Friday 11 May 2012

O Povo não vai aguentar muito mais as mentiras e intolerância de quem está no poder

É deveras preocupante que a comunicação social pública e alguma independente estejam sendo utilizadas para veicular imagens e posições que fortificam as teses dos que praticam a intolerância política no país.
A coberto de celebrações e comemorações de datas históricas e numa ofensiva activa de “intoxicação histórica” os moçambicanos são dados a beber “águas” de conteúdo estranho.
Algumas das posições apresentadas são de tal mal modo concebidas que se torna claro e fácil concluir que visam envenenar a memória colectiva. Não é verdade a maior parte do que dizem aos moçambicanos. Tudo o que separa e exalta uns em detrimento dos outros deve ser olhado com suspeita numa altura em que proclama a Unidade Nacional como centro nevrálgico da agenda nacional.
Embora se possa dizer que foi percorrido um longo caminho no que se refere ao combate de tendências tribalistas e racistas, convém não esquecer que diariamente continuamos a chocar com manifestações que nos dizem claramente que aquelas tendências ainda se fazem sentir.
Mesmo no seio dos partidos políticos, com todos os esforços de mostrar que se vive uma situação de normalidade acima de qualquer suspeita de tribalismo, é possível ver que nem a política de quotas para os diferentes órgãos partidários, impede que se observem sinais preocupantes de política feita com base em considerações étnicas. Quando misturam género com quotas provinciais ou regionais na composição de uma comissão política, órgão executivo de um partido, é o mesmo que fazer “Acção Afirmativa” e isto tem muito que se lhe diga. Dá para ver que antes da Comissão Política se reunir e deliberar existe um núcleo desta comissão que se reúne antes e que determina o que serão as deliberações posteriores na Comissão Política publicamente conhecida.
Uma análise mesmo que superficial e atendendo ao que os moçambicanos sabem do perfil de cada dos integrantes de diversas comissões políticas dos partidos legalizados no país mostra que a teses de “Acção Afirmativa” vigora na maior parte das situações.
Tem sido esse açambarcamento da acção política que tem produzido fissuras e clivagens no aparelho dos partidos políticos.
As divergências e “fugas para a frente” de alguns membros influentes dos partidos acontecem em virtude de contradições insanáveis entre membros. A luta pelo poder é uma realidade e cada vez mais deixa de ser possível esconder que isso está acontecendo.
Com o falhanço do modelo marxista-leninista, socialista “científico” que acompanhou o desaparecimento físico do líder incontestado da Frelimo, Samora
Machel, cedo surgiram sinais de que afinal nem mesmo aquele carácter “incontestável” daquele líder tinha que ser posto em causa.
Os companheiros de luta daquele líder, pelo que fizeram após o seu desaparecimento, afinal não estavam tão de acordo com ele como parecia. Só que não podiam manifestar-se como a maioria dos moçambicanos também não podia livremente expressar-se contra ou contestar alguma coisa que saísse das “estruturas do partido”.
Sabemos e fomos testemunhas daqueles tempos em que um pronunciamento do presidente da Frelimo se transformava em palavra de ordem, depois em orientação e norma a ser seguida por todos mesmo que não legislado.
As sementes do ódio, da intolerância política, do absolutismo, do açambarcamento de agendas, da subestimação dos outros são factos na vida corrente.
Em geral são os que vivem pendurados nas”estruturas” que procedem como catalisadores.
Aumentam gasolina à fogueira e as “estruturas” elogiadas adoram tratamento diferenciado.
Multiplicam-se pequenos “deuses” e a coabitação se torna impossível porque as pessoas partem de posições de superioridade irredutível.
Os atrasos que se verificam na construção da nação moçambicana devem ser atribuídos a factos concretos e a pessoas concretas se esse é o caso. A tese, muitas vezes conjugada, da “mão externa” explica pouco ou é sobretudo um subterfúgio para encobrir incapacidades.
Não deixa de ser verdade que factores externos como a crise financeira internacional influem no andamento dos programas nacionais em todos os sectores.
Mas não se pode por exemplo atribuir a escassez crónica de cereais à crise financeira internacional, pois o caso tem origens e causas bem diferentes. O deficit cerealífero é resultado directo de rendimentos unitários baixíssimos na agricultura moçambicana.
É sobretudo fruto da acumulada incompetência governativa e de discursos que nunca passam disso.
Todos os esforços e investimentos visando capacitar institucionalmente o Ministério da Agricultura acabam por ser canalizados para as teias da corrupção onde o procurement enriquece funcionários mas não chega aos camponeses para promover desenvolvimento rural.
A filosofia tornada prática corrente, de impedir que moçambicanos pertencentes a outras cores partidárias tenham acesso efectivo ao que o País possui e pode dar aos seus cidadãos tornou-se numa fonte perversa de intolerância destrutiva.
Este país chamado Moçambique pode ser viável como também se pode tornar num inferno em que posições inicialmente reconciliáveis acabam por virar fontes de conflito e eventualmente guerra aberta entre campos opostos.
Da teimosia e da intolerância veremos concidadãos se digladiando no lugar de reunirem consensos e avançarem rumo à estabilidade e desenvolvimento inclusivo e paz.
Proclamar a paz e endeusar parte dos interlocutores é uma via fundada na demagogia e com objectivos pérfidos. Os que se dizem líderes e que comandam a atenção dos órgãos de comunicação social não estão agindo com clarividência nem responsabilidade.
O abuso da autoridade e a partidarização das forças policiais e militares demonstram que há políticos dispostos a tudo desde que seus pequenos ou grandes feudos estejam e sejam protegidos. Numa situação normal de separação de poderes democráticos todos os participantes e responsáveis por mortes de cidadãos devido à sua detença em locais inadequados deveriam ser levados à barra dos tribunais. No nosso caso, infelizmente, parte dos responsáveis directos de acções que tiveram como resultado a morte de cidadãos após manifestações contra o governo, viu-se serem protegidos e promovidos a cargos governamentais em outras províncias e a nível central. Esse é um mau exemplo para democracia. Estamos perante um governo que protege os prevaricadores e até os assassinos.
O proteccionismo tornado política de gestão de quadros não pode ganhar relevância se o que se pretende é a construção de um país forte, democrático onde a justiça impera e a constituição é respeitada por todos os actores.
Coabitar e tolerar não são favores que se façam a este ou aquele partido ou político.
Os cidadãos esperam que seus governantes se pautem por regras transparentes e consensuais.
Quando os políticos de proa do país se vangloriam de nada fazerem e de se protegerem sempre que seja algum caso de contestação a posições que tomem, é preciso que a voz dos cidadãos se faça ouvir recusando e denunciando esse tipo de comportamento.
É a causa nacional, a causa de todos que está em causa.
Gente paga principescamente através de fundos públicos para os quais todos os moçambicanos contribuem não se pode dar ao luxo de ignorar as suas responsabilidades.
E não podem continuar a fazer do País um seu feudo, sob pena de um dia acordarem com um vendaval social.
Vive-se um grave momento no país em que todos são chamados a darem o melhor de si para que os extremistas sejam irrevogavelmente derrotados e suas teses enterradas.
Está-se a aproximar o dia da intolerância se nada mudar rapidamente.
Caminhar parava frente rumo a um progresso sustentável requer que cada um faça a sua parte, com respeito pelos outros, seja quem for.
Não se pode ficar à espera nem refém de políticos parasitas, fomentadores de crises e mercenários e intriguistas.
Em nome de um governo resultante de eleições de cariz duvidoso assistiu-se a um leilão rápido dos recursos nacionais.
Os integrantes do executivo rapidamente se esqueceram de suas plataformas eleitorais e avançaram para a concretização de teses e posições completamente alheias ao interesse nacional.
Os acertos e acordos assinados com corporações internacionais com vista a exploração de recursos naturais moçambicanos estão sendo desmontados para revelarem uma miríade de acasalamentos de interesses entre integrantes do executivo nacional e as corporações.
Somos um país mas dificilmente se pode dizer que somos uma nação.
Nem as datas comemorativas ou feriados nacionais dedicados a figuras de relevo na luta pela independência são suficientes para esconder o facto de que a nossa tolerância é um verniz de fraca duração e de qualidade sofrível.
As mulheres são satisfeitas com cargos simbólicos e “capulanas” enquanto os jovens são alimentados com festivais de verão e de inverno, e “bebedeiras aos fins-de-semana.
Grifes e perfumes, imitações baratas e insultuosas de modos de vida dos “rappers” americanos substituem o estudo, a responsabilidade e o protagonismo em defesa de um País.
Uma teoria de mudança na continuidade, de renovação controlada, em que se substituem pedras no tabuleiro através de critérios sinuosos rende dividendos duvidosos mas que a oligarquia dirigente está não só disposta a aceitar como promove. Com uma farsa querem adormecer as pessoas, mas esse tempo está esgotado.
As pessoas já abriram os olhos.
Quando se pretende ver a oposição política crescendo e amadurecendo no seu entendimento do que é efectivamente ser político e fazer política, chocamos com poucos exemplos de seriedade e responsabilidade.
Ninguém disse que o caminho para a construção de um Moçambique pujante e unificador fosse fácil e rápido. Não há fórmula mágica nesta questão que é a construção de um país viável em que seus cidadãos se vejam reflectidos nos objectivos enunciados pelos diferentes partidos políticos. Mas uma coisa é certa, nada acontecerá no sentido do que a maioria deseja e anseia se não houver esforços da maioria para a sua concretização…
O Povo tem de se impor.

Noé Nhantumbo, Canal de Moçambique – 02.05.2012, no Moçambique para todos

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