Moçambique tem registado, sob o ponto de vista legal, importantes avanços em prol da transparência do Estado. Contudo “há importantes constrangimentos por uma aceitável prestação de contas”, por isso o Centro de Integridade Pública (CIP), pela voz do seu Director Adriano Nuvunga exige “Transparência total e completa dos contratos de todos os sectores de negócios do Estado”.
Nuvunga, que falava semana passada numa conferência em Maputo cujo tema se relacionava com os desafios para a Economia e Governação em Moçambique, advogou que “não é só no sector extractivo que se impõe transparência, mas é em todo o sector de negócios do Estado incluindo a concessões e particularmente as PPP´s (Parcerias Público Privadas) que operam num quadro de total opacidade, ou seja, falta de transparência”, e citou como exemplo a portagem localizada na auto-estrada que liga os municípios de Maputo e da Matola, concessionada por um período de 30 anos a empresa sul-africana Trans African Concessions (TRAC ). “Os termos daquele contrato não são conhecidos, não são discutidos, quem assinou está escondido está aí escondido entre copas, não cria condições para que haja um debate público sobre afinal até quando será pago o valor ali investido”.
Para o CIP a integridade e transparência são fundamentais para que as políticas públicas não sejam favoráveis às elites predadoras que na última década aguçaram o seu apetite voraz. “Não tínhamos esta delapidação criminosa a que assistimos do recurso público”, enfatizou Adriano Nuvunga que exigiu “transparência total e completa dos contratos de todos os sectores de negócios do Estado, sobretudo da Empresa Nacional de Hidrocarbonetos e suas subsidiárias, do Instituto de Gestão de Participações do Estado, das Concessões e das PPP´s”.
“Grande corrupção é simplesmente posta de lado”
Embora o Presidente Filipe Nyusi tenha prometido “que as instituições estatais e públicas sejam o espelho da integridade e transparência na gestão da coisa pública” a realidade, segundo Adriano Nuvunga, que também é docente no Departamento de Ciência Política e Administração Pública da Universidade Eduardo Mondlane, é que “o procurment público tornou-se num instrumento de viabilização de interesses económicos individuais que se manifesta através dos conflitos de interesses que são transversais a todos os níveis da Função Pública, onde a elite política se concentra nos grandes negócios do Estado, enquanto isso, alguns funcionários públicos dos mais diversos escalões da Administração Pública procuram constituir empresas para participar nos concursos (públicos) lançados pelas instituições onde eles estão afectos”.
Outro constrangimento apontado por Nuvunga é “o tráfico de influências decorrente do acesso à informação privilegiada sobre planos e aquisições” e lamenta afirmando que “nós assistimos a muitas pessoas ligadas ao poder político promulgando as suas próprias prioridades, em função até mesmo dos seus próprios interesses.”
Para o director do CIP, apesar das reformas introduzidas para o combate à corrupção nota-se que falta independência às instituições criadas para a sua implementação e citou como exemplo o Gabinete de Combate à Corrupção (GCC) que “não é uma entidade independente para combater a corrupção” pois “pertence ao Ministério Público, o seu director é designado pelo Procurador-Geral, que por sua vez é designado pelo Presidente da República e como tal o director do Gabinete está vulnerável a ser removido se se mover numa direcção contrária à do poder político.”
“As estatísticas que o Gabinete de Combate à Corrupção apresenta mensalmente mostram claramente que a grande corrupção é simplesmente posta de lado. Desde que vimos os julgamentos do caso Aeroportos e do caso Manheje nunca mais foram julgados casos de grande corrupção (…) provavelmente porque a grande corrupção envolve figuras ligadas à elite política e aos altos funcionários da Administração Pública”, sugeriu Adriano Nuvunga.
Outra instituição da qual se tem muita expectativa é o Tribunal Administrativo, como entidade suprema do controlo administrativo em Moçambique. Contudo, para o docente universitário “nos últimos anos fica-se com a percepção de que o desempenho do Tribunal Administrativo tem vindo a mostrar uma tendência decrescente”. Nuvunga lamentou o facto de que até ao momento “não vimos nenhum pronunciamento sobre o caso EMATUM”.
Em 2013 o Estado moçambicano criou a Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM) que pouco depois da sua criação se envolveu num negócio de aquisição de embarcações de guerra e outras para pesca, orçado em centenas de milhões de dólares norte-americanos sem a autorização do Parlamento e violando o tecto do valor que, por força da Lei Orçamental, possui como máximo para o caso de garantias do Estado.
No que ao sector extractivo diz respeito Adriano Nuvunga saudou as novas leis em vigor em Moçambique que até “estabelecem que as empresas que operam neste sector sejam registadas em jurisdições transparentes, contrariamente aos paraísos fiscais, o desafio aqui é como implementar isto sobretudo porque neste país já há experiências de empresas internacionais que são registadas em jurisdições transparentes quando chegam mas depois alteram o seu regime para paraísos fiscais.”
O professor Nuvunga chamou ainda a atenção para a atitude, que considerou “progressista”, de privilegiar empresas estrangeiras que se associam a moçambicanos na atribuição de contratos de concessões no sector extractivo. Porém “experiências de outros países em desenvolvimento e ricos em recursos minerais mostram que este requisito de parceiro nacional tem sido frequentemente o mecanismo usado pelas elites políticas da Administração Pública para acumular riqueza sem conhecer qualquer valor acrescentado, constituindo a negação de oportunidades” para a maioria dos moçambicanos.
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