Saturday, 24 July 2010

Escândalo piora imagem da Frelimo na Beira


O escândalo das casas mutuamente reivindicadas pela Frelimo e pelo Conselho Municipal da Cidade da Beira está a atingir proporções vergonhosas, que alguém com senso comum deveria aconselhar a Frelimo a abandonar o seu projecto de se apoderar das casas.
Contrariamente ao que algumas figuras pretendem dar a transparecer, o assunto não pode ser visto estritamente a partir de uma perspectiva jurídico-legal, sendo que se trata de um assunto político com repercussões muito sérias para um partido fortemente contestado naquela cidade.
E mesmo a ideia de se tentar tratar o assunto como se fosse de natureza jurídico-legal é forçada, uma vez que já se tornou nitidamente claro que a própria lei está a ser manipulada por interesses políticos, com a conivência de indivíduos supostamente formados em direito, e que juraram fazer respeitar a lei, como é o caso do juiz presidente de Sofala, Hermenegildo Jone. É a triste constatação de que afinal, quando interesses da Frelimo entram em jogo, a lei não é cega.
E mesmo que consideremos que existe algum mérito judicial para a resolução do imbróglio, os factos são de que há indícios bastantes de viciação de factos, que a decisão judicial mais justa seria iniciar procedimentos criminais contra o juiz presidente de Sofala, que parece estar a agir de má fé, para encobrir crimes que terão como resultado final a usurpação de bens do Estado a favor de um partido político.
Não faz sentido absolutamente nenhum que hoje, o juiz presidente de Sofala venha afirmar que não era suficiente o valor pago pelo Conselho Municipal em 2008 para garantir o efeito suspensivo da decisão do tribunal de entregar as casas à Frelimo. Não pode haver melhor exemplo da desfuncionalidade do sistema judicial moçambicano quando de forma desenvergonhada, um oficial superior da justiça aparece hoje a apresentar um problema que deveria ter sido rectificado há dois anos, no acto de pagamento da referida caução.
Alguns dos edifícios em disputa foram construídos com fundos do Conselho Municipal, e não é admissível que tais edifícios sejam considerados propriedade de um partido. Um dos edifícios pertence ao serviço provincial de identificação civil, uma instituição pertencente ao Estado moçambicano.
Há uma série de inconsistências em todo este processo, que o mais sensato é manter os edifícios à responsabilidade do município. Por exemplo, fica por explicar como é que os edifícios foram alienados à Frelimo em 2003, sendo que o anúncio público sobre a intenção da sua alienação só viria a ser feito em 2004.
Por outro lado, consta que a Frelimo cobrava rendas pelas casas ao Conselho Municipal quando estas ainda eram da pertença do APIE, numa clara demonstração de que o partido no poder estava a sub-alugar as casas numa flagrante violação da lei.
Basta desta pouca vergonha, protagonizada por um partido que por lhe ter sido confiada a responsabilidade de dirigir o Estado, deveria defender os interesses desse mesmo Estado. E compete ao Presidente da Frelimo, que é também Chefe do Estado, dar ordens para que os seus membros na Beira deixem de arrastar o partido para uma situação que o põe num conflito desnecessário com a população daquela cidade.

TRIBUNA DO EDITOR, Por Fernando Gonçalves, SAVANA, 23/07/10

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