Desmentindo todos aqueles que a julgavam morta e enterrada, debaixo do peso do liberalismo triunfante, a velha Luta de Classes resolveu sair à rua para mostrar que está viva e de saúde. Na terça-feira tivemos uma demonstração de
força do Poder Popular. Muito misturado com oportunismos e outros vandalismos mas, claramente, o poder dos eternamente esquecidos, humilhados e ofendidos.
A partir de quarta-feira passámos a ter a demonstração de força do patronato, através da greve dos donos dos chapas. Greve que tem um único significado: Ou vocês aceitam as nossas posições ou instalamos o caos na cidade não transportando ninguém para os seus locais de trabalho.
E, entre estas duas posições, temos um governo que não pode ter o caos nas ruas (já se verificou que as forças de segurança não estão capazes de lidar com uma situação como a de terça-feira) mas que também não pode contrariar os empresários privados dos transportes, muitos deles dirigentes e apoiantes do partido Frelimo.
Nas suas declarações públicas o Ministro dos Transportes mostra sempre que o seu coração está do lado do sector privado. E talvez esteja aí precisamente o nó do problema.
Numa situação como esta o governo procura, imediatamente, encontrar formas alternativas de transportar as pessoas para os seus locais de trabalho. Coloca na rua os camiões militares, mobiliza transportes de outras organizações, faz qualquer coisa.
No nosso caso, no entanto, o Governo está a deixar a população à mercê da chantagem dos chapeiros. Talvez à espera que as longas caminhadas amoleçam a resolução dos protestantes.
Talvez por coincidência, ou talvez não, as bombas de combustivel estão secas de gasolina. Isto quer dizer que mesmo aqueles que ainda se podiam movimentar em viaturas privadas ficam cada vez mais à mercê dos chapas.
Isto para não falarmos da quase inexistência de transportes públicos. A empresa dos TPM tem uma frota muito pequena para o tamanho da cidade e, daquelas medidas como os comboios suburbanos, há muito não ouço falar.
Ora tudo isto faz com que pensemos que, mesmo nos países de maior predomínio liberal, há áreas, de grande sensibilidade, que são mantidas sempre sob o controlo do Estado. E os transportes são uma delas, na medida em que, sem transportes, a economia de um país fica paralizada e ninguém responsavel pode permitir que isso aconteça. A economia de uma cidade como é o conjunto
Maputo-Matola não pode ser deixada totalmente nas mãos de uma classe de proprietários de chapas que, antes do interesse nacional, olham para o seu interesse pessoal.
Para isso serve o poder moderador do Estado, quando este o tem. Quando não tem, como parece ser o caso, ficamos reféns.
A presente crise, que já se vinha a anunciar há muito, vai mostrar que capacidade tem o nosso executivo para responder a uma situação que é grave e sem soluções óbvias.
De claro mau gosto a notícia da partida do Chefe de Estado (e do Governo, lembre-se) para as zonas das cheias neste momento. O Executivo tem dado a cara apenas através do Ministro dos Transportes. E mesmo este numa posição de fraqueza no meio das duas forças em confronto.
Mas a crise de terça-feira ultrapassou em muito a àrea dos transportes. Passou a ser uma crise de segurança pública e de ameaça forte à economia.
Era preciso que a mais alto nível nos viessem dizer em que pé estão as coisas. Senão, vamos pensar que o Governo se demitiu das suas responsabilidades e o país está entregue a si próprio.
Na terça feira um amigo, com formação militar, comentava que não se viu, no céu de Maputo, um helicóptero a sobrevoar as zonas de conflito para saber para onde enviar reforços. Vão-me dizer que as nossas forças de segurança não possuem helis.
Será que a delegação presidencial às cheias também não leva os habituais helicopteros?
( Artigo da autoria de Machado da Graça, retirado, com a devida vénia, do “Correio da Manhã”, de 08-02-08 ).
2 comments:
Esta postagem é original. Está em branco, não resisti, vim deixar ficar um comentário. Boa semana José!
Bjh
Se calhar está em branco porque tudo que poderia ser dito sobre o assunto não caberia lá!
Tudo do melhor para si!
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