Os cidadãos e as organizações privadas não vinculados ao Estado tentam, mais uma vez, este sábado (27), persuadir o Governo e a Renamo, através de uma marcha pacífica em Maputo, a porem termo às suas desinteligências políticas no diálogo em curso e garantir cedências de ambas as partes, no sentido de os moçambicanos voltarem a desfrutar da paz de que estão desprovidos há anos. O momento servirá, também, para lembrar aos dois beligerantes que, ao contrário do discurso das elites do partido/Estado, o afrouxamento da vida do povo resulta da guerra sem fim à vista e das dívidas públicas secretamente contraídas no Executivo do antigo Presidente da República, Armando Guebuza.
A caminhada, com início previsto para as 07h30 (contração será meia hora antes) na estátua Eduardo Mondlane e com fim na Praça da Independência, é realizada sob os auspícios do Parlamento Juvenil (PJ), um dos organismos da sociedade civil que reclamam participação no (interminável) diálogo político entre o Governo e o maior partido da oposição no país.
Em Moçambique, as marchas não têm sido concorridas quanto se espera. Em 2013, por exemplo, as organizações da sociedade civil, desistiram de marchar pacificamente em Maputo, no dia 25 de Junho – dia da independência nacional – contra a guerra acabava de eclodir, devido à fraca participação de cidadãos.
Desde essa altura a esta parte, apesar do aparente aumento da insegurança, sobretudo nos centros urbanos, e da radicalização de posições entre o Governo e a Renamo, o cenário pouco mudou. O grosso dos moçambicanos parece optar pelo silêncio, murmura pelos cantos e manda passear a tudo e a todos quando é indispensável sair à rua, tornando, deste modo, o Estado das coisas caóticas como normal.
Face a esta situação, que em parte sugere que as pessoas pouco acreditam que as suas vozes juntas podem transformar o que para a minoria que comanda os destinos da nação é conveniente, Salomão Muchanga, presidente daquela agremiação, disse que a “apatia e o silêncio” não devem tomar conta da população. “Se repudiamos a guerra entre irmãos, todos devemos ir à rua e pressionar ao estado a fazer avançar o diálogo político”.
Para este líder juvenil, a paz de que o Chefe de Estado, Filipe Nyusi, os membros do seu Governo e correligionários falam, sem entanto torná-la real, “não é monopólio de ninguém”. Por isso, não deve ser privatizada. Num outro diapasão, Salomão Muchanga considerou que é um contrassenso que as partes em conversações na capital do país, e/ou que aqueles que até enchem a boca a falar de uma paz inexistente “apertem as mãos e rasguem sorrisos”, enquanto nos distritos as suas lideranças proferem discursos de ódio” profundo e as suas forças militares “enterram a juventude, a quem chamam futuro da nação”.
Direitos cada vez mais empobrecidos
Num outro desenvolvimento, o presidente do PJ, que falava quarta-feira (24) em Maputo, disse que não importa a proveniência/simpatia político-partidária de cada pessoa, se “a nossa prioridade é a paz, a inclusão política e a estabilidade económico-social”, é preciso que cada um vá marchar e mostrar a sua repulsão relativamente à situação do país.
Muchanga instou o povo a fazer-se à rua, de forma ordeira, ciente das vidas já perdidas por causa da guerra, a pensar nas crianças e nos jovens fora da escola”, no metical cada vez mais enfraquecido, porque o dinheiro foi supostamente canalizado para a “compra de material bélico”. E recordemos de que “temos os direitos dos cidadãos cada vez mais empobrecidos, enquanto os políticos e os filhos de políticos obesos conduzem os últimos audi’s e mercedes”.
Levantem-se!...
Por sua vez, Alice Mabota, presidente da Liga dos Direitos Humanos (LDH), que em Junho último esteve envolvida numa outra caminhada igualmente pouco concorrida, que visava exprimir a insatisfação do citadinos com a crise política e económica e falta de segurança, convidou os moçambicanos a perderem o medo da Polícia que, na sua óptica, pode impedir que as pessoas marchar livremente.
“Vamos mostrar a nossa indignação” e passar a mensagem de que “a vida está difícil. Em Tete, o quilo de açúcar custa 85 meticais. Isto deve-se à guerra e às dívidas [ocultas]”, disse ela.
De acordo com a dirigente daquela agremiação, hoje, as coisas parecem estar no caminho certo, porque “estamos nas cidades”, mas quando a situação difícil a que o país está mergulhado começar a ter impacto restritivo “nos nossos bolsos, vamos sentir que é necessário alguém levantar-se”, para, de acordo com Salomão Muchanga, dizer: “parem com a guerra, o povo já não aguenta”.
Num outro desenvolvimento, Alice Mabota disse que é inútil achar que as pessoas que vão à manifestação pacífica este sábado podem representar a todo povo, sem cada um estar lá para mostrar a sua indignação com a forma como Moçambique é conduzido. “Não fazendo a marcha, chegará o dia em que vai parecer tudo normal” e as camadas desfavorecidas irão “sentir o preço da guerra e da dívida” pública, rematou Alice.