As Forças de Defesa e Segurança (FDS) e a chamada guarda (armada) presidencial de Afonso Dhlakama envolveram-se, por volta das 12 horas da última sexta-feira, em intensa confrontação militar na Estrada Nacional Número 6, zona de Zimpinga, distrito de Gondola, província de Manica. Logo depois, os órgãos de comunicação social e as redes sociais estavam
inundadas de informações dando conta de mais um episódio que confirmava que o país continua a andar a passos bastante largos para mais uma guerra entre irmãos.
Nas redes sociais, inicialmente, as informações eram bastante díspares e contraditórias, com os internautas a tentar perceber e questionar o que efectivamente teria acontecido e o que teria motivado o tiroteio. Enquanto os que não são necessariamente jornalistas colocavam questionamentos lógicos sobre as razões de mais um tiroteio, a rádio e a televisão públicas nacionais tinham já as manchetes alinhadas. Os títulos eram do género:
“homens armados da comitiva de Afonso Dhlakama assassinam um transportador semi-colectivo de passageiros”.
Para a rádio e televisão públicas o assassinato do motorista do semi-colectivo de passageiros pela guarda da Renamo era o móbil da confrontação entre estes e as Forças de Defesa e Segurança. Ou seja, movidos por algum espírito de loucura, ou então, por terem exactamente o ADN de matar indiscriminadamente populações civis, a guarda. da Renamo viu “chapeiro” e decidiu atirou a matar. Quanta loucura!
Mas, como é que o transportador foi assassinado e logo a seguir, num ápice, as FDS estavam no mesmo local? A rádio e a televisão públicas não explicaram, mas davam a entender que as FDS saíram dos quarteis e das esquadras e acorreram ao local em defesa da população.
Tudo bem, efectivamente é tarefa das FDS proteger as populações e o território nacional. Mas a coisa torna- se simplesmente confusa quando a rádio e a televisão públicas não conseguem, por exemplo, dizer a que horas, exactamente, aconteceu o assassinato do motorista do chapa e a que horas começou o tiroteio. Esta indicação é tão importante porque permite tirar ilações e conclusões do que efectivamente aconteceu no local.
Nos seus noticiários, a radio e a televisão públicas citavam o comandante da Polícia da República de Moçambique na província de Manica, Armando Canhenze. Não houve, ao que nos pareceu, o esforço de se tentar ouvir qualquer dirigente da Renamo, a exemplo de António Muchanga, na qualidade de porta-voz.
Na verdade, reconstituindo os factos a partir de colegas nossos que, felizmente conseguiram rapidamente estar no “sítio”, tudo indica que o assassinato do transportador do semicolectivo de passageiros supostamente por homens da Renamo aconteceu quando eram 12 horas. Quando tal acontece, a comitiva da Renamo terá parado para averiguar o que efectivamente estava a acontecer. Ou seja, se tinha sido um disparo da comitiva, ou então, de algum outro local. Nisto, e num ápice, cerca de apenas 5 minutos depois do assassinato do motorista do chapa, inicia um intenso tiroteio, com os homens da Renamo ainda à beira da estrada e a outra parte nas matas. Não entrando para peritagem militar, fica aqui a indicação clara de que os homens que dispararam da mata para a berma da estrada estavam há muito posicionados. Isto talvez explica o facto de um total de 19 elementos da comitiva de Afonso Dhlakama terem sido mortos naquela circunstância, mas, do lado do grupo que estava posicionada na mata, oficialmente não existe indicação de baixas, apesar de o porta-voz da Renamo, António Muchanga, ter falado de algumas dezenas.
É verdade que a real génese da confusão continua confusa, mas o que é um facto é que exactamente no local da confrontação estavam homens armados devidamente armados e posicionados para atacar a comitiva da Renamo. Quem são? Não sabemos. Mas, quando as populações da zona e passageiros saíram em debandada para a mata, cruzaram-se
com homens altamente armados, com coletes de bala e carregadores de metralhadoras.
Estavam a civil e foram exactamente estes que aconselharam as populações e os viajantes a placarem para escaparem do fogo cruzado. No fim, foram esses homens (armados) que aconselharam as populações e os viajantes a seguirem este e aquele caminho. Uma vez
mais, a pergunta é, quem são estes? A Polícia diz que mandou uma força para o local, mas essa força devidamente uniformizada chegou ao local muito mais tarde. Não para combater porque o combate tinha terminado há muito. E o combate foi entre a guarda armada da Renamo e os homens altamente armados, com coletes e carregadores de metralhadoras.
Entretanto, não tinham qualquer identidade. Estavam a civil. Quem são estes? A resposta a essa pergunta pode ajudar a esclarecer o que efectivamente aconteceu em Zimpinga.
Outra coisa. A Polícia diz que foram as populações que incendiaram carros da comitiva da Renamo. Será mesmo? Estaria a população com coragem e ideias de incendiar viaturas numa situação de fogo intenso?
A polícia diz que os carros foram incendiados a posterior, ou seja, depois de a situação ter-se acalmado. Mas a polícia uniformizada já estava lá? Sim, estava. E deixou a população incendiar carros da Renamo, alegadamente porque estava enfurecida com as atitudes da Renamo? Não há respostas para muitas perguntas, mas a verdade é que logo que o
primeiro tiro foi ouvido, a primeira coisa que as populações fizeram foi fugir para a mata e ninguém, ninguém mesmo continuou por perto. A haver alguém a incendiar as viaturas não pode ter sido a população.
Portanto, com ou sem resposta para as várias perguntas, a verdade é que estamos a um passo de entrar para mais uma guerra. Uma guerra em que,
mais uma vez, os políticos estarão a comandar a partir dos gabinetes e as populações serão carne para canhão.
(fernando.mbanze@mediacoop.co.mz)
Editorial, mediaFAX, 28.09.2015
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