O OGE não é um “saco azul”, em que ministros e presidentes acossam ou deitam mão, sempre que queriam e como queriam.
Ninguém pretende bisbilhotar os assuntos que dizem respeito à segurança nacional que tenham sido acautelados ou promovidos sob a cobertura de pesca de atum ou algo que se pareça.
O que se pretende é demonstrar que houve abuso de poder e uma desmedida arrogância para ignorar as leis nacionais. A França, François Hollande e o seu Governo devem estar a rir do golpe que deram. Salvaram um estaleiro francês, criaram ou mantiveram trabalhadores franceses no activo, e para os moçambicanos fica um serviço de dívida insustentável.
Aquilo que é preocupação geral dos moçambicanos é, mais uma vez, que negócios feitos em nome do Estado foram executados sem que tenham sido acautelados preceitos de razoabilidade e de gestão financeira. Endividar o país em nome de supostas operações de pesca de atum e, depois de alguns meses, dizer que a estrutura da dívida não permite efectuar as amortizações previstas é de uma ingenuidade que reflecte níveis assustadores de abuso do poder.
O que agora se apresenta como um negócio problemático e sem pernas para andar foi pensado e secretamente executado longe do conhecimento público por pessoas específicas que importa chamar à responsabilidade.
Houve um “Angolagate” que rebentou por causa de compras de armas para Angola através de traficantes internacionais. Estaremos vendo um caso similar em Moçambique? Salvar um estaleiro falido na França pode ter sido um golpe politicamente benéfico para o Governo francês. Mas, para Moçambique, quais são as consequências?
Se os parâmetros creditícios não foram respeitados, ou se a operação se mostra combalida e com poucas hipóteses de sucesso, seremos todos a pagar uma dívida que em nada nos está beneficiando. Ainda não vi atum sendo vendido na Beira que tenha sido pescado pela EMATUM.
É pouco provável que tenhamos explicações convincentes de como gente até conhecedora de finanças nos meteu em mais uma “alhada”.
É fácil dizer que o “assunto está nas mãos do Governo”, e que este encontrará uma solução a devido tempo.
O que é assustador é que a maioria parlamentar mantenha a sua firmeza em defender um Executivo que há muito tempo merece uma moção de censura.
Os governantes, nos seus actos, possuem prerrogativas, mas entenda-se que estas não são ilimitadas. Existe obrigação legal de prestação periódica de contas ao parlamento. Ministros e o PR são servidores do povo, eleitos para cumprir um mandato que foi votado pelo povo. Não são donos de Moçambique.
Este negócio que já começou a cheirar mal tem de continuar a ser escrutinado à luz das leis vigentes em Moçambique.
Há muitas zonas de penumbra e factos que importa conhecer.
Quantas empresas de nome EMATUM existem, na verdade?
O fardo para o Executivo de Maputo é pesado e não vai ser fácil ao PR gerir este “dossier”, pois ele foi montado de forma opaca. Quem é quem neste “business” e o que cada um fez vai ser importante saber, se houver realmente a intenção de responsabilizar alguém pelo “insucesso” ou aborto de mais uma empresa pública.
Do que tem sido noticiado, dá para concluir que nem todos os membros do Conselho de Ministros de AEG estavam dentro ou tinham conhecimento dos contornos da operação “ATUM”.
Se a Procuradoria-Geral da República quiser prestar serviço de vulto ao país e aos moçambicanos, tem “pano para mangas”.





(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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