Na próxima semana, a Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP vai apreciar a candidatura da Guiné Equatorial a membro de pleno direito desta organização. Esta candidatura suscita problemas graves em face do princípio do Estado de direito e dos direitos humanos que regem a CPLP e coloca uma questão fundamental em relação ao futuro da própria CPLP.
É certo que a Guiné Equatorial tem já o estatuto de observador associado da CPLP, a par da ilha Maurícia e do Senegal. Os Estados com o estatuto de observador associado têm de partilhar os princípios orientadores da CPLP, designadamente no que se refere à promoção das práticas democráticas, à boa governação e ao respeito dos direitos humanos, e devem prosseguir, através dos seus programas de governo, objectivos idênticos aos da CPLP, mesmo que, à partida, não reúnam as condições necessárias para serem membros de pleno direito da CPLP.
Ora a Guiné Equatorial mantém a pena de morte e são conhecidos nos últimos tempos três execuções que ocorreram sem possibilidade de recurso e sem aviso prévio das famílias dos presos. É ignorado o paradeiro de vários opositores do Governo que foram detidos por autoridades públicas, inclusivamente fora das fronteiras da Guiné Equatorial, como por exemplo na Nigéria e nos Camarões.
Por outro lado, registam-se vários casos de detenções arbitrárias por motivos políticos ou de consciência. Nuns casos estas detenções têm lugar por ordem das autoridades policiais sem controlo prévio ou posterior dos tribunais. Noutros casos, estas detenções resultam de julgamentos que não ofereceram as garantias mínimas de um tratamento justo dos arguidos. Os prisioneiros de consciência mais conhecidos, como Gerardo Angüe Mangue, Cruz Obiang Ebele, Emiliano Esono Micha, Gumersindo Ramírez Faustino, Juan Ecomo Ndong, são a face mais visível de um Estado opressor. Repetem-se os casos de tortura cometida por agentes do Estado, com consequências fatais, sem que os tribunais sejam capazes de apurar responsabilidades. Por fim, o Governo reage com hostilidade à crítica e impõe fortes restrições à liberdade de expressão, de associação e de manifestação, como sucedeu no caso da apreensão por forças governamentais de um emissor de rádio à CPDS.
Estas práticas constituem violações graves dos padrões internacionais de direitos humanos e suscitam a apreensão das Nações Unidas, da comunidade internacional e de múltiplas organizações não governamentais, como a Amnistia Internacional. Os Estados membros da CPLP não podem fazer de conta que não conhecem esta realidade. Se o fizerem, estarão a violar o propósito fundador da CPLP, que foi o da promoção do Estado de direito e dos direitos humanos nos seus Estados membros.
O alargamento da CPLP é vantajoso para todos os seus membros, quer a nível do peso político e do poder negocial da organização quer a nível da eficácia da sua acção conjunta. Mas esta mais-valia só se verificará se os novos Estados membros forem respeitadores do Estado de direito e dos direitos humanos. Sendo assim, a admissão de novos Estados membros da CPLP deve estar condicionada a três requisitos mínimos. Primeiro, o Estado candidato deve suprimir a pena de morte, com revisão de todas as condenações a pena de morte já proferidas e ainda não executadas. Segundo, o Estado candidato deve cessar a tortura levada a cabo pelas autoridades públicas, apurando as responsabilidades dos agentes do Estado envolvidos nestes actos. Terceiro, o Estado candidato deve proceder à libertação imediata e incondicional dos prisioneiros de consciência. Sem isto, a porta não deve ser franqueada.
Paulo Pinto de Albuquerque, no Diário de Notícias (Portugal)
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