Na senda da busca da paz revelam-se intenções jamais abandonadas…
Por: Noé Nhantumbo
Por vezes alguns moçambicanos têm a particularidade de surpreender com o seu verbo viperino.
Quem se der a paciência de ler o jornal dominical cá da terra tem muitas vezes a oportunidade de chocar com opiniões de coronéis e generais da reserva de escolas militares umas conhecidas e outras desconhecidas.
Pressupõem-se que oficiais militares superiores sejam exímios em estratégia e interpretação de factos.
A leitura do texto sobre a eliminação do terrorismo, da autoria de Sérgio Viera, coronel na reserva e antigo chefe do SNASP, é necessária ao mesmo tempo que preocupante. Trata-se, na essência, de um incentivo para a aplicação da tese angolana, abater o líder da oposição e depois acomodar os elementos da sua cúpula através de significativos pacotes financeiros e outros.
Cada um tem a liberdade de proferir suas opiniões.
Eu, por exemplo, julgo legítimo comparar tal declaração a uma acusação de incitação à violência imputada ao brigadeiro Malagueta, da Renamo. Ainda bem para os moçambicanos amantes da paz que certas figuras do regime de Samora Machel não estão mais exercendo cargos de poder na esfera da defesa e segurança nacional, pois teríamos as contas completamente trocadas.
Existe a tendência de esquecer o tempo que passou e alguns moçambicanos, de ânimo leve, podem ser levados a enveredar por caminhos espinhosos de consequências dolorosas. Aquilo que não se experimentou por vezes é negligenciado com relativa facilidade.
Aquela tese e outras que advogam a violência para resolver a actual crise no país expressam profundo receio de que a normalização governativa e a consequente democracia possam abrir caminho para que certas pessoas enfrentem processos políticos ou judiciais. Entende-se que gente que sempre se julgou superior e coberta de conhecimento infalível esteja preocupada com a paridade nos órgãos eleitorais.
Outros escribas e porta-vozes avançam por diapasão diferente mas na essência visando o mesmo fim que é a manutenção do poder a qualquer custo.
Quando se fala de “falcões de guerra” não é figurativo, pois eles existem e esperam a sua oportunidade para actuarem.
Quem quer paz discute abertamente tudo mesmo que isso seja politicamente comprometedor. Os moçambicanos não querem voltar aos tempos do estado policial em que a liberdade de expressão, de movimento e seus direitos eram ignorados pelas autoridades. Não queremos mais campos de reeducação como aventou num passado recente Joaquim Chissano.
Não queremos Moçambique privatizado pela elite político-governamental.
A essência do combate histórico dos moçambicanos tem sido a independência política e económica. Titulares de cátedras, doutores e demais intelectuais ou a isso aspirantes não possuem por sua condição académica direitos superiores aos outros.
Do mesmo modo que a filiação partidária, confissão religiosa, origem ética ou raciais não constituem factores de diferenciação.
Não continuem a enganar os moçambicanos com historietas de que é necessário que esperem para usufruir de benefícios enquanto as contas bancárias de alguns engordam todos os dias através de suas participações financeiras em joint-ventures. “Capitalistas de assinatura” que disponibilizam autorizações para a exploração de recursos beneficiam-se das descobertas de recursos minerais em Moçambique e não amanhã.
O capital internacional actuando no país sabe que tem de lubrificar os processos e isso faz-se à custa de transferências bancárias para determinadas contas, dos detentores do poder, ou envelopes recheados de divisas. Ou não é assim que se comercializa ao desbarato com os recursos minerais de Moçambique?
Querer embrulhar os moçambicanos e fazer crer que a razão só está de se seu lado é um exercício que lesa a pátria.
Ninguém se iluda sobre o tipo ou grau de consequências que uma acção militar possa ter. Com ou sem intervenção de chamados nos outros tempos de “aliados naturais” teremos uma violência em escalada espiral que só irá beneficiar coronéis e generais…
Muito negócio será feito e prioridades alteradas em favor de uma antes chamada “economia de guerra”.
Aqueles que advogam a guerra jamais estiveram fisicamente envolvidos. Teorizar a guerra e travar combates nos gabinetes difere profundamente da presença no terreno real.
O regresso dos coronéis ou o que eles desejam é incompatível com a vontade da maioria. O embrutecimento de largos segmentos da sociedade através de lavagens cerebrais e bombardeamento ideológico não encontra sintonia nos dias de hoje.
As brechas e clivagens em evidência no seio da Frelimo tem permitido manter os falcões sob controlo e com a pressão real exercida pelos partidos políticos da oposição a política jamais será a mesma em Moçambique.
Evidentemente que as manias e manigância de alguns integrantes da elite política moçambicana se sentem profundamente afectados com o rumo dos acontecimentos.
Quem estava habituado a “dar cartas”, a ter tratamento preferencial e a utilizar o estatuto de membro de Frelimo, antigo combatente, intelectual, governante para adquirir vantagens sente-se frustrado.
Parece que Joaquim Chissano no processo de consolidação de seu poder afastou dirigentes governamentais que pensavam que tinham o futuro assegurado e lugar reservado no Monumento dos Heróis.
Armando Guebuza com sua visão mercantilista e mentalidade de empresário afinada terá afastado ainda mais o que ele considerava de empecilhos a sua agenda de acumulação.
Um golpe fulminante terá sido a exoneração de Sérgio Viera, do Gabinete
Plano do Zambeze e sua consequente extinção. Isso trouxe repercussões não só nos discursos posteriores deste mas de uma série de pessoas que se sentiu atingida.
Convenhamos que um ataque a cargas indigestas de presunção personificado por pessoas que poucos resultados práticos trouxeram ao país era necessário independentemente da motivação.
Outros “camaradas” sentiram-se feridos de morte aquando do último congresso da Frelimo. Agora está aberto o campo da confrontação interna que em certa medida prejudica a adopção de uma estratégia consensual deste partido no diálogo de seu governo com a Renamo.
Os repetidores e lambebotas pululando na comunicação social servem uma agenda estomacal declamando as posições de chefias que preferem o silêncio do que escorregarem verbalmente.
Sempre que abrem a boca deixam sair alguns vermes que minam a imagem de maneira cada vez mais forte.
Escolher um comunicador da craveira do actual porta-voz da PR é um paliativo que não resolve as questões de sua responsabilidade.
Decidir entre a guerra e a paz, entre a sudanização ou a angolanização, entre a costa marfinização e um GUN cabe ao PR e aos seus conselheiros.
Felizmente os defensores de algumas teses violentas como via de solução dos diferendos actuais só se fazem ouvir através da Imprensa subserviente ao regime. O espaço que ainda gozam ou possuem é como que recompensa histórica de papéis ou funções desempenhados mas estão mergulhados em “pântanos periféricos” e seu acesso aos círculos do poder já não existe. Seu brilho passou como ferro com ferrugem.
Senão já teríamos guerra aberta…