Sunday, 17 April 2011

Salvar a pátria andando em contramão

O Governo continua a caçar áreas onde possa efectuar cortes no sentido de reduzir as despesas públicas em nome da austeridade. Esta semana, os membros da Comissão Permanente da Assembleia da República decidiram solidarizar-se com o Governo, dispensando a aquisição e importação de viaturas - Mercedes Benz - a que têm direito, por força do regimento da Assembleia da República. O valor orçamentado para o efeito passa a reforçar o orçamento do governo central.

Dizemos, há muito, que devíamos renunciar aos jogos africanos e usar esse dinheiro para outras despesas públicas. Quando sugerimos essas ideias, chamam-nos anti-patriotas. Hoje, somos chamados a salvar a pátria. Não me vai espantar que o Governo, sob sugestão e assessoria do bilderberg FMI, invente novos impostos para o cidadão, em nome de salvação de pátria. E, tal como dizia Henrique Monteiro, colunista do “Expresso”, um semanário português, “nós lá vamos salvar o Estado, pagando mais. Embora todos percebamos que salvar o Estado é acabar com o desperdício, o despesismo, a inutilidade que grassa no Estado. Numa palavra, cortar despesa e não – como mais uma vez é feito – aumentar as receitas à nossa custa”.

Enquanto somos chamados a salvar a pátria por via da austeridade, a inflação não nos perdoa e, consequentemente, o custo de vida agrava-se exponencialmente. Quando pedimos ao governo que tome medidas para nos salvar do sufoco a que estamos sujeitos, os nossos governantes respondem-nos com a retirada do único balão de oxigénio que nos permitia respirar em nome da contenção de despesas públicas. Quer dizer, o Governo está a fazer o contrário do que lhe pedimos.

Enquanto ao nível das nossas famílias aumentamos as medidas de austeridade, devido à inflação, os nossos governantes gastam o dinheiro que nos retiram através de impostos em presidências abertas anuais, nas quais os populares apresentam os mesmos problemas: conflitos de terra, exclusões do orçamento dos “sete milhões”, o chefe de quarteirão ou secretário de bairro que arrancou esposa de um mineiro, entre outros.

Quando referimos que as presidências abertas são inúteis e improdutivas, respondem-nos com discursos violentos de que somos apóstolos de desgraça; quando dizemos que os problemas que são apresentados ao Chefe do Estado devem ser apresentados aos chefe do posto administrativo ou de localidade, aos administrador distrital ou mesmo ao governador provincial, respondem-nos que “esses andam a pré-fabricar discursos que nem convencem a eles que os elaboraram”. Isto leva-nos a concluir que o Chefe do Estado não confia nos governadores provinciais que ele mesmo escolheu e nomeou. De igual modo, os governadores não confiam nos administradores que estão a eles subordinados. Uma cadeia de desconfianças.

Pede-nos que salvemos a pátria do afundanço, numa altura em que mais de 30% do minguante salário do moçambicano é consumido directa e indirectamente por uma pilha de impostos, tais como IVA, IRPC, IRPS, taxas de rádio e de lixo(...). Isto é, em tudo o que compramos, do salário e outros rendimentos, há sempre presente 17% de um senhor chamado IVA; no mesmo salário há sempre presente mais de 3% de um senhor chamado IRPS; em toda a quantidade de energia que o pobre cidadão adquire para o consumo há, também, sempre presentes os senhores IVA, Taxa de Lixo e Taxa de Rádio; Se vives num prédio, há um senhor que se dá pelo nome de IPA; se vai levantar o mesmo salário no banco, há sempre presentes os senhores taxas por cada levantamento; todos querem o mesmo salariozinho. Se tentas fazer biscates, há um senhor chamado IRPC à espera dos 20%, além dos restantes senhores predadores.

Nesta cadeia, o cidadão é a presa fácil. É espécie de uma ovelha no meio de hienas, leões, lobos, leopardos, abutres, entre outros predadores, todos famintos. Sacrificam o pobre cidadão para dar lufadas de ar fresco aos mega-projectos. Deixam de taxar os bancos que apresentam lucros fabulosos anualmente e taxam quem não consegue sobreviver com o salário, o que me levar a acreditar que este país não é para ser habitado por pobres, mas por ricos, com os seus mega-projectos isentos de impostos.

“Qualquer alusão à situação crítica das finanças públicas ou ao nível insuportável que a fiscalidade atingiu junto da imensa minoria que paga a imensa maioria dos impostos é vista como uma ofensa de lesa-majestade: aos ‘direitos adquiridos’, ao Estado social, à Constituição de Abril e aos ‘pais espirituais’ deste iminente colapso nacional”, dizia Miguel Sousa Tavares, outro colunista do “Expresso”.

O que me intriga é que o Governo sabe onde deve efectuar cortes, se quiser salvar a pátria. Com certeza que não é ao cidadão. Sabe que deve reduzir as despesas públicas, através de eliminação de alguns dos 28 ministérios, a curto e médio prazos; das centenas de direcções nacionais; dos 128 secretariados permanentes distritais; dos 11 secretariados provinciais; e banir as assembleias provinciais a médio prazo.

Sabe, igualmente, que deve travar o processo em curso da nova divisão administrativa, que irá culminar com o surgimento de mais de três dezenas de novos distritos, requerendo, para o efeito, a nomeação de um novo aparelho administrativo a nível desses distritos, desde administradores, directores, chefes de postos administrativos e de localidades, secretários permanentes ... e renegociar os mega-projectos, além de reduzir a ociosidade da mão-de obra na função pública.

Lazaro Mabunda, O Pais

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