É importante analisarmos o assassinato de que foi alvo o Dr. Gilles Cistac à luz do contexto sociopolítico em que o País vive. Como constitucionalista, Cistac dedicou-se a perceber as diferentes fases do processo político nacional, e empenhou-se, sobretudo, como moçambicano, a contribuir através da academia e com as intervenções públicas em favor de um verdadeiro Estado de Direito. E nisto, Cistac, como visionário, foi mais longe do que o sistema lhe permitia.
Lembramo-nos de que aquando da sua candidatura para o cargo de juiz do Tribunal Africano de Direitos Humanos uma intromissão do Governo acabou o impossibilitando (O País 22 de Maio de 2012). E visto a partir daqui, Cistac era abertamente um alvo do regime. Tornou-se um elemento a abater quando tocou o osso do mesmo regime, com a sua teoria de transformação de províncias em autarquias superiores, blindando assim o argumento dos ideólogos de um determinado partido, segundo a qual não era possível uma descentralização mais ampla, embora sob a figura de Regiões Autónomas. Isso aguçou a ira daqueles que, sob a almofada do poder, têm nessas províncias os seus ganhos económicos. A ideia parece-lhes como quem quer tirar-lhes o pão da boca.
Cistac não estava ligado à Renamo. Frontal como era, afirmou que ainda assim não impedia que a "perdiz" usasse o seu pensamento.
Todavia, é verdade que alguma ala do poder via no Cistac um elemento incómodo, alegadamente por ter "patrocinado" a Renamo, se bem que naqueles quem não está com eles é contra eles.
Cistac não foi visto como um cientista que se opôs ao centralismo como método que tem sido imposto num País vasto, o que em quarenta anos depois da independência é parte do atraso no concernente ao desenvolvimento económico e social. Foi visto como um adversário político da oposição.
A sua experiência em processos de integração regionais numa economia e em modelos liberais de Estado não foram bem vistos, a julgar pelo contexto local onde um punhado de indivíduos tem mais poder que o Estado, e usando da astúcia, manobraram, maquinaram os fanáticos do regime, primeiro para o criticarem nos órgãos de comunicação, depois para o assassinarem. Tudo porque a sua ideia ganhou forma e o regime não encontra melhor argumento para o contrapor.
Lembramos-lhes ainda que recentemente Cistac apresentou à Procuradoria da República um processo contra aqueles que o perseguiam por intolerância política.
Ao queixar-se ao Ministério Público, teve a lucidez de que o cerco se apertava.
Mas a convicção de que os princípios que defendia eram justos não o impediu de manter a rotina, como o era quando voltou ao Café da Eduardo Mondlane, um ponto onde se reúnem muitos intelectuais de esquerda e de direita.
Cistac não era ingénuo. A sua inteligência o impunha que se tornasse discreto, mesmo quando falava à roda dos amigos, na mesa. Sempre comedido e mostrando uma imparcialidade, que os seus algozes, infelizmente, não souberam interpretar nem compreender.
Cistac não era apaixonado por discussões sobre os métodos de escutas e grampo telefónico do SISE (ex-SNASP). Não perseguia as situações relacionadas com a forma como o regime tratava os desafectos políticos e os cidadãos incómodos ao "establishment". Não estava preocupado em fazer limpeza dos órgãos de comunicação públicos que se lançaram numa escalada real de operações contra a sua opinião. Estava preocupado em discutir ideias e dar réplicas num País onde cultivar ideias equivale a pregar no deserto.
Sem dúvidas, Cistac é vítima daquele que ao terem-no assassinado acreditam que terão desconstruído uma ideia, o seu testamento científico, que nos próximos tempos promete ser um campo de batalhas mediáticas e polémicas no Parlamento.
Sem dúvidas ainda, Cistac foi vitimado por ter demarcado do conceito de unicidade da Nação ou do modelo republicano, na óptica e nos métodos de Armando Guebuza e seus súbditos, cuja sustentação serve como um fim que os enriquece, contra a pobreza absoluta da maioria do povo moçambicano.
O meio-termo para estancar a predação dos abutres é visto como um empecilho para quem está do outro lado da barricada.
A opção pelo assassinato de Cistac é revelador do quanto o regime está desassossegado. É uma reacção que ilustra o quadro negro da intolerância que o País vive, não apenas sobre os opositores, como também às minorias raciais.
É mais uma escalada que junta a outros hediondos assassinatos nunca esclarecidos por quem de direito, pois os tentáculos de quem mandou matar espalham-se e controlam as instituições de justiça.
(Adelino Timóteo, Canal)
Lembramo-nos de que aquando da sua candidatura para o cargo de juiz do Tribunal Africano de Direitos Humanos uma intromissão do Governo acabou o impossibilitando (O País 22 de Maio de 2012). E visto a partir daqui, Cistac era abertamente um alvo do regime. Tornou-se um elemento a abater quando tocou o osso do mesmo regime, com a sua teoria de transformação de províncias em autarquias superiores, blindando assim o argumento dos ideólogos de um determinado partido, segundo a qual não era possível uma descentralização mais ampla, embora sob a figura de Regiões Autónomas. Isso aguçou a ira daqueles que, sob a almofada do poder, têm nessas províncias os seus ganhos económicos. A ideia parece-lhes como quem quer tirar-lhes o pão da boca.
Cistac não estava ligado à Renamo. Frontal como era, afirmou que ainda assim não impedia que a "perdiz" usasse o seu pensamento.
Todavia, é verdade que alguma ala do poder via no Cistac um elemento incómodo, alegadamente por ter "patrocinado" a Renamo, se bem que naqueles quem não está com eles é contra eles.
Cistac não foi visto como um cientista que se opôs ao centralismo como método que tem sido imposto num País vasto, o que em quarenta anos depois da independência é parte do atraso no concernente ao desenvolvimento económico e social. Foi visto como um adversário político da oposição.
A sua experiência em processos de integração regionais numa economia e em modelos liberais de Estado não foram bem vistos, a julgar pelo contexto local onde um punhado de indivíduos tem mais poder que o Estado, e usando da astúcia, manobraram, maquinaram os fanáticos do regime, primeiro para o criticarem nos órgãos de comunicação, depois para o assassinarem. Tudo porque a sua ideia ganhou forma e o regime não encontra melhor argumento para o contrapor.
Lembramos-lhes ainda que recentemente Cistac apresentou à Procuradoria da República um processo contra aqueles que o perseguiam por intolerância política.
Ao queixar-se ao Ministério Público, teve a lucidez de que o cerco se apertava.
Mas a convicção de que os princípios que defendia eram justos não o impediu de manter a rotina, como o era quando voltou ao Café da Eduardo Mondlane, um ponto onde se reúnem muitos intelectuais de esquerda e de direita.
Cistac não era ingénuo. A sua inteligência o impunha que se tornasse discreto, mesmo quando falava à roda dos amigos, na mesa. Sempre comedido e mostrando uma imparcialidade, que os seus algozes, infelizmente, não souberam interpretar nem compreender.
Cistac não era apaixonado por discussões sobre os métodos de escutas e grampo telefónico do SISE (ex-SNASP). Não perseguia as situações relacionadas com a forma como o regime tratava os desafectos políticos e os cidadãos incómodos ao "establishment". Não estava preocupado em fazer limpeza dos órgãos de comunicação públicos que se lançaram numa escalada real de operações contra a sua opinião. Estava preocupado em discutir ideias e dar réplicas num País onde cultivar ideias equivale a pregar no deserto.
Sem dúvidas, Cistac é vítima daquele que ao terem-no assassinado acreditam que terão desconstruído uma ideia, o seu testamento científico, que nos próximos tempos promete ser um campo de batalhas mediáticas e polémicas no Parlamento.
Sem dúvidas ainda, Cistac foi vitimado por ter demarcado do conceito de unicidade da Nação ou do modelo republicano, na óptica e nos métodos de Armando Guebuza e seus súbditos, cuja sustentação serve como um fim que os enriquece, contra a pobreza absoluta da maioria do povo moçambicano.
O meio-termo para estancar a predação dos abutres é visto como um empecilho para quem está do outro lado da barricada.
A opção pelo assassinato de Cistac é revelador do quanto o regime está desassossegado. É uma reacção que ilustra o quadro negro da intolerância que o País vive, não apenas sobre os opositores, como também às minorias raciais.
É mais uma escalada que junta a outros hediondos assassinatos nunca esclarecidos por quem de direito, pois os tentáculos de quem mandou matar espalham-se e controlam as instituições de justiça.
(Adelino Timóteo, Canal)
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