Thursday 3 July 2008

Zimbabwe: um modelo de democracia para África


Olho para a situação do Zimbabwe como uma forma que aquele país africano encontrou para construir um tipo de democracia que pode vir a ser válido em África num futuro muito próximo.
Esse tipo de democracia, consistiria numa mistura entre o modelo clássico de democracia e as antigas formas das monarquias africanas. Até aqui nada mau. Trata-se de um modelo de governação que vale a pena estudar. Contudo, peca em dois aspectos, o primeiro porque não é legitimado pelo povo e o segundo porque é um mau exemplo para os outros Estados africanos.
Não há dúvidas que desde a altura das independências africanas os novos Estados optaram pela demagogia que pela Democracia, hoje, com o crescimento da consciência dos cidadãos, alguns governantes criativos procuram a partir da demagogia, introduzir novo tipo de governação recuperando traços antigos.
A União Africana, ao não criticar Robert Muga- be e ao sistema por ele introduzido no Zimbabwe, assumindo a máxima segundo a qual quem cala consente, fazem acreditar que olham para o sistema zimbabweano como um modelo que pode ser seguido.
Na verdade, o que está a acontecer no Zimbabwe é o aproveitamento dos traços da democracia para criar uma ditadura ou até mesmo uma tirania. Em primeiro lugar porque para além de desobediência declarada às leis, o regime de Mugabe restringe no máximo os direitos e as liberdades individuais do povo. Em segundo lugar porque para além de não ser legitimado pelo povo, manipula o judiciário, o legislativo, a mídia e até a opinião pública.
No dia 27 de Junho corrente Mugabe foi o único concorrente às eleições no seu país e em menos de 48 horas já haviam sido publicados os resultados eleitorais, onde ele saiu vencedor e imediatamente tomou posse como novo Chefe do Estado, substituindo-se a si mesmo, que está no poder desde 1980 e correu a participar do Encontro dos Chefes de Estados Africanos a acontecer no Egipto.
A eleição do dia 27 é uma Segunda volta, pois na primeira, Mugabe havia perdido para seu primeiro opositor Morgan, com resultados publicados quase dois meses depois com a indicação de nenhum deles tinha chegado aos 50% dos eleitores, o que obrigou a segunda volta.
Se os resultados da primeira volta criaram suspeitas não só pela demora na sua publicação, bem assim como a manipulação dos órgãos eleitorais, a segunda volta surpreendeu pela rapidez de publicação dos resultados de eleições que para além de serem violentas, foram acompanhadas de forte intimidação e militarização.
Assim é o modelo de Governação que Mugabe está a inventar para África e que pelo silêncio está a ser positivamente assumido pelos governos Africanos e principalmente na Região Austral, dado o silêncio cúmplice que os líderes alimentam.
Mas e então? Porque é que Mugabe decidiu reinventar a Democracia? Pode ser por duas razões: primeiro pela ganância que tem ao poder, mesmo sabendo que já não tem o apoio dos cidadão. A ganância pelo poder, pode ser um fenómeno natural, principalmente quando a pessoa fica dezenas de anos na posição de Chefe, e todos sabemos que uma das características do poder é corromper.
Em segundo lugar pode ser porque, Mugabe, assumindo- se um político e visionário quer antever uma das vias para a independeria total de África do ocidente, a ler pela maneira como ignora tanto os principais parceiros africanos de cooperação internacional, bem assim às Nações Unidas que são uma espécie de Umbrela para os Estados Membros.
Nesta segunda hipótese, Mugabe estaria a ser mal compreendido pelos seus detractores. Isso já aconteceu várias vezes na história da ciência política. Pena que se assim for, a verdade só sairá enquanto nenhum de nós está vivo.
Considerando a primeira hipótese, não há duvidas de que Mugabe transformou-se num tirano, um tirano demagogo, que aproveitando-se da vulnerabilidade do povo e apoiando-se nos ombros dos seus homólogos africanos golpeou o Estado.
O líder, com ou sem carisma, no mínimo deve ser legitimado pelo povo. Mugabe ao introduzir seu novo modelo de governação, que prega poder servir para o continente africano teve que dar um golpe no Estado. Se hoje o golpe de Estado é duramente condenado, é tempo de perceber que líderes inteligentes como o Mugabe inventam novas formas de golear o Estado.
Na verdade, quem está no poder não precisa usar a maneira clássica de golpear o Estado, ele usa formas subversivas, muitas delas já em uso em vários Estados africanos, onde os líderes já não representam a vontade da maioria, mas continuam agarrados ao poder através de processos eleitorais fraudulentos e de democracias fragilizadas.
É aqui que reside a responsabilidade da União Africana que até hoje ainda não condenou Mugabe, nem mesmo o impediu de participar da Assembleia dos Chefes de Estados africanos tida lugar até ontem no Egipto. Agindo desta forma, esta União pretende afirmar que o mecanismo usado por Mugabe para chegar ao poder é também válido e que a única forma de Golpe de Estado é aquela em que se assalta a presidência, se fazem reféns e um militar assume o poder. Meus caros, isto está fora de moda.
Longe da União Africana representar os interesses do povo africano, cada vez mais se mostra aliado a vontades individuais dos Chefes de Estado e dos Governos africanos. É uma união que serve somente a 100 ou no máximo 200 africanos sustentados por todos nós e onde alguns cidadãos chegam a pagar com sangue, como é o caso do Zimbabwe.
Zimbabwe é também um sinal importante para a região austral. Importante para os governos e para os cidadãos, na medida em que, os Governos da região ficam a saber que afinal de contas os opositores podem tomar o poder e os cidadãos ficam conscientes de que uma possível vitória da oposição nas eleições presidenciais ou legislativas derramará muito sangue e significará a introdução de regimes ao estilo Mugabista.
Pessoalmente sou pela invenção de um modelo de governação com padrões típicos africanos, contanto que seja legitimo, com apoio da maioria dos africanos e com respeito aos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos. Pois, em pleno século XXI não faz sentido reinventarmos a tirania ou a ditadura._
( Custódio Duma, em “ O Autarca “, de 02/07/08 )

2 comments:

Reflectindo said...

De facto, estou entendendo que este modelo inplícito que pareca, foi desenhado pelos líderes africanos que nunca querem sair do poder. Penso que é matéria de estudo pelos nossos estudiosos (africanos). Mugabe não é o primeiro, infelizmente. Antes pelo contrário há muitos outros que fizeram o mesmo com o sucesso como é o caso de Omar Bongo. Não devemos esquecer que uma outra tentativa foi a de alterar as constituicões a favor deles.

Tenho dúvidas que um modelo de democracia para África que concilie a vontade dos povos aos ganânciosos governantes, seja encontrado. Os povos africanos, embora na sua maioria constituido por analfabetos votam mais ou menos como os outros povos do mundo. No Botswana, em Cabo Verde não há problemas porque os seus dirigentes/políticos têm interesse pela democracia.

Agora a questão para mim é se teremos que nos render aos gananciosos? Será que ganância pelo poder é uma questão africana? Uma questão de cor de pele?

Eu digo que não podemos nos render aos ganânciosos pelo poder rodeiados pelos militares. A ganância ao poder não é questão africana nem de cor de pele. Deve haver governantes doutras partes do mundo que cobiçam os nossos governantes porque conseguem realizar as suas vontades ainda protegidos pelos homólogos do continente.

JOSÉ said...

Eu não sou intelectual mas não tenho dúvidas que os problemas de África se devem à sua reluctancia em abraçar sem reservas a democracia, isto é, os problemas seriam resolvidos se a democracia fosse aprofundada, África nunca terá paz e progresso sem democracia. Numa democracia pura não há lugar para corrupção e fraude e os líderes não ambicionam perpetuarem-se no poder.

Os princípios democráticos são simples e universais, não precisam de ser adaptados às condições locais, a democracia africana não precisa de ser diferente da democracia europeia, se enveredamos por esse caminho vamos certamente caír nos desvios e abusos.

Vamos aceitar este estado de coisas? O que fazer? Deixemos as nossas consciencias falar! O problema é que a situação em África condiciona as pessoas a pensarem que as coisas são mesmo assim e aqui tudo trabalha de modo diferente, não podem ser mudadas. Felizmente, NÓS NÃO PENSAMOS ASSIM!
Para ti, um grande abraço!