Tuesday 16 August 2016

Oportunidade soberana para o CSCS agir?



“Diário de Moçambique” contra STV sobre um mesmo caso?

Excesso de zelo, hábitos adquiridos, instruções prévias, o que será afinal o que faz uns dizerem uma coisa e outros uma bem diferente sobre o mesmo facto?
Primeiro, talvez seja necessário dizer que se trata de um ataque a uma carrinha transportando civis, que foi atacada no distrito de Cheringoma.
Do ataque resultaram mortos que foram posteriormente carbonizados.
Dois órgãos de informação difundiram a notícia. Um, o “Diário de Moçambique”, é peremptório a acusar a Renamo do ataque. Outro, a STV, afirma, depois de entrevistar feridos resultantes do ataque, que foram forças governamentais as autoras do ataque.
A STV socorreu-se da entrevista aos sobreviventes, enquanto o “Diário de Moçambique” transcreve o que o porta-voz da PRM revelou.
Esta tragédia humana, que assume características de crime hediondo, foi protagonizada por alguém que, até investigação profunda, continuará nos meandros da dúvida.
Não se pretende levantar celeumas nem alimentar discussões fúteis ou pseudo-académicas em torno desta barbaridade.
Se “contra factos não há argumentos”, o que aconteceu vem mais uma vez demonstrar que na guerra se cometem excessos e que muitas vezes também surgem oportunistas que, aproveitando-se deste ou daquele facto ou factor, utilizam tal guerra como fonte de rendimento.
Fala-se do desaparecimento de dinheiro que os cidadãos mortos traziam. Fala-se da destruição da viatura em que seguiam.
Morreu gente, pelo que tudo indica inocente, num acto dificilmente justificável.
Compatriotas, é a vida de nós todos que está sendo posta em causa por interesses inconfessáveis de pessoas que estão armadas.
Podem até ser oportunistas vestindo a farda deste ou daquele beligerante oficial ou oficioso, mas o que não se pode deixar de dizer é que existem forças militarizadas cometendo actos bárbaros e condenáveis à luz das Convenções Internacionais de Guerra.
Por outro lado, parece indesmentível que existe fraca capacidade de controlo do que as forças beligerantes fazem no terreno.
Dadas as difíceis condições logísticas e a degradação ético-moral na sociedade moçambicana, em que a morte passou a não ser novidade nem motivo de repulsa, é de esperar que existam aproveitamentos macabros nesta guerra civil.
Outra questão que urge aflorar é que motivos políticos levarão muitas vezes a que se esconda a verdade e que se propalem mentiras favorecendo este ou aquele beligerante.
Os voluntários da mentira existem em abundância e está-se revelando perigoso deixá-los à solta.
O episódio reportado de maneira diferente por dois órgãos de imprensa é demonstrativo de que alguma coisa não está bem na comunicação social.
E não é este o momento de apontar o dedo para os presumíveis culpados.
Aqui e agora, queremos dizer que os partidos beligerantes têm a obrigação histórica de interromper este ciclo de violência.
Porque se sabe que, no fim, não haverá vitória militar definitiva, ao estilo das guerras históricas do passado, que tudo, no fim, será alinhavado na mesa de negociações, urge que os mediadores internacionais e a Comissão Mista nomeada pelo Governo e a Renamo redobrem esforços e não descansem enquanto não alcançarem o acordo de paz forte sustentado pela razoabilidade e pela responsabilidade que têm para com os moçambicanos.
Os ciclos de violência despoletados por desacordos políticos são indicativos de que as instituições democráticas são frágeis e partidarizadas.
Abunda algum formalismo democrático como eleições regulares, mas o que sustenta estes exercícios são esquemas de manutenção do poder que descredibilizam vencedores e promovem guerras pós-eleitorais.
Num momento histórico e uma verdadeira encruzilhada para a sobrevivência de Moçambique, importa que não se dê oportunidade às “velhas raposas da guerra” tomarem a iniciativa de ditarem o rumo dos acontecimentos.
Já não existe aquela famosa coesão nem no seio da Frelimo nem nas hostes da Renamo. O que os deputados de nosso Parlamento querem e queriam era tomar posse, como se tem visto, pois só existe unanimidade nas mordomias e benefícios.
Existe fome de sobrevivência básica e uma tendência de transformar a política em ganha-pão.
Face a isto, a opinião de alguns quadrantes sobre a necessidade de envolver mais actores sociopolíticos tem o seu valor, mas é urgente que abandonem posições de defesa do indispensável e que se valorize a busca de soluções consentâneas com a realidade que se vive. Não queremos ver o palco tomado por constitucionalistas ou legalistas que, afinal, sua maioria até é de meia-tigela, pois não tem conseguido dar subsídios válidos para a pacificação do país.
Aproveitar a oportunidade para apelar ao CSCS no sentido de se posicionar com equidistância sobre os assuntos do seu pelouro. Não se precipite a emitir condenações nem censuras a este ou àquele órgão de comunicação social a partir de um prisma claramente partidarizado, embora pareça inócuo.
Não actue nunca sob a batuta do poder político. Não seja mais uma célula do partido no poder. Não utilize uma soma de retórica com teor cosmético e sabor a plástico.
Moçambique deve reerguer-se das actuais convulsões mais maduro e republicano através da reescrita e mudanças fundamentais na sua Constituição, de modo a que as instituições de soberania actuem na base de comandos constitucionais e os seus agentes abracem a cidadania e o primado da lei.
Não será da noite para o dia que teremos agentes do Estado actuando como se espera e deseja, mas é preciso começar em algum ponto.
Também não será amanhã que teremos uma paz e reconciliação efectiva, mas há que começar hoje a batalha para que isso se torne o quotidiano de todos.
Segurança acrescida nas zonas rurais e nas cidades é desejo e direito de todos.
Fim a ciclos dantescos de sequestros e de raptos seguidos de assassinatos.
Fim do reino de terror que se alastra e deixa vítimas inocentes ao serviço de alegadas agendas políticas.
Regresso ao tempo em que se podia dormir com as janelas abertas e se podia caminhar de dia e de noite sem receio de assaltos. Regresso a uma paz como aquela que se viveu após o AGP de Roma, mas agora reforçada por uma CRM que promove a democracia política e económica.
Essa é uma tarefa inadiável de todos e de cada um.
Cortar as linhas de passe ao crime organizado ou desorganizado com base num Governo forte, interventivo, activo em todos os níveis.
Trazer a meritocracia para as instituições estatais e eliminar com rigor o nepotismo e sistemas subjacentes.
Reconstruir o tecido social e afugentar os vírus da corrupção através de uma moralização social permanente.
O texto pode parecer uma miscelânea, mas contém assuntos conexos de abordagem necessária na actual conjuntura.


(Noé Nhantumbo)

CANALMOZ – 16.08.2016, no Moçambique para todos

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