O académico moçambicano Lourenço do Rosário, mediador do diálogo entre a Frelimo e a Renamo, considerou hoje que o partido no poder devia ter travado o "ódio racista" contra o constitucionalista Gilles Cistac, assassinado na terça-feira em Maputo.
"O meu partido, quando digo meu partido sabem a que partido me refiro, porque sou da Frelimo, devia ter parado com o ódio racista que se incentivou contra o professor Gilles Cistac", afirmou Rosário, reitor da Universidade A Politécnica, numa declaração que antecedeu a oração de sapiência de abertura do ano letivo neste estabelecimento.
O académico afirmou que há, moralmente, uma relação de causa-efeito entre os comentários negativos feitos por analistas políticos afetos à Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) e a morte do constitucionalista Gilles Cistac, de origem francesa, adiantando ainda que o jurista terá sido assassinado pelos seus posicionamentos públicos.
"Vimos os 'cachorros' a defender que algumas pessoas, curiosamente todas elas brancas, deviam ser expulsas do país ou mesmo eliminadas", disse Lourenço do Rosário.
Na opinião do académico, a morte de Gilles Cistac não foi engendrada ao mais alto nível do partido no poder, mas admitiu a possibilidade de um militante "mais zeloso" ter ordenado ou executado o assassínio.
"Não acredito que tenha havido uma reunião do partido que tenha programado isto, que um dirigente do meu partido tenha mandado matar o professor Gilles Cistac", afirmou Lourenço do Rosário.
O académico defendeu a necessidade de as universidades moçambicanas e a classe intelectual do país manifestarem a sua revolta contra o atentado, evocando a máxima "quem não se sente, não é filho de gente".
Lourenço do Rosário é um dos mediadores das negociações entre o Governo e a Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), desencadeadas em finais de 2013, para restaurar a estabilidade política no país.
Cistac foi assassinado a tiro na terça-feira de manhã por desconhecidos, à saída de um café no centro de Maputo.
O ministro do Interior moçambicano, Basílio Monteiro, disse hoje que a polícia moçambicana está a colaborar com a Polícia Internacional (Interpol) e com as polícias dos países da África Austral para a localização dos autores do homicídio do constitucionalista.
Gilles Cistac era um dos principais especialistas em assuntos constitucionais de Moçambique e, em várias ocasiões, manifestou opiniões jurídicas contrárias aos interesses do Governo e da Frelimo.
Em entrevistas recentes, Cistac considerou que não há impedimentos jurídicos à pretensão da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana, principal partido da oposição) de criar regiões autónomas no país, contrariando declarações opostas de quadros da Frelimo.
Na semana passada, o académico anunciou que ia processar um homem que, através da rede social Facebook e com o pseudónimo Calado Kalashnikov, acusou Cistac de ser um espião francês que obteve a nacionalidade moçambicana de forma fraudulenta.
O Governo moçambicano considerou o atentado "um ato macabro" e espera que os autores sejam "exemplarmente punidos", enquanto o líder da Renamo disse que o académico foi vítima de "radicais da Frelimo" e o MDM (Movimento Democrático de Moçambique, terceira maior força política do país) declarou que se tratou de um assassínio por encomenda.
A Frelimo reagiu na quarta-feira negando envolvimento no crime e considerando que as "acusações gravíssimas" de que foi alvo são "manobras dilatórias" para prejudicar a governação e dividir o país.
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