Monday 24 March 2014

Segundo Professor André Thomashausen: “Guebuza viola a Constituição e as FADM cometem crimes contra a humanidade”


Maputo (Canalmoz) – “No contexto da ordem jurídica interna de Moçambique, constituem crimes contra a humanidade na... ordem do Direito Internacional, a utilização de armas de destruição maciça pelas FADM, tal como as bombas de fragmentação (arma internacionalmente proibida), lançadas por canhões sem recuo do tipo B-11, e ainda a sujeição de populações civis pelo terror, e a destruição por meio do incêndio indiscriminado dos seus bens e abrigos”. Quem o afirma é o Professor Dr. André Thomashausen, constitucionalista e professor de Direito Internacional Comparado da Universidade da África do Sul (UNISA).
O Professor Dr. André Thomashausen, num artigo que disponibilizou ao Canalmoz e ao Canal de Moçambique, acusa directamente o presidente da República, Armando Emílio Guebuza, de estar inclusivamente a incorrer em grave atentado contra a Constituição da República ao usar as Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), contra Afonso Dhlakama e a Renamo, sem que previamente tenha sido declarado Estado de Sítio.
Thomashausen observa que “a presente realidade do país é muitíssimo grave por se estar a perpetuar uma governação baseada na inconstitucionalidade”.
O constitucionalista e professor de Direito Internacional Comparado da UNISA (Universidade da África do Sul) chega mesmo a afirmar que “as operações militares das FADM desde Outubro de 2013 estão viciadas de INCONSTITUCIONALIDADE”.
O constitucionalista alemão residente na África do Sul lembra que “é importante que os moçambicanos responsáveis tenham em mente que da história dos povos nunca adveio nada de positivo do desrespeito da ordem constitucional estabelecida”.
André Thomashausen sustenta os seus argumentos em passagens da Constituição da República e da Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas. “Estas normas proíbem categoricamente operações das FADM dentro do território nacional, excepto em situação de Estado de Sítio, devidamente declarado e confirmado pela Assembleia da República”. De facto nunca foi decretado Estado de Sítio apesar das Forças de Armadas estarem envolvidos em combates dentro do território nacional.
“Sendo inconstitucionais as operações das FADM em Sofala, devem ser consideradas de ilegais, e as violações dos direitos fundamentais dos cidadãos decorrentes dessas operações constituem simples actos criminosos”, avança o constitucionalista.
De recordar que as Forças Armadas de Defesa de Moçambique têm estado a usar canhões sem recuo do tipo B-11, que estão classificadas como armas de destruição maciça.
Mas leia já a seguir o artigo em que o autor, André Thomashausen pergunta se “Moçambique é Ditadura Constitucional?”.

“Moçambique é Ditadura Constitucional?

“É importante que os moçambicanos responsáveis tenham em mente que na história dos povos nunca adveio nada de positivo do desrespeito da ordem constitucional estabelecida.
A presente realidade do país é muitíssimo grave por estar a perpetuar uma governação baseada na inconstitucionalidade.
As operações militares das FADM desde Outubro de 2013 estão viciadas de INCONSTITUCIONALIDADE, em violação dos artigos 282 e 283 da Constituição, conjugados com os artigos 23 e 24 da Lei 18/97 (“Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas”).
Estas normas proíbem categoricamente operações das FADM dentro do território nacional, excepto em situação de Estado de Sítio, devidamente declarado e confirmado pela Assembleia da República, estando as operações durante um Estado de Sítio sujeitas ao princípio da legalidade e da proporcionalidade no uso da força e de meios bélicos.
Sendo inconstitucionais as operações das FADM em Sofala, devem ser consideradas de ilegais, e as violações dos direitos fundamentais dos cidadãos decorrentes dessas operações constituem simples actos criminosos.
Além da sua ilegalidade no contexto da ordem jurídica interna de Moçambique, constituem crimes contra a humanidade na ordem do Direito Internacional, a utilização de armas de destruição maciça pelas FADM, tal como as bombas de fragmentação (arma internacionalmente proibida), lançadas por canhões sem recuo do tipo B-11, e ainda a sujeição de populações civis pelo terror, e a destruição por meio do incêndio indiscriminado dos seus bens e abrigos.
Não parece haver dúvida de que o presidente Armando Guebuza e seu executivo estão desde de Outubro de 2013 a agir em violação aberta da Constituição. A Assembleia da República tem a obrigação constitucional de suspender um presidente que viola a Constituição, nos termos do artigo 153. Faltando a essa obrigação, a Assembleia está a prestar-se à criação de uma “ditadura constitucional”, isto é, uma governação sustentada pelo emprego da força militar em violação da ordem constitucional.
O grande perigo de uma “ditadura constitucional” reside na provocação de situações em que a insurreição se pode legitimar e até encontrar aceitação e legalização internacionais. Não é difícil ver o paralelo com o que tem vindo a acontecer nas últimas semanas na Ucrânia.
É de esperar que a Assembleia da República não descure a sua grande responsabilidade perante a Nação de fazer valer e defender a constitucionalidade da actuação do Presidente e do seu Executivo.”

Legislação pertinente

A seguir transcrevemos passagens de legislação pertinente que se aplica a esta matéria. Começamos pela Lei 18/97, de 01 de Outubro, Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas, e em seguida passamos ao que determina a Constituição da República:

Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas
(Veja as imagens)

Da Constituição da República
Artigo 153
(Responsabilidade criminal)

1. Por crimes praticados no exercício das suas funções, o Presidente da República responde perante o Tribunal Supremo.

3. Cabe à Assembleia da República requerer ao Procurador-Geral da República o exercício da acção penal contra o Presidente da República, por proposta de pelo menos um terço e aprovada por maioria de dois terços dos deputados da Assembleia da República.
4. O Presidente da República fica suspenso das suas funções a partir da data do trânsito em julgado do despacho de pronúncia ou equivalente e a sua condenação implica a destituição do cargo.
5. O Tribunal Supremo, em plenário, profere acórdão no prazo máximo de sessenta dias.

Artigo 265
(Princípios fundamentais)

A política de defesa e segurança do Estado visa defender a independência nacional, preservar a soberania e integridade do país e garantir o funcionamento normal das instituições e a segurança dos cidadãos contra qualquer agressão armada.

Artigo 266
(Forças de defesa e serviços de segurança)

1. As forças de defesa e os serviços de segurança subordinam-se à política nacional de defesa e segurança e devem fidelidade à Constituição e à Nação.

Artigo 269
(Competências)

São, nomeadamente, competências do Conselho Nacional de Defesa e Segurança:
a) pronunciar-se previamente sobre a declaração de guerra;
b) pronunciar-se sobre a suspensão das garantias constitucionais e a declaração do estado de sítio e do estado de emergência;

TÍTULO XV
GARANTIAS DA CONSTITUIÇÃO
CAPÍTULO I
DOS ESTADOS DE SÍTIO E DE EMERGÊNCIA

Artigo 282
(Estado de sítio ou de emergência)

1. O estado de sítio ou o estado de emergência só podem ser declarados, no todo ou em parte do território, nos casos de agressão efectiva ou eminente, de grave ameaça ou de perturbação da ordem constitucional ou de calamidade pública.
2. A declaração do estado do sítio ou de emergência é fundamentada e especifica as liberdades e garantias cujo exercício é suspenso ou limitado.

Artigo 283
(Pressupostos da opção de declaração)

A menor gravidade dos pressupostos da declaração determina a opção pelo estado de emergência, devendo, em todo o caso, respeitar-se o princípio da proporcionalidade e limitar-se, nomeadamente, quanto à extensão dos meios utilizados e quanto à duração, ao estritamente necessário ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional.

Artigo 284
(Duração)

O tempo de duração do estado de sítio ou de emergência não pode ultrapassar os trinta dias, sendo prorrogável por iguais períodos até três, se persistirem as razões que determinaram a sua declaração.
Artigo 285
(Processo de declaração)
1. Tendo declarado o estado de sítio ou de emergência, o Presidente da República submete à Assembleia da República, no prazo de vinte e quatro horas, a declaração com a respectiva fundamentação, para efeitos de ratificação.

Artigo 286
(Limites de declaração)

A declaração do estado de sítio ou de emergência em nenhum caso pode limitar ou suspender os direitos à vida, à integridade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei penal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de religião.

Artigo 287
(Restrições das liberdades individuais)

Ao abrigo do estado de sítio ou de emergência podem ser tomadas as seguintes medidas restritivas da liberdade das pessoas:
a) obrigação de permanência em local determinado;
b) detenção;
c) detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
d) restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão.
e) busca e apreensão em domicílio;
f) suspensão de liberdade de reunião e manifestação;
g) requisição de bens e serviços.

Artigo 288
(Detenções)

As detenções que se efectuam ao abrigo do estado de sítio ou de emergência observam os seguintes princípios:
a) deve ser notificado imediatamente um parente ou pessoa de confiança do detido por este indicado, a quem se dá conhecimento do enquadramento legal, no prazo de cinco dias;
b) o nome do detido e o enquadramento legal da detenção são tornados públicos, no prazo de cinco dias;
c) o detido é apresentado a juízo, no prazo máximo de dez dias.

(Redacção)

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