Os mortos de Montepuez e os de Nhamatanda também são moçambicanos.
Beira (Canalmoz) – Há alguns escribas e comunicadores sociais, analistas e pseudo-analistas batendo-se, nos palcos que lhes são pomposamente facultados, contra a morte de inocentes neste martirizado país.
Em mais uma guerra que acumula vítimas em número crescente e assustador, alguns procuram ignorar qual é génese do actual conflito. Se antes gostavam de se referir a uma suposta guerra de destabilização, agora esperemos que criem outro termo para qualificar o que está acontecendo nos dias que correm.
Aqueles que algum dia disseram que na Frelimo era cultura abater contra-revolucionários e reaccionários foram, em certa medida, claros na tentativa de esclarecimento dos mortos durante a luta anticolonial e logo após a independência nacional. Não concordamos que alguém se arvore o direito de tirar a vida a outro segundo critérios de avaliação e obediência a uma suposta doutrina política. Terá sido uma era em que uns detentores do poder se sentiram ameaçados e inseguros quanto ao rumo dos acontecimentos se uma oposição política fosse tolerada? Terá sido uma decisão decorrente de aconselhamento e obediência a instrutores externos que queriam assim limpar o campo para a sua implantação? Teremos tido vítimas moçambicanas como resultado do cumprimento de mentores externos que dirigiam superiormente a luta no quadro duma guerra-fria? Mas, qualquer que seja a interpretação, houve moçambicanos que foram silenciados duma maneira torpe, criminosa e sanguinária.
A barbárie política e o assassinato político não terminaram, pois logo eclodiu uma guerra civil de duração longa. As guerras são sangrentas e consomem vidas de tropas, mas também de inocentes, que são considerados muitas vezes como danos colaterais.
O que é de estranhar e recusar é que se crie uma distinção entre os mortos de uns e de outros. Os beligerantes não disparam “balas de açúcar”.
No caso vertente, e numa completa manifestação de intolerância, vimos processos eleitorais terminando na morte por asfixia de militantes da Renamo. Da maioria dos analistas e intelectuais de peso na praça, não se viu ou ouviu nada contra aqueles macabros actos.
No lugar de se adoptarem medidas enérgicas e legais contra quem comprometeu a segurança nacional e a convivência política no país, vimos alguns responsáveis governamentais afectos ao problema promovidos e sendo transferidos para outras funções em outras províncias. Deu-se de maneira aberta um sinal perigoso de se podia atentar contra os direitos humanos das pessoas sem consequências de maior, desde que isso fosse feito em prole dos interesses do partido no poder.
Na medida em que o Governo do dia não foi capaz de implementar na íntegra o AGP, foram-se acumulando as raízes da discórdia, o que culminou com o rebentar das hostilidades. Um golpe supostamente de surpresa, visando desmantelar reuniões políticas da Renamo nas suas sedes, acordou e reactivou toda uma estrutura militar que se encontrava aparentemente adormecida. Uma tentativa de aniquilar o líder da Renamo e assim decapitar o elemento militar dum partido trouxe a violência para o troço Save-Muxúnguè, que depois se alargou um pouco por todo o país.
Hoje somam-se os mortos, civis e militares, vítimas de confrontos entre forças do Governo e da Renamo. Há uma percepção justa de que as FADM, embora sejam forças militares legítimas, dum Governo reconhecido internacionalmente, desvirtuam a sua essência, existência e acção, ao agirem com pendor partidário e sob instruções duma liderança que não consegue desassociar interesses do seu partido e do Governo.
Houve uma reviravolta na política moçambicana com uma recuperação do conceito partido-Estado dos tempos do socialismo efémero em Moçambique. Isso contraria em grande escala os acordos de paz assinados em Roma.
E onde está a hipocrisia viperina evidenciada pelos analistas escolhidos a dedo para os debates televisivos? Condenam com todo o verbo possível e imaginário as vítimas do actual conflito armado atribuindo culpas só à Renamo e ao seu líder e recusam-se a atribuir igual ou superior culpa ao Governo da Frelimo. Quando a Frelimo, através da PRM/FIR ou FADM, mata, não se diz nada. É como se tivesse o direito inalienável de o fazer.
Quando se ataca e se queima sedes de partidos políticos da oposição, obstruindo as suas actividades políticas, ninguém vem para a TV denunciar e pedir justiça por esses actos vis e atentatórios contra a paz e a estabilidade nacional. Essa defesa sistemática duma acção que incita à violência parece estruturada e planificada em centros de pensamento afectos ao partido Frelimo. Se ninguém é punido ou responsabilizado quando queima ou violenta opositores, constrói-se uma imagem de impunidade.
O descarrilar do “comboio da paz” em Moçambique foi sendo orquestrado por forças sinistras e residuais dos tempos do partido único.
O AGP representou um recuo estratégico, mas não o abandono da estratégia eleita por alguns.
Poesia revolucionária e panfletária, retórica, prosa encantadora e elogiosa a uma liderança que se mostra pouco disposta a “ver com olhos de ver” as causas do actual conflito não vão nem podem substituir o realismo e o compromisso com a pátria.
A opção da PAZ não se coaduna com aspirações exclusivistas duma elite que se habituou a tratamento especial e a abusar impunemente das leis do país.
Clama-se pela sensatez dos beligerantes e para que exerçam contenção e disciplina de modo a que os avanços, embora poucos, no teatro negocial sejam aprofundados. É agora que se deve mostra aos moçambicanos que são líderes patriotas e amantes da PAZ.
Calem-se os incitadores da violência e os comunicadores sociais mercenários.
Chame-se a razão à mesa e conclua-se com rapidez e sabedoria aquele acordo sobre um AGP que já foi assinado.
Quando é do interesse do povo, nada prescreve, como alguns “doutores” de ocasião querem vender aos moçambicanos.
(Noé Nhantumbo, Canalmoz)
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