Olá Judite
Espero que esta carta te encontre de boa saúde, minha amiga. Do meu lado tudo bem.
Escrevo-te hoje para te falar de alguns aspectos interessantes sobre a vida e a economia desta nossa cidade de Maputo.
Porque, na capital, estamos a assistir a fenómenos que parecem contraditórios,
embora talvez não o sejam.
Eu explico:
Por um lado toda a gente fala de uma grande crise económica. Pequenas e medias empresas estão a ir à falência todos os dias, toda a gente deve a toda a gente e ninguém sabe se e quando vai poder pagar.
Por outro lado, na baixa da cidade crescem prédios de um tamanho enorme, iguais ou mais altos que o famoso “33 andares”, que foi o nosso recorde por muitos anos. E não há um palmo de terreno disponível, e as novas empresas nascem e crescem como cogumelos, muitas delas ostentando nomes em ingles para parecerem mais sofisticadas.
Há poucos dias estive a ler uma lista de novas empresas ligadas ao sector da exploração mineral e dos seus donos. Embora as empresas sejam muitas, na prática os proprietários são relativamente poucos. E agrupados em muito poucas famílias (dessas de pai, mãe e filhos). Os que não cabem nestas poucas famílias cabem todos, sem excepção, na grande família FRELIMO.
Vais-me dizer que não nos devemos admirar. Que são pessoas com espírito empreendedor e, portanto, que avançam logo para as áreas onde o seu empreendedorismo pode dar frutos.
Mas a mim parece é que são pessoas com informação privilegiada sobre o que se está a passar na economia nacional e que, portanto, se adiantam aos outros sectores da população que ignoram ainda as possibilidades que se estão a abrir no mercado.
E o resultado é que, quando ouvimos falar de um novo grande projecto no país e ficamos a saber quem são os seus proprietários, descobrimos que há os grandes investidores estrangeiros, que foi quem colocou lá o seu dinheiro, e, depois, aparecem essas pequenas empresas que lá estão por obra e graça do Espírito Santo. E é até melhor não investigarmos melhor as razões do tal Espírito Santo, para não irmos descobrir coisas que ninguém gosta de saber.
Num país em que a burguesia praticamente não existia, nós estamos a criar a nossa a partir do controlo do Estado. Quem controla o Estado é quem dá autorizações, concede benefícios e contratos e permite que outros prosperem. Em troco, é claro, de uma fatia dessa prosperidade.
Quem controla o Estado controla também as empresas públicas, lá colocando a mamar na teta os seus filhos, afilhados e amigos, por pouco ou nada que eles percebam da actividade das tais empresas.
E, é claro, todos esses benefícios acabam por ficar fechados no círculo íntimo da mesma família política.
O resultado é que a burguesia que está a nascer no país não deriva de factores económicos mas sim de factores políticos. Não se chega a burguês devido ao trabalho aturado e às capacidades de produzir e vender.
Chega-se devido à capacidade de votar como o chefe manda, de não fazer ondas, de dar lustro ao sapato do chefe, de aplaudir entusiasticamente.
Isto para não falarmos dos que enriquecem, do dia para a noite, através de meios claramente criminosos, mais ou menos ligados a pós, comprimidos e
fumos. Também esses discretamente tolerados pelo Poder, que mostra enormes dificuldades para ver o que se está a passar.
Está agora muito na moda falarmos de gerações. A minha esperança é que a geração dos filhos destes novos burgueses de hoje passe a ganhar a vida de forma mais digna que a dos seus pais.
Mas não tenho grande esperança. Diz-se que “de pequenino é que se torce o pepino” e a sensação que tenho é que estes nossos “pepinos” estão a ser
torcidos para o mau lado.
Esperemos que eu me engane.
Um abraço para ti do
2 comments:
a nomeklatura esta em tudo neste Pais, e o curioso é que onde o papa esta o filhinho esta atras, ate nas empresas mineiras,o meu pai é que dormiu cedo e nao foi a luta ,teria sido o homem do primeiro tiro e hoje eu seria da nomeklatura que pena .
Amigo Chauque, esta é uma triste realidade, a nomenklatura e os seus familiares tomaram Moçambique de assalto!
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