Agora, com o assunto das eleições praticamente encerrado, é o momento de focalizar no futuro,auxiliando-nos, para isso, de uma breve análise sobre o que aconteceu e que deveria ter sido melhor.
A sabedoria tardia é sempre mais perfeita que o passado. Todos são maislúcidos hoje do que estavam ontem.
É preciso em primeiro lugar sublinhar (e reconhecer) que estas foram eleições muito mal conduzidas, e será por isso muito difícil avaliar até que ponto os seus resultados irão reflectir, de forma categórica, o desejo genuíno dos eleitores nas urnas.
A escala da fraude nunca será objectivamente determinada, dado que a nossa leibaseia-se no ónus da prova. Na ausência de provas irrefutáveis, todas as alegações de má conduta eleitoral permanecerão simples percepções populares e nada mais. Aliás, o crime nunca é perfeito, mas tenta sempre ser o mais perfeito possível. Excepto num dos raros casos em que uma funcionária do STAE teve a infelicidade de ser apanhada com a mão na massa.
Noutras indiscrições mal sucedidas, a situação foi tão óbvia que o Tribunal Supremo não tinha qualquer outra alternativa senão mesmo anular toda a votação.
Mas ninguém precisa de ser um cientista espacial para notar o esforço defensivo que tem sido encetado pela máquina propagandista para tornar estas eleições geralmente aceites.
As teorias de conspiração visando arrastar para o campo político nacional chefes de missões diplomáticas acreditadas em Moçambique devem ser entendidas como parte desse esforço, fazendo-se valer da analogia desportiva de que a melhor defesa é o ataque.
A estratégia é óbvia. As relações diplomáticas entre estados não se deixam influenciar pelos relatos da imprensa.
Dessa forma é fácil atacar publicamente um perceptível oponente que se sabe a priori que fará tudo para evitar qualquer exposição na imprensa, sabendo-se, de antemão, que quando o visado levantar a questão através dos canais diplomáticos apropriados,terá como resposta a linha de que num Estado democrático, onde a liberdade de expressão é uma das principais características, a comunicação social é livre de dizer seja o que for, sem que os governantes se intrometam nisso. Moçambique define-se constitucionalmente como um Estado democrático. Se os seus políticos acreditam nos valores da democracia, isso já é outro assunto.
É assim que a linguagem da democracia, sem que ela se baseie em fortes convicções democráticas, pode ser usada como arma de arremesso contra os líderes mundiais da democracia. E a única acção legítima que podem tomar é retirar o seu embaixador, como sinal de protesto. Mas aí, como eles próprios o diriam, “who cares?” A única coisa que queremos deles é o dinheiro que nos dão para
pagar os nossos salários e alimentar o nosso voraz apetite pela luxúria.
O primeiro sinal de que nem tudo estava bem com estas eleições surgiu com as primeiras informações, nas vésperas da votação, de que material eleitoral destinado a uma das províncias teria sido roubado. Depois foi substituído, mas no processo dedestruição do material original, parte dos novos boletins também foram incinerados. Era o prenúncio de um processo caótico. Deliberadamente ou não, pouco se sabe. Perante todo este quadro, é remota a possibilidade do Conselho Constitucional vir a questionar de forma significativa a decisão da Comissão Nacional de Eleições (CNE).
Mas não será exagero afirmar que estas terão sido as piores eleições na nascente história da democracia multipartidária em Moçambique, não menos quando se considerer que elas acabaram sendo decididas não pelo voto dos eleitores, mas sim pela maioria relativa dos 17 membros da CNE.
É um grande retrocesso para um país que ainda guarda pretensões de ser levado asério pelo resto da comunidade internacional.
Não será de grande utilidade continuar a debater sobre as várias irregularidades, reaise percepcionais, que terão ensombrado estas últimas eleições. Mas para ganhar o respeito que merece por parte do povo e dos seus parceiros, e continuar na senda do desenvolvimento, Moçambique terá que encontrar formas de conferir credibilidade às suas instituições, e não menos importante, as que estão encarregues de gerir processos eleitorais.
Eleições cujos resultados são objecto de desconfiança por parte dos eleitores, mesmoquando essa desconfiança é infundada, não conferem dignidade aos vencedores. Não são os que desconfiam dos resultados quem deve apresentar provas da sua atitude reservada em relação aos resultados. Cabe à CNE e ao STAE provar que são entidades credíveis, e como tal merecedoras da confiança dos eleitores. Não foi desta vez, e isso é uma grande nódoa para a credibilidade de todo o país. E pior ainda, para aqueles que terão que governar nos próximos cinco anos com o estigma de estarem no poder por via de votos roubados. Talvez a intenção dos que engendraram todo este caos fosse justamente essa de reduzir a credibilidade e legitimidade dos vencedores.
Um Presidente eleito nestas circunstâncias será um eterno devedor de favores a muitos que o tentarão convencer de que não tinha outra forma de vencer as eleições.
Editorial do Savana, 07-11-2014
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