Tuesday 24 September 2013

Frelimo, Renamo e nós outros

Enquanto a Frelimo e a Renamo se degladeiam, a população, com destaque para a de baixa renda, é a que mais sente os efeitos nefastos do diferendo. E fica a triste ideia de nenhum dos contendores mostrar interesse no povão, do qual se recorrem para sustentar as suas ideias macabras.
CERTA imprensa faz referência à reunião extraordinária da Comissão Política da Frelimo, que teria acontecido semana passada, em Maputo, da qual os seus membros teriam encorajado o governo a prosseguir diálogo com a Renamo, em prol da tranquilidade e paz em Moçambique.
Parece certo que a reunião aconteceu. Ela sucede numa altura em que a tensão política está ao rubro, na véspera de um provável encontro ao mais alto nível do governo e da Renamo, onde em cima da mesa estará um dos pontos candentes do processo negocial entre as partes.
Só pode ser isso que a Comissão Política da Frelimo tenha sido mobilizada de ‘extraodinário’, para a actualização dos items da crise e o desenho de estratégias para os próximos passos a serem dados em encontros bilaterais, precisamente o ponto que diz respeito ao desarmamento da Renamo.
Diz-se que nas reuniões da Comissão Política da Frelimo é onde os assuntos supremos do país são delineados e depois submetidos à execução por parte do governo que, por acaso, é sustentado pela Frelimo. É neste órgão onde os candidatos à Presidência da República são indicados e debatidos ao pormenor, antes de serem submetidos às outras esferas do partido.
Em síntese, é na Comissão Política da Frelimo onde a roupa suja é lavada e posta a secar no estendal. É neste particular que surge a maior virtude da Frelimo, por saber que as coisas podres são abordadas entre as quatro paredes, bem vigiadas, e nunca tratadas na praça pública.
Afinal a Frelimo é responsável pela vida de milhões de moçambicanos, e por isso é sua tarefa estar melhor organizada e apetrechada de valores ímpares.
Mesmo assim, crê-se que o clima dentro do partidão há muito que deixou de ser o mesmo a partir de um determinado momento a esta parte, nomeadamente desde que Joaquim Chissano não concorreu para a sua própria sucessão a Ponta Vermelha. Há uma espécie de facções na Frelimo, situação entretanto que está a ser bem gerida para que não crie turbulência entre os frelimistas apoiantes desta ou daquela figura de proa. É, de resto, aí onde reside a maior diferença entre a Frelimo e os outros partidos africanos, como o ANC da África do Sul, por exemplo.
Parece ficar claro, no entanto, que a actual postura da Renamo face à conjuntura política, social e económica tem tornado a Frelimo um bocadinho mais organizada. Do mesmo modo que a grandeza da Frelimo obrigou uma Renamo melhorada, em termos organizativos.
A Renamo já sabe lavar a sua roupa suja trancada dentro das quatro paredes, o que era impensável há cinco anos atrás, altura em que da Beira podia surgir um discurso desfazado do que era pronunciado na capital, numa autêntica falta de sintonia em termos de comunicação.
Hoje, a Renamo já sabe falar numa única voz e para isso há quadros devidamente credenciados. Pode-se dizer que a Renamo aprendeu bastante com os seus erros e o facto de o Fernando Mazanga agora ser “acompanhado” por uma legião de colegas do partido quando em conferência de imprensa, demonstra uma outra lição tirada da recente experiência de Jerónimo Malagueta.
Deste modo, se a Polícia decidir levar Mazanga para os calaboiços, terá de incluir todos os que tiverem aplaudido, na mesma ocasião e no mesmo local, o pronunciamento do porta-voz.
Por outras palavras, o caso-Malagueta levou a Renamo a adoptar uma postura de solidaderiedade para com o colega chamado a falar à imprensa em nome do partido, por não se tratar de uma iniciativa pessoal, mas da organização.
É forçoso reconhecer que a Renamo assume importância vital na vida dos moçambicanos, juntamente com a Frelimo.
Se em 74 havia quem não acreditasse num governo de transição durável, o mesmo aconteceu com determinadas vozes que não davam muitos anos de vida a uma
Renamo pós-guerra civil.
E o mérito de Afonso Dhlakama reside exactamente por ter conseguido evitar que os seus homens andassem de um lado para o outro a disparar a torto e a direito, sem nenhum controlo. Aliás, foi impressionante o facto de Dhlakama ter declarado fim das atrocidades e quase no mesmo instante, os seus homens terem travado o conflito em todo o território nacional.
Nos tempos que correm, verifica-se um extremar de posições entre a Frelimo e a
Renamo. Em Chibabava, distrito de Sofala onde fica localizada a base da Renamo que acolhe Afonso Dhlakama, o cheiro a pólvora tem sido uma constante. Há quem garante que a guerra é efectiva por aqueles lados.
Dhlakama diz que não é pela divisão dos recursos naturais entre sí e Guebuza, antes por uma distribuição equitativa dos mesmos pela esmagadora maioria dos moçambicanos, atravez de uma gestão transparente dos mesmos.
Recentemente, Esperanças Bias, ministra dos Recursos Minerais, respondeu em público uma proposta da Autoridade Tributária de Moçambique da criação de um
Fundo para onde seriam depositadas receitas provenientes da contribuição das multinacionais. Bias disse,mais ou menos, que a ideiaera de chumbar, dado que odinheiro é para beneficiar as populações moçambicanas.
Nos corredores, a posição governamental não caiu bem. E os críticos limitam-se a encolher os ombros.
No ano passado, o Fundo Monetário Internacional (FMI) lançou a ideia de se começar a distribuir renda pelas populações carenciadas, para que as mesmas comecem a sentir o efeito do enorme “aperto” do cinto a que foram submetidos durante décadas.
O governo terá respondido que não era, ainda, altura de isso se tornar uma realidade. Que era preciso continuar a contar com o “aperto” do cinto dos moçambicanos.
Uma posição que tem sido contrariada por um determinado punhado de moçambicanos que, em vez de diminuir os furos do cinto, tendem a mandar fazer mais furos, para o suporte da barriga-cheia.
E as populações há muito que já se aperceberam do que é correcto e o que não é correcto na gestão da coisa pública. Sobretudo nas cidades e zonas circunvizinhas, há mais gente, hoje, a reclamar determinadas medidas e a dizer NÃO, do que acontecia num passado recente.
E não é por acaso que em eleições autárquicas, a Frelimo precise de redobrar os esforços para conseguir o voto de um eleitorado cadavez a necessitar de outras experiências.
Só que para isso terá dehaver um processo eleitoral verdadeiramente transparente, mas acima de tudo vigiado por todos os partidos concorrentes em igual proporcionalidade. De contrário, os resultados eleitorais não podem garantir justeza do processo.
É aí onde entra a justeza da luta da Renamo no que ao pacote eleitoral diz respeito. Pena que os seus argumentos não tenham, ainda, convencido a Frelimo a recuar…
Em termos de síntese, enquanto a Frelimo e a Renamo se degladeiam, a população moçambicana, com destaque para a de baixa renda, é a que mais sente os efeitos nefastos do diferendo travado lá  em  cima.  E fica a triste ideia de nenhum dos contendores mostrar interesse no povão, do qual se recorre sempre que tende a sustentar as suas ideias macabras e de um grupo restrito.

EXPRESSO – 23.09.2013, citado no Moçambique para todos

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