Wednesday, 29 February 2012

Tentativas de remover barracas iniciaram há mais de 20 anos


Braço-de-ferro entre município e vendedores.

Ontem, o edil da capital do país anunciou uma ronda negocial entre o município e o grupo de vendedores que se recusa a obedecer à ordem de retirada emanada pelo município. Simango diz que aceita o diálogo ou mesmo a dilatação dos prazos, mas não recua da decisão.
O Conselho Municipal da Cidade de Maputo (CMCM) deu ultimato de 48 horas para a remoção de todas as bancas e barracas que se encontram localizadas nos passeios da cidade de Maputo, bem como as que estão nas imediações das escolas e hospitais ou perto dos prédios residenciais. Aliás, o prazo até já terminou na última sexta-feira, mas os vendedores mantêm-se nos seus locais como se nada tivesse acontecido.
Assim, nos próximos dias, poder-se-á assistir ao habitual jogo de perseguições entre os vendedores e a polícia municipal, algo que não é novo: na verdade, há mais de 20 anos que o Conselho Municipal da Cidade de Maputo é assim. Dá ultimatos, os visados não os cumpre e continuam a vender. Logo, a seguir, começa a persegui-los aos tiros e aos chicotes, nalgumas vezes até com recurso aos cães. mas, passado algum tempo, tudo volta à “normalidade”.
A edilidade esquece-se dos vendedores e estes voltam a ocupar os seus espaços habituais tranquilamente. Desde Baptista Cosme, passando por Artur Canana, Eneas Comiche, até David Simango, foi sempre e está a ser assim. E nada garante, neste momento, que termine por aqui.
Alguns vendedores ouvidos pelo nosso jornal estão praticamente há uma vida nos passeios.
Carmelita Ndeve, uma senhora de cerca de 40 anos de idade, deficiente física, diz que vende no passeio desde 1991. Ou seja, passam mais de vinte anos que ela está neste tipo de negócio. “Abracei este negócio (venda de frutas e alguns vegetais na rua) por causa de sofrimento. Mas, mesmo assim, consegui criar os meus filhos até crescerem. Se por acaso deixar de vender, não sei o que vou fazer. Como sou crescida, não tenho mais nada para fazer, a minha vida depende disto”, explica.
Apesar de ser deficiente, Ndeve diz que, numa das campanhas da polícia municipal, chegou a perder quase tudo. Destruíram a sua barraca, levaram as suas muletas e toda a sua mercadoria. Teve que começar do zero, mas não desistiu e, hoje, continua no passeio.
Adelia Alfredo é outra senhora, de 34 anos de idade. Diz que está na rua há nove anos. Desde esse tempo, a sua rotina é a mesma: acordar para vender na sua pequena banca, localizada no passeio da avenida Maguiguana, esquina com Karl Marx.
“Ouvi que o município está a mandar-nos embora. Mas como o carro da recolha dos produtos ainda não chegou, continuamos a vender. Não podemos sair porque não temos mais nada a fazer senão este trabalho. Pagamos as licenças, trabalhamos e conseguimos alimentar os nossos filhos”, explica Adelia, mãe de três filhos ainda menores de idade.
Tal como estas, entrevistámos Cecília Matavele, mãe de três anos de idade. Esta senhora diz que conseguiu criar os seus filhos com base neste pequeno negócio. Para ela, até seria bom se o município a tirasse da rua, desde que lhe crie condições básicas de sobrevivência.

Capacidade de actuação da polícia municipal

A cidade de Maputo conta, neste momento, com pouco mais de 70 mil vendedores informais. Dados em nosso poder indicam que só a Associação dos Trabalhadores do Sector Informal, ASSOTSI, há cinco anos, contava com perto de 50 mil membros.
Se os visados pelo ultimato do CMCM forem renitentes, a edilidade terá que optar por medidas administrativas, que poderão significar o uso da sua força policial.
E, se tal acontecer, será possível colocar homens em todos os cantos da cidade para controlar os vendedores informais?

Tiago Valoi e Hélio Manhiça, O País

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