Monday 23 June 2014

Coabitação política sacrificada por agendas “obscuras”?


Beira (Canalmoz) – Continuar pela via da confrontação coloca em risco a democracia. Muitos podem não ter reparado que a poesia e prosa política proveniente de certos círculos não abandonam posturas nem atitudes de confrontação.
De golpe em golpe, de discurso em discurso, de posição em posição, de procedimento em  procedimento, há gente que só consegue deixar transparecer que não está preparada para a coabitação e convivência pacífica.
Os tiros e gás lacrimogéneo disparados em Nampula por causa duma disputa relacionada com um edifício são simplesmente a ponta dum iceberg que revela o tipo de políticos que temos.
As agressões e violações de natureza política que somam um pouco por todo o país mostram que alguém não está preparado para ser ou estar na oposição.
O momento é de características únicas e especiais no mais verdadeiro sentido destas palavras. Existe tudo para melhorar o ambiente político, mas existe simultaneamente uma situação de carências típicas de encruzilhada política.
Quando os políticos esgotam argumentos válidos, perdem capacidade de compreender a razão das suas derrotas, acomodam-se em posições adquiridas, incorrem na miopia política.
Há uma recorrente reacção negativa, brutal de alguns políticos que denotam insipiência e manipulação da verdade. Onde disputas deveriam ser resolvidas com palavras, quem tem a PRM/FIR de seu lado acciona estas forças e coloca em perigo a vida de cidadãos e a estabilidade política. É inglório e perigoso transformar a PRM/FIR em entidades representativas de “moços de recados” a que se pode recorrer para resolver disputas políticas. O sentido de órgãos de soberania e de agentes da lei e ordem fica diluído e conspurcado.
É relativamente fácil seguir a via dos catálogos, que, como já se viu, não possuem sustentabilidade nem razão de ser. Agora que certa imprensa avança com “intenções obscuras” como forma de designar os objectivos que a outra parte lança para a mesa de negociações sobre o conflito político-militar no país, pode-se depreender que seus autores pretendem deixar passar a imagem de que a Renamo e sua liderança escondem algo. O PR jamais apareceu dizendo que o AGP tem pendentes. O Governo teima em menosprezar os argumentos de peso que a liderança avança como motivo da actual crise.
A cegueira aparente e promovida face a questões óbvias, documentadas e de conhecimento público revelam na verdade agendas obscuras. Está faltando uma dose de sensatez e de coerência por parte de governantes que, de repente, se vêem confrontados com uma oposição mais esclarecida.
O tempo exige que os partidos políticos aprendam rapidamente sobre como se devem relacionar e como devem executar as suas actividades políticas.
A existência de “brigadas de choque” com pacotes de instruções concretas sobre como inviabilizar as actividades políticas dos adversários é má decisão. Não se pode fazer política democrática com “camisas castanhas” ou outro tipo de estrutura obstrucionista. Democracia significa abertura, tolerância, espaço livre para a actuação política.
Outra questão que merece reparo é o silêncio a que as hierarquias se remetem sempre que surgem actos deploráveis de violência com inspiração política.
Os apologistas da paz e da democracia devem aparecer sempre que esta seja colocada em risco. Política não é actividade de fim-de-semana ou sazonal.
É preciso vermos os órgãos da justiça sendo responsáveis e proactivos no quadro da sociedade moçambicana actual. Demarcação completa dos “embrulhos” ou coletes-de-forças que os impedem de agir como deles se espera, é uma questão vital para a democracia moçambicana. A sensação ou percepção de impunidade com que uns actuam e estão convencidos de que podem actuar é um perigo real que não se pode permitir que floresça e se espalhe pelo país.
A tolerância, a paz, a convivência são factores que se constroem com comportamentos visíveis e não com simples proclamações.
Somos moçambicanos, diferentes, e não escolhemos como nascemos, onde nascemos, mas temos o direito a opção e escolha política, religiosa sem que isso diminua a nossa moçambicanidade.
As lideranças políticas nacionais são chamadas a exercerem e a manterem toda a serenidade por uma contenção discursiva, uma qualidade de acção política consentânea com os objectivos de paz, desenvolvimento e segurança nacional.
Derrapagens, malabarismos, agendas “obscuras” não podem nem devem colocar o país em risco de regressão.



(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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