Tuesday, 3 July 2012

Profundo, o nosso sono colectivo

A idade da Frelimo é, no nosso entender, uma questão aritmética e do contexto em que ela é evocada. Podem existir duas, mas também pode imperar uma. Pode existir o partido, mas também pode prevalecer o movimento.
Isso, na verdade, pouco importa. Até porque tal debate não traz transporte e muito menos comida em abundância. O que indigna qualquer cidadão com dois dedos de testa não é a idade e nem a exuberância do festejo dos “camaradas”.
O que indigna é o aproveitamento político da data no aniversário de Moçambique enquanto país. Não podemos conceber que o aniversário da Frelimo ofusque deliberadamente um dia genuinamente apartidário.
Não podemos permitir que a Frelimo seja maior do que o país. Não podemos permitir que o chefe de Estado passe mais tempo no aniversário do seu partido a enaltecer os feitos deste do que a glorificar a independência. Não podemos permitir que ele reivindique desenvolvimento do país num contexto partidário, sobretudo quando as suas palavras são amplificadas pelos media alinhados.
Que a Frelimo faça isso e até compreensível. Trata-se, na verdade, de uma manifestação de poder. Trata-se de veiculação de uma mensagem que se pretende, apesar de pomposa, subliminar.
A Frelimo, no nosso entender, está pouco se marimbando para os seus verdadeiros anos. O objectivo claro, cristalino e evidente, da Frelimo, neste caso, é o de associar o seu nome ao do país. É associar o conceito Frelimo ao conceito liberdade. É de os repetir até à exaustão. Até que um seja sinónimo de outro.
A idade da Frelimo é, por isso, um debate estéril e que produz poucos efeitos. Por exemplo, no coração de Ancuambe, Matchedje e Ribáuè a população nem quer saber do debate dos anos da Frelimo. Está preocupada com postos de saúde e a chuva que insiste em engravidar nuvens sem beijar a terra. Está preocupada com o crescimento imponente da fome. Está preocupada com os celeiros sem serventia. Está preocupada com a escola que não há.
Enquanto isso, as festas pomposas lembram-nos de que há quem prefira satisfazer o ego com alianças espúrias, numa miscelânea de composições inimagináveis para angariar espaço de antena e iludir os incautos. Foram às favas com a identidade ideológica, com a sinergia programática. Mataram a coerência em nome do poder.
Querem ficar no poleiro para sempre e decidiram transformar uma data de todos numa instituição partidária. Prevalece, neste aniversário, o despudor da barganha rasteira, vil, levando à combinação de episódios tão contraditórios (criação da Frelimo e dia da independência) apenas para vender a ideia de que o moçambicano deve vassalagem ao partido no poder.
Isso devia preocupar-nos mais do que a sua pretensa idade. Até porque enquanto discutimos os seus anos ela (a Frelimo) prossegue inexoravelmente com o seu plano para adormecer as massas. Nós, os outros, também dormimos embalados ao som do batuque e da maçaroca. Que não tarde, para o nosso bem, o despertar colectivo de todos nós...

Editorial, A Verdade

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