Na altura em que o Sudão do Sul acaba de festejar o seu nascimento, neste sábado, 9 deste Julho, como 193ª nação do mundo e 54º Estado do Continente Africano, cidadãos e líderes da nação mais nova de África são provavelmente perseguidos pela mesma pergunta: como é que o novo país, tendo um dos piores indicadores humanos do mundo, vai conseguir prosperar, evitando os erros que outros países africanos cometeram a seguir à independência, 50 anos atrás?
A Sra. Obiageli Ezekwesili, Vice-Presidente para África do Banco Mundial, uma antiga Ministra da Nigéria e co-fundadora de Transparência Internacional, um organismo de combate à corrupção, procura, no artigo a seguir, dar algumas respostas às naturais inquietações.
O Sul do Sudão pode procurar inspiração em muitos modelos de desenvolvimento mas irá, em última análise, seguir um por ele adoptado. Podia ser útil se a nação mais jovem de África adoptasse um exemplo africano.
O Botswana era uma das 25 nações mais pobres do mundo, com apenas 50 licenciados na altura da independência. Agora, é um dos países mais ricos de África. Como é que o Botswana conseguiu?
“O sucesso do Botswana é, em parte, o resultado de a educação, formação de competências e desenvolvimento dos recursos hídricos terem estado no topo das prioridades de desenvolvimento”, disse recentemente Festus Mogae, antigo Presidente do Botswana, a um grupo de profissionais do desenvolvimento.
País do interior interior e economicamente isolado, em consequência das sanções e boicotes impostos à Rodésia (actualmente Zimbabwe) e depois à África do Sul do apartheid, Gaborone investiu no seu recurso mais importante: o seu povo. Criou as condições para os cidadãos fazerem aquilo que melhor sabiam fazer (criação de gado). Prisioneiro da geografia e da geopolítica, o Botswana promoveu a integração regional e o comércio com os seus vizinhos, não obstante o contexto difícil.
Segundo o Presidente Mogae, os líderes da independência do Botswana certificaram-se de que as tradições de consulta, transparência e responsabilização do país eram integradas na textura do país recém-independente. Botswana concentrou-se, depois, em proporcionar segurança, justiça e empregos aos seus cidadãos e em obter receitas dos seus abundantes recursos naturais para beneficiar a maior parte da sua população.
Hoje, o Sul do Sudão parte com mais licenciados do que o Botswana. Mas contrariamente a Gaborone na independência, Juba precisa de um esforço de reconstrução e de reconciliação depois de uma guerra brutal, que custou mais de dois milhões de vidas. A nova nação enfrenta desafios assustadores, incluindo a falta de capacidade básica para assumir as funções fulcrais do Estado. Se bem que não haja uma receita mágica para a construção de uma nação que acabou de se tornar independente, Juba precisa de dar uma atenção prioritária a pelo menos três áreas.
Em primeiro lugar, os líderes e a elite política do novo país têm de envolver, desde cedo, os cidadãos na elaboração das estratégias de desenvolvimento. É essencial que a abordagem e o processo partam da base para o topo, sejam inclusivos e consultivos, analisando cuidadosamente as oportunidades e as debilidades, definindo os papéis do governo, do sector privado, da sociedade civil e dos cidadãos comuns. Os líderes podem e devem proporcionar um sentido claro e partilhado de investimento conjunto, caso o Sul do Sudão queira estabelecer uma base sólida para um futuro próspero. A elite não deve articular a visão da nação, à porta fechada.
Em segundo lugar, o Sul do Sudão tem de promover o crescimento do sector privado e o aparecimento de pequenas empresas, motor da criação de emprego e de riqueza em qualquer economia. A estratégia económica deve ter uma base ampla, definindo a prioridade das necessidades da população. A nação mais jovem de África precisa urgentemente de uma estratégia de diversificação que a afaste de uma economia de produto único. Precisa de explorar oportunidades, designadamente na agricultura, que é um recurso mais abundante e sustentável do que o petróleo e da qual depende actualmente 98% da receita de Juba. Para que as receitas do petróleo possam beneficiar a maioria dos sudaneses do sul é necessário seguir uma abordagem que vai além da transparência básica e maximiza o valor das concessões petrolíferas, monitoriza o cumprimento dos contratos e assegura não apenas a transparência na gestão das receitas petrolíferas, mas também o seu investimento eficiente em programas de desenvolvimento sustentáveis e em prol dos pobres. A parte do petróleo, o desenvolvimento da agricultura oferece a melhor oportunidade para criação de empregos, aumento de rendimentos e inversão da insegurança alimentar. As Nações Unidas estimam que, só este ano, cerca de quatro milhões de sudaneses do sul (metade da população) precisaram de assistência alimentar. Um crescimento agrícola partilhado e inclusivo é essencial para se poderem melhorar os rendimentos e garantir a redução da pobreza num país com uma taxa de pobreza de 46%. Negligenciar a agricultura iria criar um crescimento irregular, aumentar a desigualdade e elevar o risco de agitação social.
Em terceiro lugar, o país precisa de criar as instituições necessárias para garantir a segurança dos seus cidadãos, prestar serviços sociais básicos (saúde, educação e habitação de preço moderado), criar empregos e melhorar os meios de subsistência, colmatar os défices de infra-estruturas e dinamizar as relações políticas e comerciais com os seus vizinhos, incluindo o Norte. As melhores instituições caracterizar-se-ão por serem inclusivas e prestarem uma atenção especial aos interesses dos mais vulneráveis – jovens, mulheres, crianças, idosos, fisicamente diminuídos, vítimas da guerra, deslocados internos, retornados e ex-combatentes.
Por último, o Sul do Sudão tem de resistir à tentação de adoptar soluções populistas e imediatistas, com uma sustentabilidade pouco provável. Contudo, a nova nação tem de agir com um alto sentido de urgência, reconhecendo que os pobres e famintos não podem esperar gerações por uma solução para os seus problemas mais urgentes. Como aconteceu no Botswana depois da independência, o centro de gravidade no Sul do Sudão precisa de se deslocar das elites para os cidadãos comuns.
A euforia do nascimento do novo Estado tem de rapidamente dar lugar ao trabalho árduo no sector da segurança, às reformas económicas e da governação com um enfoque na capacitação dos cidadãos, em especial as mulheres, para poderem resolver os seus próprios problemas. Tem de despertar o génio criativo e apoiar os esforços destinados a responsabilizar o governo e os parceiros de desenvolvimento.
Vários países, como a Costa do Marfim, Gana e Zâmbia, na independência, tinham rendimentos per capita que excediam os dos países da Ásia Oriental, incluindo a Coreia do Sul. Menos de meio século mais tarde, o rendimento médio per capita da África Subsariana – mesmo depois de feito o ajustamento das diferenças no poder de compra – era menos de um quarto da Ásia Oriental. A liderança é importante e, com ela, a governação e políticas de desenvolvimento amigas do povo que têm separado os vencedores dos vencidos. Para o Sudão do Sul, edificar as instituições certas, adoptar as políticas correctas e sólidas e assegurar um investimento público eficaz e eficiente nos sectores importantes para os pobres irá ajudar a tirar da pobreza o maior número possível de cidadãos e a começar a jornada do país no sentido de uma transformação socioeconómica. Agir com um sentido de urgência pode garantir que a atenção, cuidado e apoio que o Sul do Sudão está a ter neste período que se segue ao nascimento da nova nação, nascimento testemunhado pelo mundo inteiro no dia 9 deste Julho irão durar para além deste ciclo em que é notícia. A construção de uma nação leva o seu tempo mas o Sul do Sudão pode acelerar este processo, se tirar o máximo partido das lições extraídas de histórias de desenvolvimento bem-sucedidas e amplamente conhecidas.
A Sra. Obiageli Ezekwesili, Vice-Presidente para África do Banco Mundial, uma antiga Ministra da Nigéria e co-fundadora de Transparência Internacional, um organismo de combate à corrupção, procura, no artigo a seguir, dar algumas respostas às naturais inquietações.
O Sul do Sudão pode procurar inspiração em muitos modelos de desenvolvimento mas irá, em última análise, seguir um por ele adoptado. Podia ser útil se a nação mais jovem de África adoptasse um exemplo africano.
O Botswana era uma das 25 nações mais pobres do mundo, com apenas 50 licenciados na altura da independência. Agora, é um dos países mais ricos de África. Como é que o Botswana conseguiu?
“O sucesso do Botswana é, em parte, o resultado de a educação, formação de competências e desenvolvimento dos recursos hídricos terem estado no topo das prioridades de desenvolvimento”, disse recentemente Festus Mogae, antigo Presidente do Botswana, a um grupo de profissionais do desenvolvimento.
País do interior interior e economicamente isolado, em consequência das sanções e boicotes impostos à Rodésia (actualmente Zimbabwe) e depois à África do Sul do apartheid, Gaborone investiu no seu recurso mais importante: o seu povo. Criou as condições para os cidadãos fazerem aquilo que melhor sabiam fazer (criação de gado). Prisioneiro da geografia e da geopolítica, o Botswana promoveu a integração regional e o comércio com os seus vizinhos, não obstante o contexto difícil.
Segundo o Presidente Mogae, os líderes da independência do Botswana certificaram-se de que as tradições de consulta, transparência e responsabilização do país eram integradas na textura do país recém-independente. Botswana concentrou-se, depois, em proporcionar segurança, justiça e empregos aos seus cidadãos e em obter receitas dos seus abundantes recursos naturais para beneficiar a maior parte da sua população.
Hoje, o Sul do Sudão parte com mais licenciados do que o Botswana. Mas contrariamente a Gaborone na independência, Juba precisa de um esforço de reconstrução e de reconciliação depois de uma guerra brutal, que custou mais de dois milhões de vidas. A nova nação enfrenta desafios assustadores, incluindo a falta de capacidade básica para assumir as funções fulcrais do Estado. Se bem que não haja uma receita mágica para a construção de uma nação que acabou de se tornar independente, Juba precisa de dar uma atenção prioritária a pelo menos três áreas.
Em primeiro lugar, os líderes e a elite política do novo país têm de envolver, desde cedo, os cidadãos na elaboração das estratégias de desenvolvimento. É essencial que a abordagem e o processo partam da base para o topo, sejam inclusivos e consultivos, analisando cuidadosamente as oportunidades e as debilidades, definindo os papéis do governo, do sector privado, da sociedade civil e dos cidadãos comuns. Os líderes podem e devem proporcionar um sentido claro e partilhado de investimento conjunto, caso o Sul do Sudão queira estabelecer uma base sólida para um futuro próspero. A elite não deve articular a visão da nação, à porta fechada.
Em segundo lugar, o Sul do Sudão tem de promover o crescimento do sector privado e o aparecimento de pequenas empresas, motor da criação de emprego e de riqueza em qualquer economia. A estratégia económica deve ter uma base ampla, definindo a prioridade das necessidades da população. A nação mais jovem de África precisa urgentemente de uma estratégia de diversificação que a afaste de uma economia de produto único. Precisa de explorar oportunidades, designadamente na agricultura, que é um recurso mais abundante e sustentável do que o petróleo e da qual depende actualmente 98% da receita de Juba. Para que as receitas do petróleo possam beneficiar a maioria dos sudaneses do sul é necessário seguir uma abordagem que vai além da transparência básica e maximiza o valor das concessões petrolíferas, monitoriza o cumprimento dos contratos e assegura não apenas a transparência na gestão das receitas petrolíferas, mas também o seu investimento eficiente em programas de desenvolvimento sustentáveis e em prol dos pobres. A parte do petróleo, o desenvolvimento da agricultura oferece a melhor oportunidade para criação de empregos, aumento de rendimentos e inversão da insegurança alimentar. As Nações Unidas estimam que, só este ano, cerca de quatro milhões de sudaneses do sul (metade da população) precisaram de assistência alimentar. Um crescimento agrícola partilhado e inclusivo é essencial para se poderem melhorar os rendimentos e garantir a redução da pobreza num país com uma taxa de pobreza de 46%. Negligenciar a agricultura iria criar um crescimento irregular, aumentar a desigualdade e elevar o risco de agitação social.
Em terceiro lugar, o país precisa de criar as instituições necessárias para garantir a segurança dos seus cidadãos, prestar serviços sociais básicos (saúde, educação e habitação de preço moderado), criar empregos e melhorar os meios de subsistência, colmatar os défices de infra-estruturas e dinamizar as relações políticas e comerciais com os seus vizinhos, incluindo o Norte. As melhores instituições caracterizar-se-ão por serem inclusivas e prestarem uma atenção especial aos interesses dos mais vulneráveis – jovens, mulheres, crianças, idosos, fisicamente diminuídos, vítimas da guerra, deslocados internos, retornados e ex-combatentes.
Por último, o Sul do Sudão tem de resistir à tentação de adoptar soluções populistas e imediatistas, com uma sustentabilidade pouco provável. Contudo, a nova nação tem de agir com um alto sentido de urgência, reconhecendo que os pobres e famintos não podem esperar gerações por uma solução para os seus problemas mais urgentes. Como aconteceu no Botswana depois da independência, o centro de gravidade no Sul do Sudão precisa de se deslocar das elites para os cidadãos comuns.
A euforia do nascimento do novo Estado tem de rapidamente dar lugar ao trabalho árduo no sector da segurança, às reformas económicas e da governação com um enfoque na capacitação dos cidadãos, em especial as mulheres, para poderem resolver os seus próprios problemas. Tem de despertar o génio criativo e apoiar os esforços destinados a responsabilizar o governo e os parceiros de desenvolvimento.
Vários países, como a Costa do Marfim, Gana e Zâmbia, na independência, tinham rendimentos per capita que excediam os dos países da Ásia Oriental, incluindo a Coreia do Sul. Menos de meio século mais tarde, o rendimento médio per capita da África Subsariana – mesmo depois de feito o ajustamento das diferenças no poder de compra – era menos de um quarto da Ásia Oriental. A liderança é importante e, com ela, a governação e políticas de desenvolvimento amigas do povo que têm separado os vencedores dos vencidos. Para o Sudão do Sul, edificar as instituições certas, adoptar as políticas correctas e sólidas e assegurar um investimento público eficaz e eficiente nos sectores importantes para os pobres irá ajudar a tirar da pobreza o maior número possível de cidadãos e a começar a jornada do país no sentido de uma transformação socioeconómica. Agir com um sentido de urgência pode garantir que a atenção, cuidado e apoio que o Sul do Sudão está a ter neste período que se segue ao nascimento da nova nação, nascimento testemunhado pelo mundo inteiro no dia 9 deste Julho irão durar para além deste ciclo em que é notícia. A construção de uma nação leva o seu tempo mas o Sul do Sudão pode acelerar este processo, se tirar o máximo partido das lições extraídas de histórias de desenvolvimento bem-sucedidas e amplamente conhecidas.
* Adaptação para http://www.rm.co.mz/ de Boaventura Mandlate
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