Wednesday 9 April 2014

Todo o cuidado é pouco em tempo de fim de mandato


Aprovação de regalias irrealistas para dirigentes é sintomático…

Beira (Canalmoz) – Vamos todos ter que pagar por créditos malparados, como ainda estamos pagando por causa de bancarrotas de bancos que emprestaram dinheiro sem garantias.
Se a transição para a economia de mercado ou para o reino da capitalismo selvagem... em Moçambique foi conturbada e associada a todo um leque de operações financeiras com grandes riscos, o fim do mandato presidencial de AEG afigura-se um momento com estranhos contornos.
O Grupo Moçambicano da Dívida insurge-se e sustenta que os fundos utilizados para a compra de armamentos é suficiente para dotar cada distrito do país com dezenas de ambulâncias. Ou que os valores envolvidos poderiam suprir os hospitais do país com uma gama variada de medicamentos. Resmungam hoje, mas já havíamos inquirido, no passado, onde estava esta e outras organizações congéneres, quando o governo se decidia por aquisições de utilidade duvidosa ou simplesmente aquisições de luxo, como viaturas de alta potência para ministros e deputados. Onde estavam estas organizações simpáticas e apadrinhadas pelo ex-presidente Joaquim Chissano, quando a avalanche despesista se iniciou?
Agora estarão fazendo ataques a flancos considerados fracos do regime de AEG? Será mais uma tentativa de corroer um adversário que se nega a incluir ou a ouvir os que se supunham sábios? É uma altercação entre alas ou membros menores de grupos de interesse?
A verdade é que resulta estranho e, no mínimo, problemático ver-se um governo em fim de mandato se endividando tanto. Ultrapassar o parlamento e decidir avançar com operações financeiras de longo prazo, autorizar e licenciar operadores de telefonia móvel e assumir responsabilidades numa operação de transição digital da radiodifusão sem passar pelo parlamento, são factos que demonstram a folgadeza em que se transformou governar em Moçambique. Afinal a maioria parlamentar durante dois mandatos consecutivos, mesmo com razões de sobra para questionar e impugnar, jamais se manifestou quando o executivo “pisou o risco”. Voto controlado e sempre obedecendo a instruções prévias tornou o parlamento numa fantochada gritante.
Numa república normal e digna desse nome, o governo moçambicano teria sido alvo de uma acção e “impeachment” a partir da altura que se outorgou decidir sem consultar e sem receber aprovação parlamentar sobre assuntos de extrema importância para o país.
Toda a negociata dos megaprojectos de exploração de recursos minerais e empreendimentos de produção de energia feitos e aprovados com a linha de orientação de favorecer parcerias público-privadas obscuras merecem atenção hoje e todos os dias.
Não se pode dormir enquanto agentes activos minam a estabilidade financeira nacional sob alegações de que estão avançando com parcerias público-privadas. Esta encenação lesa-pátria, não passa de uma forma astuciosa de ir buscar financiamento público para alavancar empresas privadas de correligionários.
Atacar conglomerados económico-financeiros que sugam fundos do erário público é uma necessidade que não se pode adiar.
Sugar recursos do estado através de arranjos empresariais e de “procurement” tem de receber tratamento adequado da Procuradoria-Geral da República.
Se a PGR se sente impotente para tratar dos “dossiers” que são da sua responsabilidade então que se demita em bloco.
Não se pode continuar com instituições públicas dispendiosas que não funcionam ou que não conseguem realizar a contento o trabalho que constitui a sua razão de ser.
Moçambique deve ultrapassar a situação de país formalmente com um governo e instituições parlamentares e judiciais formais, mas que, do ponto de vista de conteúdo, não passam de fachadas para assalto aos preceitos e fundamentos da República.
Condenar milhões de pessoas a uma miséria atroz só porque um punhado de pessoas se considera superior e destinada a comandar os destinos de um país, subjugando a vontade de todos, não pode ser tolerado.
Montados e protegidos por arranjos altamente prejudiciais ao interesse público, vemos uma fauna acompanhante voraz que nem praga de ganfanhotos projectando-se para posições de relevo na esfera governamental. Do executivo e seus responsáveis, recebem cargos em manifesta situação de recompensa por serviços prestados.
Negoceiam em nome do estado, mas, subjacentes, estão vantagens individuais a que o “inside trading” garante êxitos. Jogam com a propriedade da terra pelo estado para alavancarem “joint-ventures” de vulto.
As dinastias empresariais actuais e as constituídas sob o governo de Joaquim Chissano contrariam os preceitos democráticos e criam condições para o aumento do fosso entre a minoria extremamente rica e os milhões de pobres e indigentes. As convulsões sociais que isto propicia podem ser encobertas, mas não erradicadas.
Sem um regime jurídico que se cumpra todos os dias, sem um combate firme contra a impunidade judicial, destrói-se um país.
Fazer política com os pés assentes na terra e recorrendo aos ditames da República nunca foi tão importante.
Desistir da batalha por Moçambique é sucumbir, é entregar o futuro dos moçambicanos a uma “corja de corvos”…
Sem puritanismos, mas com responsabilidade, os moçambicanos, cada um no seu lugar, podem fazer a diferença…


(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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