Thursday, 21 May 2015

Uma assessoria cronicamente errada repete-se



Pagarão os moçambicanos, como sempre.
 Há que reconhecer que as teias com que se cose a “poderosa” Frelimo dependem de correlação de forças superiores a indivíduos específicos. Embora possa transparecer uma imagem de poder centralizado no líder, este não faz mais do que cumprir decisões de um colégio restrito de pessoas, como se tem visto ao longo da história deste partido.
Se hoje é uma Comissão Política que superintende à agenda do partido, importa clarificar que cada líder deixa a sua marca e forma de estar face aos seus pares neste “clube”. Persiste o domínio dos “libertadores” nesta comissão, e os novos ingressos preenchem espaços estatutários, mas sabem e percebem que não possuem o real poder da palavra nem iniciativa de propor acções. São como que pessoas necessárias para efeitos de quórum, mas pouco mais.
Quando um reputado membro da Frelimo, também libertador, afirmou em público que receava que a passagem de testemunho para uma nova geração poderia implicar a “venda do país”, isso foi bem entendido e interpretado nos círculos do poder real.
As diversas formas que toma a composição dos órgãos decisórios da Frelimo não deixam espaço para que uma mudança geracional aconteça no poder.
Num jogo nada simples, em que se utilizam todos os meios para continuar nos píncaros, a escolha do candidato, agora PR, foi esclarecedora quanto à capacidade de sobrevivência e replicação da velha guarda da Frelimo.
Diga-se que, por razões de sobrevivência política e de legado, não houve hesitação, ao longo dos anos, em manchar imagens e cortar ou eliminar espaços de actuação de gente antes muito preponderante. Que o digam certos indivíduos que, antes, até se supunham insubstituíveis e senhores da verdade e da razão. A fina-flor que idolatrava Samora Machel e promovia o seu culto de personalidade, para, nas entrelinhas, cimentar o seu poder individual, praticamente desapareceu dos canais oficiais da Frelimo. Choramingam pelos cantos, mas já nem espaço têm na comunicação social pública.
Se atendermos a que as equipas de conselheiros do PR são constituídas por pessoas escolhidas a dedo e provenientes das lideranças anteriores da Frelimo, não é de estranhar que o PR construa o seu discurso público na esteira do que lhe aconselham. E o produto final não contradiz a visão daqueles verdadeiros centros do poder na Frelimo.
Filipe Jacinto Nyusi encontra-se na difícil posição de ouvir Alberto Chipande, Joaquim Chissano e Armando Guebuza. Não é um facto incontestável, mas uma opinião resultante da leitura das declarações recentes do PR.
Há uma evidente linha de forças na Frelimo que privilegia a manutenção do poder, sem condescendências nem possibilidade de negociação e de construção de um consenso com os opositores face à forma como decorreram as eleições de Outubro de 2014 e posteriores resultados finais homologados.
Como no passado, parece que a decisão é de que os reclamantes acabarão aceitando o estado de coisas “cozinhado”.
Há uma evidente incapacidade de ver dinâmica nos assuntos nacionais e no comportamento dos diferentes interlocutores.
É difícil mudar, e isso tem exemplos diversos. Mesmo quando se mostra crucial consensualizar e concertar, convergir e ceder, existem os que pensam e proclamam que só a sua palavra constitui a verdade a seguir por todos.
A história recente de Moçambique tem sido uma confrontação bélica ou verbal entre forças políticas militarizadas que ainda não se convenceram de que a democracia política e económica constitui o único sistema que pode trazer estabilidade, paz e desenvolvimento consequente do país.
Os sucessivos acordos assinados entre a Renamo e o Governo da Frelimo têm sido abalroados sempre que interesses considerados vitais de uma das partes estejam em risco de sofrer revezes.
Agora, depois de tentativas infrutíferas de alcançar um acordo político global, que seria, na prática, a assinatura de um novo AGP em Maputo, paira no ar nacional a impressão de que se esgotaram os mecanismos de diálogo ou negociação.
Cresce a crispação, e os ex-beligerantes podem voltar, a qualquer momento, a ser beligerantes no activo e em toda a linha.
Acreditando que existem irredutíveis entre as partes, e considerando que os estrategas da guerra consideram estarem criadas as condições para a deflagração das hostilidades, só resta saber quando é que isso acontecerá.
Realistamente falando, a conjuntura política regional aponta para a existência de apoios concretos para os que defendem a solução final.
Será movido por esse facto que os discursos endurecem?
Será que existem garantias adquiridas de que haverá suprimento e assistência, senão mesmo intervenção de terceiros, em mais um conflito fratricida?
Se quisermos ser concretos, a experiência de combate contra os Boko Haram através da contratação de mercenários sul-africanos foi um sucesso e não é de menosprezar que essa via seja aplicada em Moçambique. Afinal a África do Sul não pode suportar uma paragem de fornecimento de energia eléctrica e gás neste momento.
A soma dos interesses corporativos estrangeiros existentes em Moçambique requer que algo seja feito para garantir que as suas operações fluam sem interrupções.
É difícil e praticamente impossível prever o que acontecerá nos próximos tempos no país.
Mas uma coisa é certa, havendo descarrilamento negocial, são os milhões de indigentes famintos moçambicanos que voltarão a sofrer.
A elite político-económica historicamente irresponsável julga-se protegida do que possa acontecer, mas, na verdade, não é bem assim.
Uma nova confrontação deve ser evitada por todos os meios, e exige-se um refrear de discursos excludentes e visceralmente contra os interesses dos moçambicanos.
Este país, Moçambique, não deve ser a repetição de histórias de falhanços e de derrapagens para carnificinas e violência sectária.
É agora que a sociedade civil, confissões religiosas, forças políticas parlamentares e extraparlamentares devem mostrar o que são e o que realmente os move.
Concórdia, paz, estabilidade e progresso não devem ser apenas palavras que se pronunciam conforme seja conveniente, mas algo que une moçambicanos independentemente da sua orientação politica, religiosa, estrato social.
A bandeira nacional cobre todos e o país é de todos.
É em momentos de crise como o que se vive que despontam e se revelam os verdadeiros líderes.
Afirme-se a liderança nacional, e que isso seja sentido e tenha efeitos imediatos, porque cada dia de discórdia é alimentação para os cultores da Guerra.



(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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