CIP entende que Kroll forneceu informação suficiente para a PGR prender e confiscar, imediatamente, os bens das pessoas implicadas
Depois de ler o sumário executivo do relatório de auditoria internacional e independente às dívidas ocultas da Ematum, Proindicus e MAM, o Centro de Integridade Pública (CIP) concluiu que a consultora Kroll forneceu informação suficiente para a Procuradoria-Geral da República (PGR) prender e confiscar, imediatamente, os bens das pessoas implicadas, de forma preventiva. Falando, esta semana, ao “O País Económico”, Adriano Nuvunga, director do CIP, uma organização da sociedade civil moçambicana, justificou a posição com o facto de a auditoria ter detectado despesas injustificadas de mais de 1 bilião de dólares norte-americanos.
O CIP atribui parte da culpa pela recolha incompleta de informações para esclarecer as dívidas ocultas à Procuradoria-Geral da República e ao Chefe de Estado. Nuvunga diz que o Ministério Público não teve uma boa liderança no processo de elaboração da auditoria e acusa a PGR de falta de interesse em assegurar o esclarecimento efectivo do caso. Em quatro pontos, o nosso jornal apresenta abaixo o posicionamento do CIP relativo ao sumário executivo do relatório da auditoria elaborado pela Kroll.
PGR tem elementos para agir imediatamente
“O relatório da Kroll oferece elementos bastantes para o Ministério Público agir de forma contundente e muito rapidamente, em termos de prisão e aresto, de forma preventiva, dos bens das pessoas implicadas. A base para isso é o facto de se ter feito uma justificação de pouco mais de um bilião de dólares com base em lista de despesas sem nenhum sustento do processo de procurement, sem facturas, sem recibos. É problemático quando isso é possível. Em termos mais específicos, estamos a falar dos 500 milhões de dólares que são dados como não justificados e, também, os 713 milhões de dólares que terão sido desviados em esquemas de sobrefacturação das mercadorias. É preciso confiscar o património das pessoas, para que não seja espalhado ou para que não se possa dispersar o património. Isso permite que, caso as pessoas sejam processadas, julgadas e condenadas, haja património para ressarcir o Estado. Mas, neste momento, é tudo no sentido preventivo, tanto as prisões como o aresto de bens.”
Papel do Presidente da República no processo
“Há que destacar que esta auditoria resultou de um acordo entre o Presidente da República e o Fundo Monetário Internacional. O Presidente da República é superior hierárquico do indivíduo A que se recusou a prestar informações e, também, tal e qual sabemos, não houve acção por parte do Chefe de Estado para colocar o indivíduo a prestar informações. Aqui a pergunta é: será que o SISE tem leis privativas de valor superior ao da Constituição da República de Moçambique? Essa é uma questão que fica sem esclarecimento. Caberá, de agora em diante, ao Presidente da República, como a pessoa que nomeia o procurador-geral da República, prever quais são os passos subsequentes. Mas há que considerar que o Presidente da República, na altura dos factos, era o ministro da Defesa. Há que, também, ter em conta estes aspectos para perceber o quão terá suficiente incentivo estrutural para ver este assunto ser esclarecido adequadamente.”
Falta informação sobre proveniência de 70 milhões
“Uma outra questão bastante perturbadora nisto tudo é o facto de, na página 17, se indicar que não se obteve informação da proveniência dos cerca de 70 milhões de dólares que se utilizaram para a entrada dos accionistas, alegadamente porque não houve justificação judicial. Ora, a autorização judicial é dada por um juiz de instrução e, no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, há cinco juízes de instrução que trabalham em turnos, 24 horas por dia, obrigados por lei a assim fazer. E, da Procuradoria-Geral da República ao Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, são apenas cinco minutos a pé. Isto quer dizer que era possível obter esta informação em não mais do que uma hora. Portanto, se não houve autorização judicial, na nossa opinião, é que não houve interesse por parte da PGR em obter essa autorização judicial. Por estes elementos, para nós, fica claro que não houve interesse por parte da PGR em assegurar que se esclarecesse adequadamente este processo.”
Faltou boa liderança do Ministério Público
“Em termos do relatório e da auditoria realizada, há que destacar o facto de, para nós, o Ministério Público não ter realizado uma liderança adequada. Senão vejamos, na página 4 do relatório, está dito que a liderança da auditoria estava a cargo do Ministério Público e cabia a esta instituição, entre outros aspectos, indicar as pessoas relevantes para serem ouvidas. Na página 11 do sumário do relatório de auditoria dos empréstimos da Ematum, Proindicus e MAM, está dito que o indivíduo A contactado pela Kroll recusou-se a fornecer definitivamente informações, alegando que se tratava de conteúdos confidenciais. Se a liderança do processo estava com a PGR e foi a Procuradoria-Geral da República que indicou as pessoas que deviam ser ouvidas, como foi possível que esta instituição tenha tolerado esta situação de o indivíduo A não fornecer informações em definitivo. É que, em situação de prossecução penal, o Ministério Público não fica à espera da vontade das pessoas envolvidas, tem que agir e, tanto quanto a gente sabe, o Ministério Público não fez nada.”