Monday 30 March 2015

Guebuza deixou país com níveis de pobreza quase inalterados

Armando Guebuza, que hoje deixou a ribalta política, marcou a história de Moçambique nos últimos dez anos, mas apesar da bandeira do combate à miséria, a sua Presidência deixou o país com mais de 50% da população em situação de pobreza extrema.


Segundo o relatório "Análise da Pobreza em Moçambique", realizado para o grupo dos 19 principais doadores do Orçamento Geral do Estado moçambicano pela VU University, de Amsterdão, quando Armando Guebuza ascendeu à Presidência da República, em 2005, pouco mais de 54,7% dos mais de 20 milhões de moçambicanos eram pobres, e agora que se prepara terminar o último mandato a percentagem mantém-se quase inalterada.
Um outro estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI), recentemente divulgado, admite que o país falhou no objetivo de reduzir a pobreza até 42%, em 2014, preconizado no Plano de Ação para Redução da Pobreza (PARP) 2011-2014, colocando esse indicador em 54%, tal como o Observatório da Pobreza, um fórum da sociedade civil moçambicana que acompanha este problema.
Guebuza encontrou o país entre os dez piores do mundo no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), na 177.ª posição de um grupo de 168 países, e vai deixá-lo com esse estatuto, na 178ª posição, numa lista de 187 países, apesar de a economia moçambicana crescer mais de 07% ao ano nos últimos dez anos.
Vários relatórios nacionais e internacionais destacam que a redução da pobreza é precisamente um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio que Moçambique irá falhar, a par de outros, como a mortalidade materno-infantil, num total de oito alvos destinados a tirar os países da miséria até 2015.
Devido à frustração da população, Guebuza teve de enfrentar as revoltas urbanas mais violentas da história de Moçambique, desde a independência do país, em 1975. Primeiro, a 02 de fevereiro de 2008, contra o aumento das tarifas dos "chapas", os miniautocarros de 15 lugares que garantem o grosso do transporte público nas cidades moçambicanas, e, depois, a 01 e 02 de setembro de 2010, face ao agravamento dos preços de bens e serviços essenciais.
"Eu faço um balanço negativo da governação do Presidente Armando Guebuza. Houve muita construção de infraestruturas públicas, como estradas e pontes, mas também foi um período de muita revolta social, com greves e protestos por todo o lado", disse, por ocasião das eleições de outubro de 2014, a presidente da Liga dos Direitos Humanos (LDH), Alice Mabota, sobre a avaliação dos dois mandatos do atual chefe de Estado.
A inédita greve dos médicos, os protestos de antigos agentes dos serviços de informação do Estado e as manifestações dos desmobilizados da guerra civil foram igualmente eventos singulares durante a governação de Guebuza, devido ao vínculo reverencial que os funcionários mantêm com o Governo, desde os tempos do monopartidarismo, que a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, instaurou no país, após a independência.
A governação de Armando Guebuza foi igualmente manchada pelo regresso da violência militar no primeiro trimestre do ano passado, opondo as Forças de Defesa e Segurança e o braço armado da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), o principal partido da oposição, 21 anos após a assinatura do Acordo Geral de Paz (AGP).
Os confrontos, que terminaram formalmente em agosto, provocaram a morte a um número indeterminado de pessoas e a destruição de bens, maioritariamente no centro do país, fazendo temer o resvalamento do país para uma guerra à escala nacional, como a que antes arrasou o país durante 16 anos.
Vários relatórios internos e internacionais apontam os dez anos de mandato de Guebuza como um período de maior reforço do domínio do Estado pela Frelimo, que reativou células que estavam operativas durante a época do monopartidarismo, até à introdução da primeira Constituição da República multipartidária em 1990.

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