Saturday, 10 May 2014

De que estamos à espera?

Apesar do peso que desabou sobre nós – com o conflito armado – continuamos à espera, desde fora por intervenção divina, que alguém venha e resolva os nossos problemas. Primeiro, recusamo-nos a aceitar que estávamos em guerra; quando esta era evidente, refugiámo-nos na afirmação de que estávamos melhor do que nunca. E agora que nem este consolo nos chega, optamos pelo silêncio, por não fazer nada, esperando ingenuamente que o temporal amaine por si só. E esta atitude não só é praticada pelos cães do regime, vulgo G-40, mas também por muito boa gente.
Há, de um lado, os que aplaudem as acções da Renamo e celebram as mortes do lado das Forças Armadas. Rejubilam por cada corpo anónimo que tomba enquanto os que ‘dialogam’ tomam chá de camomila e vinho verde no Centro de Conferências Joaquim Chissano. Outros há que optam por ridicularizar Afonso Dhlakama e preferem dizer que não há conflito armado, mas sim um pequeno incidente numa zona circunscrita do país.
Ignoram os corpos dos inocentes que tombam, os pais de família que deixam rebentos sem eira nem beira nesta feira das vaidades que se chama Moçambique. O mais grave é que em plena tormenta a Frelimo recorre aos meios do Estado para apresentar o seu candidato ou contribuir para fortalecer a intransigência da Renamo com a recolha de cartões de eleitores na Função Pública.
Em vez de propor medidas para despartidarizar o Estado, opta por oferecer um espectáculo gratuito da sua relação espúria com o poder. Sobre isso ninguém diz nada com excepção dos G-40, indivíduos com espinha dorsal flexível, que correm para justificar o injustificável e deitam-se, desse modo, ao comprido na esteira do ridículo. E, os activistas sociais, num discurso que já passou da moda, declaram com solenidade e de forma simplista que o problema do país é a própria Frelimo.
Aqui, ademais da crise dos demais; temos a nossa própria, perdemos produtividade – se é que algum dia tivemos – num momento em que apenas esta nos pode tirar do aguaceiro que se abriu aos nossos pés. O que é feito do camponês que reside no teatro da guerra? Isso, diga-se, não interessa. Preocupamo-nos com o recenseamento de Dhlakama e a sua saúde, mas somos incapazes de questionar uns e outros para onde caminhamos.
Esquecemo-nos de perguntar, com persistência, se não é mas importante vestir a camisola do país e largar, pelo menos uma vez, o fundamentalismo partidário. A paridade, cremos, não dá comida. Coloca, isso sim, a Renamo numa posição de força, mas não nos liberta de forma alguma da pobreza absoluta. Não é pela paridade que será mais fácil dar à luz e que os cuidados primários de saúde serão melhores. Devemos discordar, todos, de um país que seja da Frelimo e da Renamo.
A nossa possibilidade de abraçar o sucesso passa por isso. Não é necessário tornar exuberante a guerra, nem nos levará a lugar algum a linguagem da desesperança e da impotência, a criação de heróis evasivos e gigantes com pernas de barro. Há margem, pequena mas há, para lutar, consolidar posições, limitar o impacto negativo e preparar-se para um Estado entregue à vontade dos cidadãos.
Mas é preciso fazer algo. Nem que seja testemunhal, mas que transmita uma mensagem de confiança no futuro, que anime o povo, que nos responsabilize a todos do êxito de um projecto regenerador da nossa moçambicanidade. Democraticamente, é um compromisso que abrange a todos desde que o Estado deixe de ser uma célula da Frelimo e a Renamo um braço armado apontado ao coração de todos nós.
No Centro de Conferências Joaquim Chissano, a CNE ganhou nova roupagem através de acordos entre partidos desavindos. Esse é um grande problema para todos nós. A CNE não devia, de forma alguma, ser o rosto das vontades partidárias, mas a expressão máxima da integridade. Ainda assim tal significa que há uma base para o consenso e um diagnóstico que se partilha.
Só falta implementar e incluir todos os cidadãos na discussão das nossas prioridades, e nisso não podem falhar nem os proponentes nem os que lhes apoiaram e nem os moçambicanos quando for a vez de votar. Uns e outros conhecem as suas discrepâncias, as suas importantes diferenças noutros campos, mas não querem caminhar para um ideal comum e que vincule a todos nós.
O que esperamos para colocar o país acima das nossas diferenças? Se a guerra crescer, todos os problemas terão maior dimensão. Este é o momento da responsabilidade, do discurso de Estado. Agora é preciso assumir o fim da crise político-militar como uma prioridade e libertar o Estado do calabouço onde a Frelimo o prendeu. De que estamos à espera?



Editorial, A Verdade!

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