Friday 24 January 2014

“Vermes” de ontem esquecidos acordando a todo o vapor?!

Desculpas, perdão, sem Comissão de Verdade e Reconciliação não colam

Insultos contra outros já foram proferidos em praça pública. Protagonismo na gesta de libertação nacional já foi monopolizado por outros. Apropriação da história e sua reescrita consoante agendas julgadas oportunas já foi realizado e disso até os textos oficiais relatam.
Tendo em conta a experiência de muitos países e até da Igreja Católica, movimentos no sentido de curar feridas históricas foram realizados com sucesso considerável. Pedir perdão não diminui, pelo contrário engrandece quem tem essa coragem.
Em Moçambique um grupo influente de políticos e dirigentes governamentais teima em ressuscitar “fantasmas” aparentemente sem pretensão de oferecer soluções definitivas para um problema que existe.
Os ensaios repetitivos de demonizar alguns participantes do processo de fundação da Frelimo e integrantes na luta de libertação nacional denotam uma situação de desconforto com um eventual evoluir da mesma. Teme-se, pelo que tudo indica, a reabertura de processos histórico-políticos que foram resolvidos sem observância dos preceitos legais vigentes no país. Falar de revolução como algo superior a todo o edifício legal ou constitucional é ilusionismo político.
Se uma envolvente histórica, reconhecidamente influente como a Guerra-Fria terá sido a causa de alguns procedimentos contrários aos direitos humanos universalmente aceites, isso não deve ser a causa de um tratamento leviano de um assunto de suma importância para o país e seus cidadãos.
Por mais que se pinte os outros de reaccionários ou traidores isso não será aceite com unanimidade por todos os moçambicanos.
Aquando da assinatura do AGP surgiram opiniões favoráveis a criação de uma Comissão Nacional da Verdade e Reconciliação mas os detentores do poder não acolheram a ideia. Esse tipo de instrumento foi útil na pacificação e estabilidade de países como a África do Sul. Em guerras os exércitos ou beligerantes cometem excessos. Por interesse político e tendo em conta a agenda nacional seria de desejar que tivesse havido uma abertura suficiente para discutir pendentes relacionados com os chamados “traidores”.
A razão não é propriedade exclusiva de um lado sendo que não faz sentido, não tem cabimento, continuar batendo na tecla de que uns foram reaccionários, traidores e outros foram revolucionários patriotas.
Uma visita aos dossiers controversos da luta de libertação nacional e todo o período imediatamente a proclamação da independência mostra indubitavelmente que ocorreram situações abertamente contrárias ao plasmado na Constituição e na Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU.
Conquistar e manter o poder terá sido a motivação de muitas acções daquele tempo e destes dias.
Vamos lá equacionar o seguinte: figuras de proa do regime do dia nos tempos da I república perderam seu estatuto e hoje aparecem vilipendiadas até na praça pública. Em virtude de sua participação na luta anti-colonial reclamam um estatuto especial que lhes é negado pelo novo regime. Numa ofensiva orquestrada e administrada ao mais alto nível surgem sinais que tais figuras foram definitivamente “excomungadas”. Como numa purga na Coreia do Norte só faltou que fossem julgadas e condenadas a morte. São então os reaccionários de hoje enquanto outros os tem por algozes de ontem. Em que ficamos? Vai promover-se um tratamento extrajudicial ou se vai seguir a tradição revolucionária? E de que revolução seria tal tradição?
Uma história não se impõe a um povo. Se a defesa de procedimentos político-governamentais é aceite ou relacionada com circunstâncias específicas isso não significa de modo algum que tais procedimentos sejam correctos e muito menos moralmente aceites.
Em nome convivência salutar entre concidadãos uma decisão como o perdão mútuo é possível e sobretudo importante e basilar.
Só com perdão real e efectivo é que se constrói aquele nível de confiança que permite diálogo consequente entre os políticos de um país.
Os apologistas do puritanismo revolucionário foram desmascarados por suas próprias práticas logo que ascenderam ao poder. A soma sucessiva de erros manchou os se pretendiam puros e imaculados.
Linhas de orientação política completamente controladas por mentores externos se revelaram fatais para muitos moçambicanos.
Hoje quem reclama reconhecimento nacional por sua participação na luta de libertação nacional deveria estar preocupado em encontrar mecanismos que promovessem a concórdia nacional.
Quem não se lembra de pronunciamentos como “aquela mão jamais apertarei”? A que se pode chamar a esse comportamento?
Vistas as coisas sob o prisma actual afinal os revolucionários de ontem não são a mesma coisa hoje. Os “marxistas-leninistas” de ontem abraçaram com “unhas e dentes” a ideologia neoliberal. Venceu o capital ou este comprou as consciências que antes puniam severamente os outros por desvios de linha?
Tenhamos a santa paciência de reconhecer que não há santos entre nós.
Perdão é para quem errou, se desviou de preceitos ou de alguma forma não cumpriu com decisões tomadas colegialmente. Quem se bateu por suas crenças políticas não precisa de pedir perdão.
É mau serviço e disseminação de informação errónea atribuir espaço privilegiado a determinadas pessoas que teimam em defender uma posição que a maioria já não acredita.
Os conflitos de hoje, as desavenças e carnificina progressiva que se verifica hoje, têm a sua origem no tratamento parcial e defeituoso de questões de interesse nacional.
Esgrimir a arma da pureza histórica para sustentar posições políticas contraproducentes é “política de avestruz”.
A comunicação social pública e alguma privada já deveriam ter compreendido e entendido que estão sendo utilizadas num jogo inglório.
“Quando se zangam as comadres descobrem-se as carecas”…



(Noé Nhantumbo, Canalmoz)

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