Wednesday 18 June 2014

“Partir”a Beira é Projecto Que Vem de Longe"

 A tese de licenciatura de Egídio Estevão Chaimite chamou-se “Descentralização e Competição Política: A Questão da Delimitação do Município da Beira”. Essa tese foi defendida em Fevereiro de 2010 e a pesquisa correspondente efectuada em 2009, ou seja, há cerca de cinco anos atrás.
Na página 7 deste documento, aponta-se como objectivo da tese provar que “a proposta de alteração dos limites territoriais do Município da Beira visa reduzir a influência da Renamo no município e é uma manifestação da intolerância política da Frelimo relativamente à oposição no país.”
A partir daqui, e ao longo de 45 páginas, Chaimite defende e procura sustentar por meio de comuntação, estatísticas, legislação vária e depoimentos qu essa “alteração dos limites da circunscrição territorial da Beira” faria parte de uma estratégia de “Gerrymandering”, um anglicismo que se utiliza para designar a “alteração deliberada de limites territoriais de distritos para influenciar resultados eleitorais”.
Este síndrome de “Gerrymandering“ ( Gerry+Mandra) ou “gerrymandering” é uma “estratégia de competição política” através da qual o partido no poder “maximiza o efeito dos votos a seu favor” e “reduz o efeito dos votos dos seus adversários”. O termo foi inventado em 1912, quando o então Governador de Massachussets, nos E.U.A., Elbrig Gerry, transformou os limites do Condado de Essex, dentro do seu Estado, criando um distrito senatorial com maioria de eleitores federalistas, “assegurando” a sua reeleição. O novo formato do distrito parecia uma salamandra ( sala/ mander ). Foi aí que o “Boston Gazette” se inspirou para chamar “gerrymander“ ao desenho resultante da “redistritalização” . 
Pode aplicar-se o “gerrymandering”, essencialmente de duas maneiras: fazendo o “packing”ou “voto excessivo”, concentrando “o maior número possível de eleitores da oposição em áreas claramente demarcadas”, o que reduz a sua “influência nas áreas de interesse do partido no poder”.
Alternativamente pode fazer-se o “cracking”, ou “voto desperdiçado”, “espalhando” eleitores da oposição por diversas áreas, pulverizando-os e “reduzindo o seu poder de bloquear a reeleição do partido no poder.”
Egídio Chaimite escolhe como exemplos os casos do Vietname e do Uganda. No primeiro caso, criaram-se 24 novas províncias, de 1990 a 2004, para servir o interesse das elites do partido o Partido Comunista do Vietname (CCOM) no poder, em “alargar o domínio das empresas estatais a nível local e, através destas, reforçar a sua influência política. ”No caso do Uganda, só o “gerrymandering” consegue justificar a “explosão do número de distritos (o mais alto número de Governos Locais), de 39 para 79 em menos de uma década”, sublinha.



PROJECTO ANTIGO


As circunstâncias, argumentos e timings pré ou pós-eleitorais citados ao longo deste estudo são quase perfeitamente idênticos aos que temos lido e ouvido nestes últimos dias de Junho de 2014. A supostamente “recente” (?) decisão de “partir” a Cidade da Beira é, aliás bem mais antiga que o estudo de Chaimite.
Este situa o início efectivo desta estratégia de “dividir para reinar” na sequência da derrota da Frelimo na Cidade da Beira, em 2003, perdendo o Município para a Renamo, embora o projecto se tenha começado a desenhar mais cedo.
A menção à Renamo dever-se-á ao facto de o MDM só ter sido fundado em Março de 2009. Daviz Simango é primeiro eleito edil da Beira, nas listas da Renamo, em 2003 e em 2008 vence novamente as eleições para a presidência do município da Beira, como candidato independente.
“Realizaram-se três eleições autárquicas em Moçambique (1998, 2003 e 2008). Como resultado das eleições autárquicas de 2003, o Município da Beira passou para a gestão da Renamo, tendo se tornado no cerne de umas das contradições entre a Frelimo e a Renamo – a proposta de alteração dos limites da sua circunscrição territorial.”, podemos ler a dado passo.
A polémica terá surgido em 2006, quando o Ministro da Administração Estatal reriu que a da Universidade Jean Piaget pertencia ao Dondo. “Criou-se uma equipa multi-sectorial e multidisciplinar com a equipa de Dondo, percorremos o perímetro terrestre, mostrámos as coordenadas e andámos em todo o lado até ao rio Mazize. Então eles concordaram e viram que não tinham hipótese.”, relata um dos entrevistados de Egídio Chaiite. Todavia, em 2008, “… alguns meses antes das terceiras eleições autárquicas, começa uma outra guerra com a Administração Estatal (…). Recebemos um ofício do MAE que dizia que iria dividir a Cidade da Beira. Foi submetido à Assembleia Municipal e gerou muita confusão”, refere a mesma fonte.
Tal como na criação e extinção das autarquias locais, a alteração da respectiva área deve ser precedida de consulta aos seus órgãos (artigo 274 CRM; artigo 5 da Lei nº 2/97, de 18 de Fevereiro). No entanto, alegadamente para “determinar a área exacta de cada autarquia local”, o MAE realizou de 22 a 27 de Fevereiro de 2008, em parceria com o Governo Provincial de Sofala, “um trabalho nos municípios da Beira, Dondo e Marromeu, do qual resultou a recomendação de redução da superfície da cidade da Beira, com a desanexação dos Bairros Nhangoma, parte de Nhangau-Sede e Chonja.”
Assim, @dos actuais 633 km²@, a cidade da Beira passaria @a possuir 351 km²@, em 2008(?!).
Esta “ Proposta de Ajustamento da Divisão Administrativa e Revisão dos Limites das Circunscrições Territoriais das Cidades e Vilas,” foi rejeitada por maioria absoluta pela Assembleia Municipal da Beira.
Um mebro do partido Frelimo, entrevistado por Egídio Chaimite declarava:”É óbvio que há aqui uma ganância de se apoderarem de território. As zonas a serem desanexadas representam mais de cinquenta porcento da área total da Beira e em termos de recursos Nhangau é extremamente importante para a cidade. Os efeitos sócio-económicos serão negativos. Politicamente, a Beira fica reduzida a nada, e é certamente esse o objectivo do Governo.”
A criação do Distrito da Beira para além da cidade da Beira, integraria Nhangau-Sede, Nhangoma, Chonja e o posto administrativo de Savane, indica o estudo de Egídio Chaimite.
As estratégias de “gerrymandering” antecedem em muitos séculos o nome cunhado pelo “Boston Gazette”. A arte de manipular a Divisão Administrativa dum dado território, entendida como condição para o exercício efectivo do poder, marca as campanhas coloniais de César mas também as dos colonialismos em África. A máxima “Dividir Para Reinar” é atribuida ao Imperador e General Júlio César que personifica o apogeu do Imperialismo Romano.
A tese de Egídio Chaimite, investigador permanente do IESE, Instituto de Estudos Sociais e Económicos, Mestre em Ciencias Politicas pela Universidade de Bordéus IV e licenciado em Administração Pública pela UEM, encontra-se disponível online na página de internet do “Repositório Científico de Moçambique”.



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