COM a aprovação ontem, pela Assembleia da República (AR), da Lei do Servidor Público, ficam assim reforçados os mecanismos de combate aos actos de corrupção e de enriquecimento ilícito por parte dos servidores públicos. A lei em causa orienta os profissionais públicos para que trabalhem dentro da integridade e da cultura de bem servir no Estado.
A nova lei abrange todo servidor público sem prejuízo de normas especiais que regem para certas categorias o exercício de cargo público. São, igualmente, abrangidos pela presente lei, as autoridades de entidades não públicas, singulares ou colectivas, circunstancialmente investidas de poderes públicos.
A designação, para um cargo público, por eleição, por nomeação ou por contrato, pressupõe e implica a estrita observância da Constituição da República e da legalidade, bem como dos princípios e deveres de ética profissional que garantam o prestígio dos cargos e das entidades neles investidos. O exercício da função pública deve orientar-se para a satisfação do bem comum que é seu fim último e essencial, devendo o servidor público inspirar confiança nos cidadãos para fortalecer a credibilidade da instituição que serve e dos seus gestores.
O servidor público, além dos deveres gerais contidos na Constituição da República, e sem prejuízo do que dispuser legislação especifica, pautam pela não discriminação e igualdade, legalidade, lealdade, probidade pública, supremacia do interesse público, eficiência, responsabilidade, objectividade e justiça. Pauta ainda pelo respeito pelo património público, reserva e discrição, decoro e respeito perante o público, conhecimento das proibições e regimes especiais aplicáveis, escusa de participação em actos em que incorra num conflito de interesse e declaração de património.
No caso do dever de respeito pelo património público, o servidor público deve abster-se de usar o património público para fins pessoais, bem como de praticar actos que lesem ou que sejam susceptíveis de reduzir o seu valor, em consequência de desvio, apropriação, esbanjamento ou delapidação dos bens de que tenha a guarda em virtude do cargo, mandato ou função.
No caso do dever de declaração de património, o servidor, ao assumir o cargo, deve declarar, sob juramento, os seus rendimentos e interesses patrimoniais, antes da tomada de posse, assim como suas modificações durante o mandato.
O que é um servidor público?
CONSIDERA-SE servidor público a pessoa que exerce mandato, cargo, emprego ou função em entidade pública, em virtude de eleição, de nomeação, de contratação ou de qualquer outra forma de investidura ou vinculo, ainda que de modo transitório ou sem remuneração.
Entende-se ainda como sinónimos de servidor público os termos funcionário, agente do Estado, empregado público, agente municipal e qualquer outro similar, que se utilize para referir-se à pessoa que cumpre funções em entidade pública.
São servidores públicos juízes e magistrados do Ministério Público de todos os tribunais, sem excepção, juízes do Conselho Constitucional, Governador e vice-governador do Banco de Moçambique, Presidente da Autoridade Tributária e reitor e vice-reitores de universidade públicas e estabelecimentos de ensino superior. Fazem parte ainda do grupo de servidores públicos, o Presidente da Comissão Nacional de Eleições, Embaixador, Cônsul Geral, Secretário-Geral, Inspector de Estado, Secretário Permanente de Ministério, Director Geral e adjunto das Alfandegas, Director do STAE, funcionário e agente do Estado, Gestor público, Administrador designado por entidade pública em pessoa colectiva de direito público ou em sociedade de capitais públicos ou de economia mista, gestores, responsáveis e funcionários dos tribunais, das procuradorias, do património público afecto às Forças Armadas e à Polícia, independentemente da sua qualidade.
A lei aponta igualmente como servidor público gestores, responsáveis e funcionários ou trabalhadores dos institutos públicos, dos fundos ou fundações públicas, das empresas públicas e das empresas participadas pelo Estado, titulares dos órgãos e funcionários ou trabalhadores das autarquias locais, das associações públicas e das entidades que recebem subvenção de órgão público, bem como titulares, responsáveis e funcionários ou trabalhadores das instituições de utilidade pública, gestores, responsáveis e trabalhadores de empresas privadas investidas de funções públicas mediante concessão, licença, contrato ou outros vínculos contratuais, assim como funcionários públicos e trabalhadores do sector público-administrativo e empresarial, integrados na administração directa ou indirecta do Estado ou administração autónoma do Estado e elementos da Força e Segurança e das Forças Paramilitares a todos os níveis.
Nível de abrangência
O documento ontem aprovado pela AR indica que é servidor público quem exerce os seguintes cargos políticos: Presidente da República, da Assembleia da República, Deputados da Assembleia da República, Primeiro-Ministro, Provedor de Justiça, Ministro e vice-ministro, Governador Provincial, Presidente do Conselho Municipal, Administrador Distrital, Chefe de Posto Administrativo, Chefe de Localidade e de Povoações, bem como demais cargos políticos que venham a ser criados.
Entretanto, a lei refere que o deputado parlamentar deve exercer as funções que correspondem ao seu cargo, de acordo com o dispositivo na presente lei, e sem prejuízo do que dispõe o Estatuto do Deputado. Ele deve ainda, cumprir funções destinadas a satisfazer o interesse público e a realização do bem comum pelo que, no exercício das suas prerrogativas, o interesse público prevalece sempre sobre os interesses pessoas, políticos ou de qualquer outra natureza.
No exercício das suas funções parlamentares, segundo a lei, o deputado tem sempre presentes os valores sociais da paz, segurança, liberdade e justiça. Igualmente, deve abster-se de invocar a qualidade de deputado para realização dos seus interesses pessoais e privado, incluindo as actividades profissionais a favor de terceiros.
O deputado está ainda proibido de receber remunerações de outras instituições públicas ou empresas em que o Estado tenha participação, seja em forma de salário, senhas de presença ou honorários. Está proibição não se aplica quando as remunerações provenham do exercício da docência.
Caso das influências
DURANTE o exercício do cargo é proibido ao servidor público usar o poder oficial ou a influência que dele deriva para conferir ou procurar serviços especiais, nomeações, ou qualquer outro benefício pessoal que implique um privilégio para si próprio, seus familiares, amigos ou qualquer outra pessoa, mediante remunerações ou não.
Igualmente, está proibido de emitir normas em seu próprio benefício, bem como usar o título oficial, os distintivos, papel timbrado da instituição, ou o prestígio dela para assuntos de carácter pessoal ou privado.
Ao servidor público fica igualmente proibido de usar os serviços de pessoal subalterno, assim como os serviços que a instituição presta, para benefício próprio, de familiares ou amigos, salvo as regalias a que tem direito. Do mesmo modo fica proibido de aceitar pagamento ou honorários por discurso, conferência ou actividade similar para o qual tenha sido convidado a participar na sua qualidade de agente público.
De igual modo, a lei proíbe os servidores públicos de aceitar levar a cabo trabalhos e actividade, remuneradas ou não, fora do seu emprego, que estejam em conflito com os seus deveres e responsabilidades ou cujo exercício possa dar lugar, com natural razoabilidade, a dúvidas sobre a imparcialidade na tomada das decisões salvo excepções admitidas por lei.
Das proibições consta ainda que o servidor público está impedido de solicitar a governos estrangeiros ou a empresas privadas, colaboração especial para viagens, bolsas de estudo, hospedagem, ofertas em dinheiro ou outras liberdades semelhantes, para seu próprio beneficio, seu cônjuge, irmão, ascendente e descendentes, em qualquer grau da linha recta ou para terceiro, salvo quando tal pedido resulte do exercício da função ou cargo. Está ainda proibido de auferir benefícios, à margem daqueles a que tenha legalmente direito, e utilizar abusivamente, para fins particulares seus ou de terceiros, os meios que lhe estão confiados para o cumprimento das suas funções, designadamente fundos orçamentais, viaturas de serviço, fotocopiadoras, telefones, computadores, fax, scaners e demais equipamentos.
Não deve ainda receber, directa ou indirectamente, benefícios originados em contratos, concessões, ou franquias celebrados ou outorgados pela administração, bem como solicitar ou aceitar, directamente ou por interposta pessoa, presentes, doações, favores, gorjetas em virtude do beneficio concedido, o que se presume, quando o beneficio se dê em razão do cargo que se desempenha, nos termos estabelecidos.
Durante o horário de trabalho o servidor público fica proibido de participar em actividades políticas ou partidárias, religiosas ou cívicas.
Conflito de interesses
O CONFLITO de interesse ocorre quando o servidor público, se encontra em circunstâncias em que os seus interesses pessoais interfiram ou possam interferir no cumprimento dos seus deveres de isenção e imparcialidade na prossecução do interesse público.
Assim, o objectivo do sistema de conflito de interesses é promover a confiança pública sobre a integridade da actuação pública e sobre o processo de tomada de decisões pelos servidores público, mediante o estabelecimento de normas e procedimentos que têm por finalidade assegurar que actuem de acordo com os valores do primado da lei, da ética, justiça, do respeito pelos direitos e liberdade fundamentais dos cidadãos, probidade e profissionalismo.
O regime do sistema de conflito de interesse estabelece ainda normas que identificam as circunstâncias em que ocorrem os conflitos de interesse, as normas de gestão desses conflitos, as garantias, administrativas, judiciais e politicas aplicáveis ao servidor público e aos cidadãos em geral, bem como o respectivo regime sancionatório.
Assim, os efeitos do conflito de interesse apontam para que o servidor público deve abster-se de tomar decisões, praticar qualquer acto ou celebrar contrato sempre que se encontre em qualquer circunstância que configure conflito de interesse ou que possa criar no público a percepção de falta de integridade na sua conduta.
Dos tipos de conflito de interesse se destacam categorias como relações de parentesco e de afinidade, patrimoniais, ofertas e gratificações, uso ilegítimo da qualidade de agente público em benefício próprio e a situação de ex-titular de servidor público.
Entretanto, depois de cessar funções públicas, o servidor público está, a todo o tempo, proibido de actuar em forma tal que obtenha da sua antiga instituição vantagens indevidas para si ou para terceiros. Igualmente, está proibido de participar em qualquer processo negocial, contratual ou de outra natureza, com a instituição pública em que serve, a favor de si próprio ou em representação de terceiros, desde que nele tenha intervido como funcionário, perito ou conselheiro.
Como obrigações, o servidor público deve estar disponível para a passagem de pastas, bem como, no prazo máximo de 30 dias, proceder à restituição da habitação, do material, do equipamento e dos meios da instituição que, por força da função, estiveram ao seu dispor.
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