No Fundo da Consciência
Uma nota de apresentação: O destino quis que eu nascesse aqui em Moçambique. Meu cordão umbilical, as terras de Inhamachafo (Inharrime) deram-no destino merecido, ali na província de Inhambane, aqui no sul. Tive uma infância rural, conheci a cidade aos quinze anos, foi Xai-Xai a minha primeira experiência urbana e passei para a capital em noventa e um. A vontade de me instruir e alargar minha visão do mundo determinou a minha intermitente separação com a terra natal. Formei-me profissionalmente em docência e hoje estou fazendo Mestrado em Antropologia Linguística na maior e mais antiga universidade de Moçambique, finda esta formação penso seriamente em retornar para a terra que me viu nascer, pois ela clama por mim e por tantos outros engolidos pelos feitiços das cidades.
Nesta coluna irei, sempre que puder, reflectir sobre um pouco de tudo de tantas coisas que o nosso país e o mundo vão testemunhando a cada instante, a cada dia. Não sou dono da verdade como ninguém o é, mas tenho o direito de construí-la perante os factos e ideias. É a missão de todos para que o nosso país e mundo sejam cada vez mais justos e de pertença comum.
Nesta minha primeira aparição interessa- me falar um pouco sobre eleições, processo tido como de todos e expoente mais alto da Democracia. Diz-se que não há democracia onde não há eleições livres, justas e transparentes. E estes adjectivos, no meu entender, trazem distorções. Se de facto são livres por que todo um interesse de influenciar o eleitorado de forma particularizada, reunir com grupos empresariais, técnico-profissionais, estudantes, etc.? Se efectivamente são justas por que uns têm acesso de fazer propaganda em todos os locais e outros não? Se são verdadeiramente transparentes por que não há acesso ilimitado a todas as fases do processamento dos dados por parte dos observadores e interessados, neste caso os concorrentes?
Desde o primeiro ano das eleições em Moçambique, 1994, até a esta parte, é ilícito concluir que a tendência do voto ou é étnica ou é político-histórica ou ainda sócio-económica. O Sul sempre votou massivamente na Frelimo e seus candidatos, trata-se do berço da liderança deste partido enquanto movimento de libertação. O Centro e Norte, campo de acesos embates políticos, não é menos verdade que tenderam a votar na oposição, isto é, na Renamo e seus candidatos, berço dos rejeitados e “reaccionários” em tempos de guerra de descolonização. Estes processos, já se viu, dá vantagem aos endinheirados, aos ricos e penaliza os que à priori nada têm. O bem pensar e fazer é obra de bem aventurança, pensa-se assim. Em Moçambique e África continuaremos a assistir tais cenários e reiteradamente continuaremos a condenar os líderes e partidos de oposição por pouco ou nada fazerem para assegurar a alternância governativa. O espaço para estes serem auto sustentáveis é limitado e para enriquecerem é um absurdo. Os membros destes partidos são vulneráveis a tudo, aliciados para desfuncionar suas organizações, para desertarem, para denegrirem a imagem de seus líderes e partidos, comprados e intimidados para não votarem a favor dos seus partidos, em fim, o quê que nós, os países pobres, não fazemos que seja do agrado e vontade daqueles que têm dinheiro? O FMI (Fundo Monetário Internacional) diz e nós fazemos porque está correcto(?), o Ocidente e os EUA dizem e logo concordamos, não questionámos, só executamos. É esta a lógica. O Estado moçambicano, se quer uma nação justa, livre e democraticamente madura, precisa avançar corajosa: ceder espaços para todos prosperarem económica e socialmente, permitir que os trabalhos político-partidários de todos aconteçam em todas as províncias, distritos, localidades, postos administrativos e povoações sem constrangimentos e proporcionar uma educação de qualidade a todos os níveis.
( Rosário M. Gwambe, no Diário do País de 01/12/08 )
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