Por: António A. S. Kwaria
Tenho pena daqueles
que pensam que lançando conspiração contra a Renamo estarão a resolver os
verdadeiros problemas de que ela se serve para obrigar o governo da Frelimo a
ir para as conversações.
Quando a Renamo
fala de distribuição de riqueza é porque ela sabe que a percepção de muitos
moçambicanos (evito fazer cálculos) é de que a riqueza está concentrada nas
mãos da Frelimo. Que na sua maioria, são os membros da Frelimo os propritários
dos grandes empreendimentos ou investimentos dos recursos
naturais e infraestruturas adjacentes (como diz o Gito Katawala). São os membros
da Frelimo ou simplesmente a Frelimo os acionistas de até das empresas
estrangeiras. E desde há muito que já se alertou que este problema pode criar
instabilidade no país, mas a resposta tem sido de chamar de agitador
profissional a quem chama atenção.
Quando
a Renamo reivindica a despartidarização das instituições públicas é porque ela
explora, isto é, capitaliza, o sentimento de muitos moçambicanos e a percepção
de que a Frelimo serve-se destas instituições como se de seu celeiro fosse. Que
ela serve-se das instituições públicas para coagir os funcionários a serem
membros, a pagarem quotas ou forçar contribuições ou mesmo para essas
instituições e empresas públicas canalizarem parte dos seus lucros ao partido
Frelimo.
Quando
a Renamo fala de falta de transparência nos órgãos eleitorais, de falsos
membros da sociedade civil porque são um prolongamento da Frelimo, é porque é
óbvio, é uma realidade reconhecida por muitos moçambicanos, incluindo os
próprios membros da Frelimo. Estes últimos, se calam nesse assunto ou dizem
isto e aquilo, mas reconhecendo na verdade que os órgãos eleitorais foram
assaltados pela Frelimo. Muitos sabem que é através disso, que há dedadas,
enchimento das urnas, recusa das queixas dos membros da mesa e outros actos
fraudulentos, a permissão à intimidação da polícia. Mas o pior é que a situação
vai de mal para pior, tendo em conta aquilo que está acontecendo.
Quando
a Renamo diz que a FIR é uma força particular da Frelimo é porque ela capitaliza
a percepção de muitos moçambicanos que a Frelimo serve-se da FIR para reprimir e
intimidar a todos da oposição e apartidários que reivindicam os seus direitos.
Esta
actual liderança da Frelimo não tem estratégia para conter as exigências da
Renamo ou simplesmente o que a Renamo capitaliza. Eu já imagino que se fosse
esta nos anos 80, podia ter conduzido o país à situação semelhante a de Somália
ou outros países africanos que nunca alcançam a paz. Só vejam em que a
liderança investe como estratégia para paz e estabilização política. Usar a
IURD para aquelas celebrações que vimos no ano passado, não é nenhuma
estratégia. Usar a OJM ou OMM para propalar o falso desejo à paz, não é nenhuma
estratégia. Usar membros da Frelimo, os que usurpam bens públicos para desviar
o focus, não é estratégia nenhuma. Usar a FIR para reprimir as reivindições legítimas,
não é nenhuma estratégia para conter o descontentamento de muitos moçambicanos
que não se beneficiam do sistema de exclusão. Essas reivindicações continuarão
a existir mesmo que o governo da Frelimo, à maneira de sempre, atenda à Renamo.
Falo de o governo da Frelimo comprar o presidente da Renamo para se calar.
Até
Samora Machel tinha alguma estratégia para conter o descontentamente popular
ora capitalizado pela Renamo. Quem se lembra de certas iniciativas de Samora
Machel saberá que ele tinha alguma estratégia apesar de aquilo não ter sido
suficiente e ter sido muitíssimo tarde. Provavelmente também será tarde quando
a actual liderança da Frelimo começar com alguma estratégia. O tal perdão aos
“compromentidos”, a nomeação de comandantes militares provinciais em 1983, e
novos governadores ou a movimentação destes, em 1984, o Acordo de Nkomati, as
reformas económicas, foram algumas das estratégias para conter a Renamo. Ele
tentava resolver os problemas como resposta às reindicações da Renamo.
Joaquim
Chissano continuou com a estratégia e ampliou muito mais. Foi Joaquim Chissano
que restabeleceu, nem que lentamente, as autoridades tradicionais, se não estou
em erro em 1987. Nas eleições locais desse ano, houve contacto com as
autoridades tradicionais. Também elementos do comando e de outras forças do
exército colonial considerados pela Frelimo como comprometidos, foram
incorporados nas FALM. Conheci duas pessoas em Nacala-Porto nessas condições.
Chissano desactivou as aldeias comunais que eram um dos pretextos da Renamo,
capitalizando o descontemento de muitos camponeses. No auge de conter às exigências
Renamo e adequar ao que se passava no mundo, Chissano mudou a Constituição da
República para uma nova que na prática incluia a maioria das reivindicações da
Renamo e que na verdade, muitos moçambicanos já tomavam a consciência que eram
legítimas. Assim, o governo da Frelimo foi às conversações com uma estratégia
bem segura e convincente. Chissano já havia resolvido a maior parte das
reivindicações que não eram apenas da Renamo, mas consciente que ela explorava
o sentimento de muitos moçambicanos. Chissano hoje se orgulha das fintas, claro
porque na verdade ele foi muito estratega para terminar com a guerra. Ainda,
Chissano, exactamente em momento muito sensível de regresso à guerra, Joaquim
Chissano soube gerir a paz. Parece-me que também houve alguma facilitação para
que membros seniores da Renamo tivessem empreendimentos. No governo Chissano haviam
directores de escolas, de instituições de saúde e outras instituições públicas
moçambicanos não membros da Frelimo. Aliás, lembro-me que numa reunião de
quadros da Frelimo na Beira, Chissano reprovou a ideia de excluir quem não
fosse da Frelimo. Ainda, segundo o próprio líder da Renamo, eles se encontravam
sempre que precisassem. Aliás, os dois já haviam se encontrado durante a guerra
e no período do decurso das conversações de Roma.
A
minha pergunta é sobre o que Armando Guebuza faz como estratégia para a paz?
Quanta coisa o governo de Guebuza já poderia ter resolvido sem precisar de
enquadrar nas conversações com a Renamo e muito menos esperar por elas? Não
será falta de estratégia, quando Guebuza através da sua delegação quer provas
da Renamo sobre a partidarização das instituições públicas, por exemplo? Quem
nega a partidarização das instituições públicas que não sejam membros da
Frelimo que se beneficiam deste acto nocivo à paz, aos princípios democráticos,
à convivência pacífica? Não será falta de estratégia, quando Armando Guebuza
não entende que o assalto e de forma mais clara que nunca de órgãos eleitorais
pela Frelimo só vem dar razão à Renamo? Não é falta de estratégia, quando
Guebuza não entende que quando os grandes empreendimentos ou investimentos
pertencem só a membros do seu partido e a estrangeiros torna-se a verdadeira
ameaça à paz?
Na
minha opinião, o único problema que particularmente é da Renamo e que precisa
de ser tratado nos encontros dos dois ex-beligerantes é a parte do acordo
militar no AGP, para tratarem dos oficiais vindos da Renamo que se queixam em
terem sido forçados a irem à reserva e dos guardas dos altos dirigentes da Renamo.
O resto são reivindicações da maioria dos moçambicanos e que o governo do dia tem
a obrigação de dar solução sem passar pelas conversações.
1 comment:
Estimado e respeitado Sr. António A. S. Kwaria, subscrevo em 1000% o seu texto! Isto e' que e' analise de um intelectual UTIL a socoiedade! say: well done! Infelizmente, e como bem disse o Prof.Dr. Manuel de Araujo, a lideranca da Frelimo tem um grande defice auditivo! Abraco
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